sexta-feira, janeiro 16, 2009

 

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CAPÍTULO VIII - A eficiência em mercado concorrencial.

8.1. Concorrência perfeita e imperfeita.

A actividade económica está sempre confrontada com o factor tempo e com a
duração dos acontecimentos. A concorrência desenvolve-se pelo decurso do
tempo.

O curto prazo, característico da conjuntura económica, contrapõe-se
ao médio e longo prazos inerentes à estrutura e aos sistemas económicos.

Ainda que J. M. Keynes (1883-1946) tenha dito, ironicamente, que "no longo
prazo estaremos todos mortos", para salientar a importância da eficiência
imediata dos instrumentos de política económica, o certo é que os agentes
económico têm de saber lidar com o tempo.

Fala-se, assim, de conjuntura
económica quando nos referimos aos elementos que caracterizam a vida
económica no curto prazo.

E referimo-nos a estrutura económica quando nos
reportamos às proporções e relações que caracterizam uma economia no
horizonte do médio e longo prazos. O factor tempo torna-se evidente, por
exemplo, quando se trata de investir ou de criar nova riqueza para o futuro. As
escolhas dos agentes económicos não podem ter apenas em consideração o
imediato, têm de ter em linha de conta as consequências futuras das suas
decisões.

Quando realizamos um investimento, para cujo financiamento fizemos
poupanças ou assumimos um crédito, pela contracção de um empréstimo,
estamos a tomar uma decisão que vai repercutir-se, em princípio, nas próximas
gerações - e portanto no médio prazo. O que estamos a criar de novo vai influir
o futuro da comunidade em que vivemos. Deste modo, a concorrência opera
tendo em consideração não uma perspectiva estática e imediata, mas a
dinâmica das circunstâncias que mudam. As condições de concorrência não
podem, por isso, ser vistas numa óptica que não tenha em consideração a
passagem do tempo e as consequências desta no funcionamento da economia.

As opções racionais dos agentes económicos envolvem normalmente a
assunção de um risco. Quando há uma aposta esta pode ter sucesso ou
fracassar. A compra de um bem, nas melhores condições, poderá gerar tanto
maior excedente quanto maior for o risco e a incerteza assumidos pelo agente
económico. Mas se o risco é maior também a perda poderá ser mais vultosa. A
fruta comprada na árvore envolve maior incerteza, pois não sabemos se vai
haver condições atmosféricas adversas antes da colheita, por isso o preço será
menor. Se houver uma forte geada a perda pode ser muito significativa, mas se
o tempo estiver de feição o excedente será maior. Compreende-se, por isso, a
importância de escolhas que exijam que se corra riscos. A capacidade para
assumir tais riscos com sucesso constitui uma marca de inovação e de
desenvolvimento. O inovador está disposto a perder tudo, mas sabe que se
vencer obterá melhores resultados do que os concorrentes. Ora, a geração de
excedentes resultantes da inovação e do risco alteram as condições da
concorrência, tornando-a imperfeita. Como vimos, quando tratámos das
incapacidades de mercado, há tendência para o falseamento das condições de
mercado e para a concentração.
Se a compreensão do tempo é fundamental, também o é a análise das
condições concretas em que a concorrência se afirma e concretiza. Trata-se de
entender que os agentes económicos agem considerando o momento da sua
decisão e as condições em que se encontra perante aqueles com quem fazem
as suas transacções. A verdade é que a concorrência perfeita só
excepcionalmente tem lugar. Há inúmeros factores que falseiam o equilíbrio
pleno entre a oferta e a procura. As condições de concorrência têm de ser
analisadas no respectivo contexto concreto. Se no curto prazo as receitas das
vendas de um bem não dão sequer para remunerar os factores de produção,
desde os salários às despesas com a energia, passando pela amortização dos
investimentos, será melhor encerrar temporariamente a actividade à espera
que os preços subam.
No longo prazo, o produtor deverá encerrar a actividade, retirando-se do sector,
sempre que o preço de venda dos seus produtos não for suficiente para cobrir
os custos médios. Mas se o preço de venda (ainda que inferior aos custos
médios totais) for superior aos custos variáveis médios, isto é, se esse preço se
situar num ponto intermédio entre as curvas dos custos médios totais e dos
custos variáveis médios, vale a pena ao produtor manter-se em actividade
apesar de registar perdas - porque o encerramento da actividade envolveria a
perda máxima nos custos fixos. Além disso, pode haver sempre a possibilidade
do aumento da produção, sem agravamento dos custos médios já existentes.


As características de um mercado concorrencial têm de ser vistas
considerando as relações concretas entre agentes económicos e
compreendendo que os mesmos visam obter o maior ganho e a melhor relação
custo/benefício. Ora, a concorrência entre vendedores baixa os custos e os
preços, beneficiando, em última instância os consumidores. Enquanto o custo
marginal for inferior ao rendimento marginal vale a pena incrementar a
produção, porque estamos perante uma margem de lucro positiva. Já quando o
custo marginal for superior ao rendimento marginal, deixa de valer a pena fazer
crescer a produção, visto que o lucro decairá ou desaparecerá mesmo,
podendo até haver um aumento de prejuízos. Percebe-se porque é importante
acompanhar o mercado, de modo a garantir que a concorrência seja respeitada
em benefício de todos os agentes económicos.
Para compreendermos a importância da concorrência é indispensável
apurarmos quais os respectivos requisitos. Em que circunstâncias o mercado
funciona pondo em plena identidade de posições os compradores e os
vendedores? Em que condições a racionalidade dos agentes económicos
constitui o factor determinante para a definição dos preços e das quantidades
de bens transaccionadas? Vejamos, afinal, quais os requisitos da
concorrência perfeita.


8.2. Atomicidade e poder de mercado.

Quando há multiplicidade de agentes económicos, quer do lado da procura
quer do lado da oferta, torna-se muito difícil ou mesmo impossível, num
mercado de concorrência perfeita, a um sujeito económico, influenciar o nível
de preços ou outras condições relevantes nas trocas, pela sua entrada ou
saída desse mercado. A entrada ou a saída de um agente económico do
mercado não altera as respectivas condições de funcionamento, quando existe
concorrência perfeita.


É a atomicidade (em razão da proliferação dos sujeitos económicos, que
funcionam como átomos) que permite ao agente ter possibilidade de escolha.
Numa palavra, pela atomicidade, cada um dos agentes económicos não dispõe
de poder de mercado. Assim, pode funcionar a lei da oferta e da procura,
resultando o preço de equilíbrio de um leilão imaginário entre os vendedores e
os compradores. Quando um novo sujeito económico entra ou sai do mercado,
este não sofre alterações com esse movimento.

8.3. Fluidez, racionalidade e informação.

Na segunda característica do mercado de concorrência perfeita, estamos
perante um requisito ligado à informação e à racionalidade, que permite aos
agentes económicos fazerem as respectivas escolhas livremente, fixando a
quantidade de bens a vender ou a comprar e aceitando ou não as respectivas
condições de mercado.

O conceito de mercado na ciência económica está associado ao conceito de
bem económico. No modelo concorrencial cada um dos bens económicos tem
apenas um mercado (v.g. mercado de bens alimentares de origem agrícola,
dos refrigerantes, dos gravadores de vídeo).

Sempre que um bem tem vários mercados, deixa de atender-se ao tipo dos bens que os constituem. Perde-se a fluidez. Deixa de haver homogeneidade dos produtos, que apresentam diferenciação de qualidade e de marca, do mesmo modo que desaparecem a mobilidade e a informação completa.

A proliferação das marcas nos mercados
contemporâneos conduz ao facto de a ausência de fluidez dar lugar ao que
designamos por concorrência monopolística. Tudo o que perturbe a percepção
clara da homogeneidade dos produtos ou dos factores de produção no
mercado impedirá que se manifestem os efeitos da concorrência de preços.
Compreende-se, pois, a importância da fluidez como requisito essencial no
funcionamento da concorrência.

8.4. Liberdade de entrada e de saída.

O terceiro requisito na concorrência respeita à ausência de barreiras à entrada
do mercado, ou seja, na concorrência perfeita não deve haver limitações de
qualquer natureza à livre entrada ou saída de agentes económicos do
mercado. É fundamental que os vendedores e os compradores estejam livres
para entrar ou sair do mercado, até para que as respectivas escolhas não
fiquem limitadas ou condicionadas por factores externos ao próprio mercado. O
condicionamento económico e o proteccionismo são, assim, factores contrários
à ideia essencial de concorrência. É da liberdade de entrada e de saída que,
pelo menos em parte, depende o grau de disciplina que se verifica no mercado
quando surgem hipóteses de distorção da concorrência por influência das
alterações verificadas na oferta. Daí a necessidade de haver regras e
procedimentos que visem contrariar a concentração das iniciativas económicas
e das empresas.

O direito da concorrência tem-se desenvolvido nas sociedades
contemporâneas tendo em consideração estas preocupações. Daí o
surgimento da legislação que visa contrariar e combater as concentrações de
empresas (trusts), de que são exemplos pioneiros o Sherman Act (1890) e o
Clayton Act (1914) nos Estados Unidos, bem como a proibição de práticas
concertadas de empresas, do abuso de posição dominante ou do abuso de
dependência económica. Aliás, a legislação sobre a concorrência tem particular
importância na União Europeia, como modo de garantir a existência de um
mercado interno integrado, baseado nas quatro liberdades de circulação: de
pessoas, de mercadorias, de serviços e de capitais.


8.5. Eficiência e Bem-estar em Vilfredo Pareto.

Para compreendermos as situações de concorrência perfeita, devemos fazer
uso do conceito de eficiência, ligado ao entendimento de que o equilíbrio
constitui a regra base de funcionamento de uma economia. Recorremos ao
pensamento de Vilfredo Pareto (1848-1923), autor multifacetado que reflectiu,
de modo pioneiro, sobre o bem-estar económico, o equilíbrio e a repartição dos
recursos.

A situação de uma economia é considerada óptima sempre que houver
acréscimo na satisfação de necessidades económicas de pelo menos um
agente económico, sem que a situação de qualquer um dos restantes agentes
económicos saia prejudicada. Este critério implica que o único factor de
julgamento dos critérios de valor se ligue ao facto de haver um nível global
superior de satisfação de necessidades, isto é, um maior nível de bem-estar.
Estamos a falar da soma dos excedentes do produtor e do consumidor, que
define em cada momento, o nível de bem-estar.

Deste modo, uma situação da economia é eficiente ou óptima, na acepção
que lhe atribuiu Pareto, desde que seja possível encontrar uma outra
distribuição de factores de produção entre empresas ou uma outra distribuição
de produtos entre consumidores, que permita a pelo menos um agente
económico encontrar-se numa curva de indiferença mais elevada, sem que
algum outro passe a estar numa curva de indiferença mais baixa em
consequência da situação do primeiro.

Deste modo, para que estejamos em situação de eficiência paretiana é
necessário:

(a) que nos encontremos em pleno emprego dos recursos produtivos;

(b) que o preço de cada produto seja igual ao custo marginal de produção e

(c) que o preço de cada factor coincida com o valor da respectiva produtividade
marginal.
A liberdade das trocas subjacente à eficiência de Pareto pressupõe, assim, que
as trocas, bem como a afectação e reafectação de recursos através delas, só
ocorra quando as partes sintam haver ganhos de bem-estar.
Por outro lado, há eficiência quando as partes envolvidas já esgotaram
espontaneamente todas as permutas possíveis de utilidades que estavam
dispostas a realizar no nível de preços atingidos. O equilíbrio económico
residiria, numa concepção estática, na correspondência entre as possibilidades
e as satisfações obtidas na satisfação de necessidades. Na situação de
eficiência resulta desnecessário qualquer tipo de intervenção correctiva.
Situação diferente seria aquela em que o Estado, mediante uma acção
correctiva, por exemplo no campo dos impostos, procedesse à redução dos
excedentes, originando assim uma perda de quantidades transaccionadas.
Neste caso estaríamos perante uma perda absoluta de bem-estar (deadweight
loss).

John Rawls (1921-2002) em Uma Teoria da Justiça analisou, igualmente, os
temas da redistribuição de recursos e do bem-estar, definindo a teoria da
justiça como equidade na óptica dos membros mais desfavorecidos da
sociedade.

Este entendimento centra-se nos seguintes princípios:

(a) cada pessoa deve ter igual direito à mais extensa liberdade compatível
com uma idêntica liberdade para os outros;

(b) as desigualdades sociais e económicas devem preencher duas
condições, para serem conformes com a justiça: (b1) devem estar
ligadas a funções e a posições abertas a todos, em condições de
igualdade de oportunidades; e (b2) devem corresponder à maior
vantagem possível para os membros mais desfavorecidos da sociedade.

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