quinta-feira, janeiro 15, 2009
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CAPÍTULO IV - Os preços e a sua formação.
4.1. Oferta e procura. Noção de mercado.
O mercado é o lugar, real ou imaginário, onde se encontram a procura e a
oferta relativamente a um ou mais produtos ou serviços e onde se formam os
preços. A procura é a quantidade de um bem que os compradores estão
dispostos a adquirir. A oferta é a quantidade de um bem posta à disposição
dos compradores para venda num mercado. O mercado começou por ser um
lugar físico - o adro da igreja, a praia ou a rua direita - onde se efectuavam as
transacções, incidindo sobre um produto ou um grupo de produtos. Se nos
lembrarmos das nossas aldeias, recordamos o lugar onde se realizava o
comércio de animais, de alimentos ou de alfaias agrícolas, em dias certos do
mês ou da semana. Com a evolução dos fenómenos económicos, o mercado
passou a ser o lugar ideal de encontro ou confronto entre a oferta e a procura
dos bens ou dos serviços. Tal encontro é que determina o preço e o volume
das transacções.
Considerando que a procura diminui quando o preço aumenta e que a oferta
aumenta quando o preço aumenta, a determinação do preço e da quantidade
ocorre como se estivéssemos num leilão imaginário. Recordem-se os exemplos
da lota do peixe, na qual o pregoeiro proclama a escala dos preços, no sentido
decrescente, ou do leilão de antiguidades ou de livros, em que a ordem de
licitações é crescente. Por aproximações sucessivas, representadas nos lances
dos intervenientes, chega-se a um ponto de equilíbrio, em que vendedores e
consumidores estão de acordo sobre preço a pagar e sobre a quantidade dos
bens ou dos serviços que desejam comprar e vender, respectivamente. Quer o
comprador quer o vendedor têm de ceder alguma coisa relativamente à
situação ideal – já que quem vende deseja obter o maior preço e quem
compra deseja que a transacção seja a mais barata possível.
Jean-Baptiste Say (1767-1832), na linha do pensamento clássico de Adam
Smith, baseando toda a sua análise na lógica da liberdade de comércio,
entendia que os produtos gerariam os seus próprios mercados, ou seja, "os
produtos trocam-se por outros produtos, sendo a moeda um simples
intermediário das trocas". O conhecimento da complexidade dos fenómenos
económicos leva-nos hoje a entender diversamente, já que a moeda
desempenha um papel mais importante do que pode parecer à primeira vista.
4.2. Preços e elasticidades.
Preço é o valor de um bem ou de um serviço expresso em unidades
monetárias. O preço constitui uma elemento essencial característico de um
bem económico, pois vai sinalizar a respectiva importância para os agentes
económicos. Esse termo de comparação permite sabermos que quantidade de
outros bens equivale ao bem que temos em vista. Estamos então perante o
que alguns designam como o preço relativo, noção tanto mais importante
quanto é certo que as trocas e as escolhas económicas obrigam a que,
permanentemente, sejamos levados a comparar e a optar. Mas se
considerarmos o valor absoluto desse bem em unidades monetárias, estamos
a reportar-nos a uma noção intrínseca, que tem a ver com o respectivo custo,
isto é, com o sacrifício que é indispensável fazer para que um bem económico
se torne útil.
A determinação do preço dos diferentes bens nas economias
abertas realiza-se no quadro do mercado e do leilão imaginário a que
aludimos, dependendo:
(a) do custo de produção, ou seja, do preço e da quantidade dos outros bens
e do trabalho necessários à sua produção - o que nos conduz aos factores de
produção, já analisados;

(b) da intensidade das necessidades em causa, que explicam a função
procura; e
(c) da forma do mercado - uma vez que não é indiferente estarmos em
situação de concorrência perfeita, em oligopólio ou em monopólio. As
variações do preço obedecem à intensidade dos fenómenos que as
determinam - o encontro da procura e da oferta, os custos de produção e o
facto de haver ou não concorrência perfeita.
Verificamos, no entanto, que só excepcionalmente há total liberdade na
formação dos preços. Normalmente, como veremos, há limitações à influência
dos diferentes sujeitos económicos, os quais não detêm toda a informação…
Recorde-se o que já dissemos sobre as incapacidades do mercado…
Para a formação dos preços e para compreendermos o funcionamento do
leilão imaginário que tem lugar num mercado temos de recorrer ao conceito
de elasticidade.
Elasticidade é a relação que se estabelece entre as variações absolutas ou
relativas de dois fenómenos económicos.
Comecemos por referir, sucintamente, a elasticidade procura/preço, que nos
permite entender como evoluem os comportamentos dos sujeitos económicos
no mercado, tendo em consideração as repercussões mútuas na evolução da
procura e dos preços. A elasticidade representa uma proporcionalidade, na
medida em que relaciona a quantidade procurada ou oferecida com o preço
do bem. Pode acontecer que, face a um aumento do preço de um bem, a
procura aumente menos que proporcionalmente, diminua ou até mesmo se
mantenha constante. Assim, a elasticidade da procura de um bem
relativamente ao seu preço calcula-se como a relação entre a variação em
percentagem da quantidade procurada e a variação em percentagem de
um preço. Assim:
E = Δ%q / Δ%p.
Vejamos as seguintes situações:
(a) Situação perfeitamente inelástica. A variação do preço não provoca
qualquer mudança na quantidade procurada. Assim: E=0 (Δq=0). Exemplos:
sal, droga para os toxicodependentes.
(b) Situação inelástica. A variação da quantidade procurada é inferior à
mudança em percentagem do preço. Assim: E= 0,40 (Δq = 10%; Δp = 25%).
Exemplo: gasolina.
(c) Elasticidade unitária. A variação em percentagem da quantidade
procurada é exactamente igual à percentagem de alteração do preço.
Assim: E= 1 (Δq = 25%; Δp = 25%). Exemplo: bens alimentares.
(d) Situação elástica. A variação em percentagem da quantidade procurada é
superior à variação em percentagem do preço. Assim: E = 2 (Δq = 50%; Δp
= 25%). Exemplos: jornais.
(e) Situação perfeitamente elástica. A variação em percentagem da
quantidade procurada que se segue a uma alteração de preço apresenta-se
como infinita. Em suma, a procura pode desaparecer, fugindo para outros
bens mais baratos. Assim: E=∞ (Δq = infinito). Exemplos: a generalidade
dos bens, relativamente aos quais há diferentes oportunidades de escolha.

Importa ainda referir que a quantidade procurada de um bem depende não
apenas do seu preço, mas também do rendimento do consumidor. Assim a
noção elasticidade pode ainda ser estudada relacionando a procura e o
rendimento. Aí teremos a relação entre a variação em percentagem da
quantidade procurada e a variação em percentagem do rendimento. Esta
elasticidade é normalmente positiva, isto é, o crescimento do rendimento
provoca um aumento do consumo. Falámos da situação dos chamados bens
normais (sejam ou não de luxo). Normalmente o aumento da procura é menos
do que proporcional ou proporcional ao aumento de rendimento. No caso dos
bens de luxo (v.g. whisky ou caviar) o aumento da procura é mais do que
proporcional ao aumento de rendimento. No caso dos bens inferiores (ex.
vinho de pouca qualidade) o aumento da procura resulta numa diminuição do
rendimento e vice-versa (elasticidade inferior a 0).
A noção de elasticidade pode ser vista numa situação em que a procura de um
bem depende não apenas do seu próprio preço, mas também dos preços dos
outros bens. Nesse caso, com base nas escolhas do consumidor, compara-se as
variações de preços de diversos bens. Chama-se elasticidade cruzada à
relação entre a variação da quantidade de um produto e a variação do preço
de outros produtos. Se os bens são substitutos ou sucedâneos entre si, a
elasticidade cruzada é positiva. A subida de preços do vinho tende, por
exemplo, a fazer aumentar a procura da cerveja. Note-se que no caso de bens
substitutos perfeitos a diminuição do preço de um bem leva ao
desaparecimento da procura de outro (elasticidade infinita) – como por
exemplo no caso histórico da batata em relação à castanha. A batata
importada da América ocupou o mercado da castanha europeia.
Diferentemente, se os bens são complementares, a quantidade procurada de
um bem diminui se o preço de outro aumenta - a subida de preços das
máquinas fotográficas e de filmar repercute-se no mercado dos filmes,
conduzindo a uma situação de elasticidade negativa (elasticidade menor que
zero). Já no caso de bens independentes, a quantidade procurada de um bem
não varia em função das variações de preço de outros.
E relativamente à oferta? O funcionamento é semelhante. Recapitulemos. A
inelasticidade absoluta (=0) ocorre quando a quantidade oferecida não varia
com os preços. A inelasticidade (entre 0 e 1) verifica-se quando um aumento
ou diminuição de preço leva a um aumento ou diminuição menos que
proporcional das quantidades oferecidas. Na elasticidade unitária (=1) o
aumento ou a diminuição do preço implica um aumento proporcional das
quantidades oferecidas. Na elasticidade (entre 1 e infinito) o aumento ou
diminuição do preço conduz a um aumento ou diminuição mais do que
proporcional das quantidades oferecidas. Na elasticidade perfeita (infinita),
a diminuição ou o aumento do preço induz o desaparecimento da oferta.

4.3. Curvas da oferta e da procura. Representação gráfica (cruz de
Marshall).
O confronto da oferta e da procura num mercado permite a fixação do preço e
do volume das transacções. A procura diminui quando o preço aumenta, a
oferta aumenta quando o preço aumenta. Tudo se passa como se estivéssemos
num leilão imaginário em que o vendedor fixa uma base de licitação e o
comprador vai fazendo lances até poder obter o bem que pretende adquirir –
como acontece nos leilões de obras de arte ou de antiguidades. Já na “lota do
peixe” o comprador apenas pode fazer um lance, uma vez que o pregoeiro
começa por um valor alto e segue uma escala descendente (10, 9, 8, 7, 6…). A
determinação do preço e da quantidade obedece à chamada “lei” da oferta e
da procura e permite-nos encontrar graficamente o preço de equilíbrio. As
curvas da procura e da oferta são construídas com base nas diferentes
situações em que os compradores e os vendedores estão dispostos a adquirir
ou a alienar os bens e serviços do mercado em causa. Existe um preço e uma
quantidade transaccionada de equilíbrio que correspondem ao ponto onde a
oferta e a procura se encontram. Este preço e esta quantidade são
fundamentais na medida em que para tais valores tendem a representar as
atitudes dos intervenientes no mercado. Assim, se um preço superior ao preço
de equilíbrio for imposto ao mercado, isso significa que a oferta é superior à
procura e logo os vendedores tenderão a baixar o seu preço - até,
exactamente, ao ponto de equilíbrio. Compreende-se como o mercado se
assemelha a uma balança de braços (libra), a qual, estando afinada, tende
para o equilíbrio, ainda que esteja sempre numa situação de relativa
instabilidade.
O excesso de oferta corresponde à diferença entre a menor quantidade que
os compradores estão dispostos a comprar e a máxima quantidade que os
produtores estão dispostos a fornecer. O excesso de procura corresponde à
diferença entre a menor quantidade que os vendedores estão dispostos a
vender e a maior quantidade que os compradores estão dispostos a comprar. A
tendência verificada no encontro entre a procura e a oferta tende para o
preço de equilíbrio, nos termos já analisados. Na figura temos a quantidade
de cenouras produzidas (milhares de toneladas por mês) e o preço expresso
em dólares por tonelada. O preço de equilíbrio é de 60 U.S. dólares por
tonelada, vendendo-se 80 mil toneladas de cenouras num mês.
Alfred Marshall (1842-1924), autor dos Princípios de Economia Política (1890),
representou graficamente através de duas curvas - que designamos como cruz
marshalliana, em homenagem ao professor de Cambridge - as funções da
procura decrescente (a procura diminui quando os preços aumentam) e da
oferta crescente (a oferta aumenta quando os preços aumentam). As duas
curvas encontram-se num ponto de equilíbrio parcial. Enquanto para Léon
Walras (1834-1910), defensor de uma ideia de equilíbrio geral, as
quantidades trocadas são função dos preços, para Alfred Marshall os preços
são função das quantidades.
O tempo (o curto e o médio prazos, os ciclos económicos) é fundamental na
análise de Marshall, que assim abandonou a concepção de equilíbrio geral,
para procurar basear-se num equilíbrio momentâneo e parcial, inteiramente
relacionado com o período em causa. A cruz marshalliana representa a lei da
oferta e da procura, traduzindo o encontro das respectivas curvas, devendo
ser lida numa perspectiva interpretativa dinâmica, que influenciou
decisivamente a moderna Ciência Económica.
4.4. Efeitos de rendimento e de substituição.
A cada ponto de uma curva da procura individual corresponde um ponto de
equilíbrio do comprador. Com se disse, a curva da procura do consumidor é
decrescente – a procura diminui quando os preços aumentam e quando o
preço baixa a quantidade aumenta. Todo o crescimento do consumidor conduz
a um movimento. Também como já vimos, o crescimento do rendimento do
consumidor conduz a um movimento para a direita das curvas da procura para
os diferentes bens ou serviços. Toda a diminuição de rendimento, por seu
turno, conduz a uma variação para a esquerda da curva de procura.
O equilíbrio do consumidor corresponde ao cabaz de bens preferido por este
entre todos os que lhe são acessíveis no limite do seu orçamento. Temos,
pois, de conhecer a fronteira das escolhas. Esta fronteira representa a
limitação orçamental. A recta de restrição orçamental define o limite para
as escolhas acessíveis e inacessíveis. Suponhamos um rendimento de 600
Euros, que permite a aquisição de 30 litros de vinho (a 10 Euros o litro) e de
20 litros de cerveja (a 15 Euros o litro) ou de 60 litros de vinho e 0 litros de
cerveja ou ainda 40 litros de cerveja e 0 litros de vinho. Deste modo, não será possível comprar 30 litros de vinho mais 30 litros de cerveja, uma vez que
então estaríamos fora da fronteira de escolhas acessíveis. Na figura seguinte
temos a comparação entre o número de cassetes musicais compradas e o
número de discos compactos (CD) adquiridos pelo sujeito económico Alfredo.
Pode comprar 20 cassetes e O CDs e no extremo oposto 10 CDs e 0 cassetes.
Pode comprar 8 cassetes e 4 CDs, ficando aquém da fronteira, mas já não
pode adquirir 12 cassetes e 8 CDs, situação em que ultrapassa a recta de
restrição orçamental.

O efeito de rendimento corresponde ao facto de a sensibilidade no mercado
tender a aumentar se as limitações quanto aos recursos disponíveis dos
sujeitos económicos forem atingidas. Assim, se houver um aumento de preços
desacompanhado de um aumento do rendimento disponível o padrão normal
de consumo excede as disponibilidades dos consumidores - obrigando-os a
retrair-se nas suas compras, uma vez que têm de ter presente a fronteira de
escolhas possíveis. Os consumidores serão então obrigados a sacrificar aquele
padrão normal, restringindo os valores das quantidades consumidas - o que
afecta o total consumido do bem ou do serviço, cujo preço aumentou. No caso
de haver um aumento de rendimento, a fronteira de escolhas possíveis alargase,
estamos perante uma nova curva de indiferença, e, de duas uma, ou os
preços aumentam ou a oferta aumenta, havendo crescimento económico.
Já no efeito de substituição a elasticidade tende a aumentar se o consumidor
dispõe de alternativas, podendo fugir do aumento de preços de um bem,
substituindo o respectivo consumo pelo consumo de bens sucedâneos, cujo
preço não tenha sofrido aumento.
4.6. Preço de equilíbrio. Formação de preços.
Além do que ficou dito sobre o preço de equilíbrio, formado em resultado do
leilão imaginário que em cada mercado tem lugar, e considerando ainda o que
acabámos de analisar quanto aos efeitos de rendimento e de substituição,
importa referir que a formação de preços não é indiferente às escolhas
alternativas que em cada momento podem ser realizadas. Devemos, por isso,
recordar a importância das preferências entre pares de bens ou serviços -
enquanto relação entre os bens sacrificados e os bens obtidos,
correspondentes a um nível constante de satisfação de necessidades.
No cabaz de bens aptos a satisfazerem as nossas necessidades, temos de
equilibrar as escolhas entre bens alimentares e bebidas, dentro da fronteira
de escolhas possíveis. Fala-se então da substituição de um bem por outro, em
situação de indiferença. Vilfredo Pareto (1848-1923) estudou o equilíbrio
económico como uma correspondência entre as possibilidades e a satisfação
das necessidades obtidas. O que determina a escolha de uma combinação de
bens não depende para Pareto apenas do critério da utilidade marginal
destes, mas do facto dessa combinação estar dentro das possibilidades e ser
preferível a quaisquer outras possíveis.
As curvas de indiferença são a expressão gráfica das combinações de bens
que proporcionam satisfações iguais de necessidades. As curvas de indiferença
correspondem a níveis idênticos de rendimento e de bem-estar e não se
cruzam. À medida que os rendimentos aumentam desenvolvem-se
paralelamente à direita da curva donde partimos. Se os rendimentos
diminuem, desenvolvem-se paralelamente à esquerda. São curvas convexas
porque comparam produtos com custos de produção diferenciados.