sexta-feira, janeiro 16, 2009

 

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CAPÍTULO XI – Economia monetária
11.1. Noção de moeda.
Depois de uma fase primitiva caracterizada pelas trocas directas, a
humanidade sentiu necessidade de utilizar determinados bens, que pela sua
raridade fossem aceites como instrumentos gerais de trocas (como o sal, o
marfim, os metais preciosos, as tâmaras ou as conchas especialmente raras e
valiosas). Depressa se verificou a dificuldade na troca de uns bens por outros,
segundo o princípio da divisão do trabalho, mas também se revelou
indispensável adoptar uma medida comum de valores, para facilitar as
transacções, sem estar a usar um complexo sistema de comparação entre
bens diferentes. Quanto custaria um cavalo em sacos de trigo? Qual o valor de
um serviço prestado por um ferrador traduzido em frangos de capoeira? E
como fazer quando os valores não eram certos na respectiva correspondência?
Daí a necessidade de um instrumento de trocas.


A moeda é um elemento fundamental para o funcionamento da economia.
Pressupõe a realização de trocas na satisfação das necessidades humanas.
Não se trata, porém, apenas de um mero instrumento de trocas ou de uma
unidade de cálculo. É mais do que isso. A moeda não tem, como julgava Jean-
Baptiste Say (1767-1832), uma função meramente instrumental na vida
económica. A economia monetária envolve um conjunto muito vasto de temas -
desde a oferta e a procura de moeda até à emissão, à criação de moeda pelo
sistema bancário, passando pelo valor da moeda, pela relação entre massa
monetária, rendimento, consumo, poupança e transacções, pelas taxas de juro
e pelas relações cambiais entre diferentes espaços monetários…
Etimologicamente a palavra moeda provém de moneta, substantivo ligado ao
verbo latino monere, que significa advertir quanto ao futuro. Estamos sob a
inspiração da deusa Juno, que advertia os mortais anunciando-lhes o futuro.

Quais as funções da moeda?

São fundamentalmente três:

(a) instrumento geral de trocas,

(b) medida comum de valores e

(c) reserva de valores.

Sendo a moeda contrapartida da aquisição de um bem ou de um serviço
permite realizar uma troca indirecta, com a vantagem da clareza e da facilidade
na transacção.

A moeda é, pois, um instrumento geral de trocas. Mas as
unidades monetárias são usadas para avaliação do valor dos bens, em termos
absolutos e relativos e constituem um instrumento de medida de assinalável
fiabilidade. Os banqueiros da Antiguidade e da Idade Média tinham como
função primordial garantirem a fiabilidade do peso e do valor das moedas em
circulação. E nesse caso estamos perante um padrão ou medida comum de
valores.

Da função de instrumento geral de trocas resulta ainda para a moeda a
finalidade de reserva de valores.

A moeda é um traço de união entre o presente e o futuro, segundo a referida
simbologia representada pela deusa Juno. Impondo-se aos sujeitos
económicos prevenir o futuro, fácil é de compreender que as poupanças
constituem uma peça fundamental na estabilização económica de uma
comunidade. Ganhando crescente importância como reserva de valor, a moeda
conheceu no século XX novos progressos que conduziram à necessidade de
formulação de um conceito como o de preferência pela liquidez, com origem
na escola de Cambridge.

A preferência pela liquidez é uma tendência verificável na economia
contemporânea no sentido de manter moeda imediatamente disponível para a
satisfação das necessidades humanas. Deriva de três motivos fundamentais:

(a) o motivo transacção, segundo o qual os sujeitos económicos podem
adquirir com moeda disponível os bens e os serviços que satisfaçam as suas
necessidades;

(b) o motivo precaução, uma vez que a moeda é guardada para situações
futuras imprevistas; e

(c) o motivo especulação, uma vez que a moeda pode ser usada para ganhos
fáceis e imediatos geradores de excedentes potenciais, verificando-se que o
entesouramento especulativo aumenta quando a remuneração do capital
diminui, ou seja, quando a taxa de juro baixa.
Considera-se como massa monetária ou "stock monetário" o conjunto que
compreende todas as unidades monetárias de uma economia repartidas entre
os diferentes sujeitos económicos, que asseguram o financiamento das
respectivas actividades.

A noção de circulação monetária corresponde à massa monetária em
movimento, o que nos conduz ao entendimento da velocidade de circulação,
ou seja, o número de vezes que uma moeda é dada em pagamento.
Há diversos tipos de moeda. Antes de mais, a moeda que constitui um meio
imediato de pagamento nas transacções designa-se como M1, e é constituída
pela moeda metálica, pelo papel moeda e pelos saldos dos depósitos à ordem -
a moeda escritural ou bancária. Temos ainda outro tipo de moeda onde se
reflecte a função de reserva de valor, que se designa como M2, e é constituída
pelos depósitos a prazo (a curto prazo superior a 180 dias ou a médio e longo
prazos) no sistema bancário. Por fim temos a quase moeda, composta por M2
e ainda pelos títulos mobilizadores de poupança, como obrigações, bilhetes e
obrigações do tesouro - trata-se do M3…

11.2. Moeda metálica, moeda representativa, moeda fiduciária.
A divisão do trabalho e as dificuldades na troca directa conduziram à adopção
da moeda como instrumento de trocas e padrão de valor. Como dissemos, os
metais preciosos (o ouro e a prata) cedo se revelaram como amoedáveis pela
sua resistência, inalterabilidade, maior facilidade de transporte e difícil
falsificação. A moeda metálica surgiu e assim se afirmou. Houve, porém, que
apor aos fragmentos de metais preciosos que funcionavam como moeda a
indicação do valor e do respectivo peso. Essa marca caracterizou a primeira
fase da amoedação, ainda na Antiguidade. A cunhagem começou por ser
privada, mas o risco de abusos e o surgimento dos Erários Públicos levou a
atribuir ao poder político essa tarefa. Também os príncipes vieram a abusar
desse privilégio com constantes quebras de moeda - o que levou as Cortes e
os Parlamentos a redobrar a sua actividade permanente de controlo e de
autorização, segundo o princípio do consentimento.
Cunhar moeda era direito dos soberanos. Na segunda metade do século XVII,
em Inglaterra estabeleceu-se a liberdade de cunhagem, podendo qualquer
particular detentor de uma barra de ouro ou de prata transformá-la em moeda,
cabendo, porém ao Estado proceder, através da Casa da Moeda, a essa
transformação.

Havia obrigatoriedade de aceitação pelos particulares de moeda cunhada com
o valor estabelecido pelo Príncipe. Estamos perante o conceito de curso legal,
que é complementar do direito de cunhar moeda. Trata-se de uma
obrigatoriedade imposta aos particulares, já que ninguém poderia recusar-se a
aceitar em pagamento as espécies monetárias que tinham curso declarado.
Curso legal não significa, porém, poder liberatório pleno. Há moedas com curso
legal que só são aceites em pagamentos pouco significativos. Estamos a falar
das moedas divisionárias (1 ou 5 cêntimos, p. ex.) que servem para trocos,
mas não para fazer grandes pagamentos. Por exemplo, nos sistemas
monometalistas do ouro só as moedas cunhadas nesse metal poderiam gozar
de poder liberatório pleno (isto é, poderiam ser aceites em qualquer
pagamento).

O metal em que se baseia um sistema metalista designa-se como estalão
monetário. No tocante ao estalão temos três sistemas possíveis - o

monometalismo-ouro ou sistema de estalão ouro,

o monometalismo-prata ou sistema de estalão prata.

e o bimetalismo ou duplo estalão. O

monometalismo implica liberdade de cunhagem apenas para as moedas do
estalão. Por outro lado, o poder liberatório pleno só ocorre nas moedas do
estalão. Uma das razões que levou os economistas a preferirem o
monometalismo foi a muito conhecida lei de Gresham, segundo a qual a má
moeda expulsa a boa moeda… A boa moeda tende a desaparecer por
possuir outras aplicações mais vantajosas e rentáveis – daí a
indispensabilidade de preservar os melhores meios de pagamento.

Para chegarmos às origens do papel-moeda, temos de recuar no tempo e de
distinguir o seguinte:

(a) a moeda-papel surge com carácter excepcional, no início do século XVIII,
em resultado dos depósitos feitos pelos detentores de metais preciosos no
sistema bancário;

(b) a moeda-papel representativa circula porque está suportada por uma
cobertura de moeda metálica equivalente à circulação;

(c) a moeda fiduciária circula apenas suportada por uma parte da moeda
metálica depositada - com base na confiança (fidutia) e na capacidade que o
sistema bancário tem de criar nova moeda;

(d) o papel-moeda, com inconvertibilidade e curso forçado. - ao contrário da
moeda fiduciária, neste caso já não há ligação à moeda metálica ou aos metais
preciosos em reserva, havendo, no entanto, regras prudenciais e de confiança
a cumprir.

No caso da moeda representativa, o banqueiro inglês John Law utilizou parte
das reservas para investir no seu negócio. Descobriu um novo tipo de moeda,
mas abriu falência, porque os seus clientes, quando souberam do facto de o
banqueiro ter disposto de parte do seu dinheiro, correram ao banco para
levantarem os seus depósitos. Law não tinha dinheiro suficiente para lhes
pagar e abriu falência sofrendo, assim, humilhação pública.
A moeda fiduciária consolidou-se a partir desse antecedente, no entanto houve
abusos. Esqueceu-se, por exemplo, a velha regra de prudência ou do terço,
que obrigava o banco a manter um terço dos depósitos em reserva. O tempo
veio, porém, a consagrar regras e um sistema de supervisão e
acompanhamento, para garantir a confiança dos sujeitos económicos.

O papel-moeda é inconvertível e tem curso forçado. O curso forçado
determina que a moeda circule e deva ser aceite por todos. A
inconvertibilidade do papel-moeda resulta quer da tendência para a
desmaterialização quer do facto de os títulos de crédito público emitidos pelo
Estado terem também deixado de ser convertíveis.

Como veremos, hoje as moedas metálicas correspondem a uma pequena parte
da circulação monetária, a maior parte da moeda disponível corresponde a
moeda escritural ou bancária, isto é, aos os saldos dos depósitos à ordem. A
moeda escritural resulta da criação monetária pelo sistema bancário,
correspondendo a operações de escrita, que são lançadas em conta corrente,
apenas existindo movimentos monetários em relação aos saldos, a crédito ou a
débito. Além dos depósitos à ordem temos os depósitos a prazo e com préaviso.

Estes não constituem moeda como vimos, ainda que os sujeitos
económicos contém com eles para os seus cálculos económicos.
Os cheques permitem a movimentação dos saldos dos depósitos à ordem. No
entanto, não constituem moeda, nem têm poder liberatório. O cheque é uma
ordem de pagamento, que constitui um título executivo, não sendo, por isso,
confundível com a moeda representativa.

Os depósitos bancários a prazo e com pré-aviso, os bilhetes do Tesouro e
outros títulos equiparáveis não constituem uma reserva líquida. Estamos
perante casos de quase-disponibilidade e de quase liquidez. O depositante ou
o subscritor dispõe nesses casos de uma reserva quase-líquida, constituída por
quase-moeda - que vai influir indirectamente na atitude do agente económico,
que conta com essa disponibilidade e por isso mesmo actua tendo em vista a
sua liquidez ciente, porém, de que ainda dispõe de outra poupança não liquida.

11.3. Teorias sobre o valor da moeda.

O conceito de valor da moeda apresenta naturais
dificuldades. Há uma primeira explicação muito simplista, quase intuitiva, que
liga o valor da moeda ao custo de produção do objecto que a representa - a
peça metálica de ouro ou prata -, a este critério chama-se metalista.

Esta explicação não pode satisfazer-nos. Lembremo-nos da distinção entre valor de uso e valor de troca. A moeda é usada para adquirir outros bens e o seu valor de uso acaba por se confundir com o valor de troca. Ora o valor dos bens tem uma expressão monetária. É o preço. O valor da moeda vai, por isso, ser
influenciado pelo respectivo poder de compra e pelo nível geral de preços. O
valor da moeda variará na razão inversa do nível geral de preços. Quanto mais
elevado for o nível de preços mais baixo será o valor da moeda.

Há uma outra explicação - a nominalista - segundo a qual o valor da moeda
será aquele que lhe foi aposto. Sendo certo que, com a desmaterialização da
moeda, a tendência nominalista pôde reforçar-se, a verdade é que estamos
perante um critério incapaz de explicar o fenómeno contemporâneo da moeda.

Se na Antiguidade Aristóteles definiu o valor da moeda por referência à lei,
segundo a lógica nominalista, não podemos esquecer que o primado das
moedas metálicas na Idade Média e depois o surgimento da moeda fiduciária
contrariaram esse entendimento. Aliás, e com razão demonstrada pelo tempo,
os legistas Acúrsio e Bártolo defenderam que o valor real da moeda
predominava sobre o respectivo valor legal.

Desde muito cedo surgiu uma outra explicação, de índole quantitivista.
Xenofonte (séc. V e IV a.C.) foi um dos primeiros autores a defendê-la. O valor
da moeda dependeria da quantidade em circulação. Jean Bodin (1530-1596)
explicou a alta de preços verificada na Europa no século XVI através do afluxo
de ouro da América. No Tratado sobre a Moeda de Bernard Davanzati, de
1588, o autor estabeleceu uma relação matemática ente a quantidade de ouro
e o nível geral de preços existente. Na senda de John Locke (1632-1704) ou de
David Hume (1711-1776), os economistas clássicos ingleses, à frente dos
quais David Ricardo (1772-1823), também defenderam a teoria quantitativa da
moeda, a partir de uma relação directa e automática entre a circulação
monetária e o nível de preços. Ricardo introduziu, aliás, na sua análise o
fenómeno da criação de moeda-papel e o seu efeito quantitativo.

Na esteira de Ricardo, John Stuart Mill (1806-1873) veio a aperfeiçoar o
raciocínio, dizendo que não bastava ter em conta a moeda em circulação, uma
vez que era indispensável saber o número de vezes que a moeda era dada em
pagamento. Pegando nesta ideia, Irving Fisher (1867-1947), um dos maiores
economistas matemáticos dos EUA, formulou a equação geral de trocas -
acrescentando à circulação monetária do papel-moeda e da moeda metálica a
da moeda bancária ou escritural.

Para Fisher haveria que estabelecer uma
relação entre o "stock" monetário em circulação e o volume de transacções
realizadas:

MV=PQ.
M é a massa monetária imediatamente disponível, moeda metálica, papelmoeda
e moeda escritural e V a velocidade de circulação monetária. P é o nível
geral de preços e Q o volume de transacções realizadas.

Em suma, as variações na quantidade de moeda determinam alterações
proporcionais no nível geral de preços, o que significa uma interpretação
rigorosa do fenómeno monetário em termos matemáticos. I. Fisher teve, no
entanto, o cuidado de dizer que a sua equação apenas se aplicaria em
períodos normais e não em períodos de crise ou de transição.

Os críticos de Fisher vieram, porém, dizer que a interpretação era incompleta,
uma vez que não se levaria em consideração a moeda entesourada,
imobilizada ou inactiva. Haveria, assim, demasiada rigidez na sua
interpretação, por não considerar a relação dinâmica entre o consumo e a
poupança.

Por outro lado, Albert Aftalion (1874-1956) veio afirmar que as variações de
preços registavam uma muito maior sensibilidade do que a evolução dos meios
de pagamento, distinguindo comportamentos diferentes na moeda fiduciária e
na moeda escritural. Enquanto o saldo médio dos depósitos se mantém
constante o total de pagamentos realizados por movimentação das respectivas
contas pode aumentar. Como veremos adiante, para Aftalion nem só M e V
podem influenciar o nível geral de preços. Tem de se considerar outros
factores que não estão na equação geral de trocas.

Com o tempo, e perante os factos económicos, foi-se chegando à conclusão de
que o princípio quantitativo, apesar de poder ter pertinência nas análises de
períodos longos, não permite encontrar uma explicação satisfatória
relativamente ao valor da moeda. Aliás, a partir da I Grande Guerra Mundial,
encontram-se claros desmentidos da teoria quantitativa. Na Alemanha,
aquando a hiperinflação de 1923, a um acréscimo de massa monetária de 40
correspondeu uma subida do nível de preços de 400, segundo a análise de
Aftalion. Recorde-se que este processo vertiginoso de depreciação do valor da
moeda conduziu a que um bilhete de eléctrico em Berlim no ano de 1923
tivesse o mesmo preço de uma vivenda na mesma cidade três anos antes! Ora
esta disparidade não teve como contrapartida um proporcional aumento de
circulação monetária.

Tendencialmente, a teoria quantitativa não pode deixar de ser considerada.
Segundo Maurice Allais (1911), Prémio Nobel da Economia de 1988, insistiu
numa proporcionalidade entre circulação monetária e o volume de
transacções, desde que se introduzisse o elemento tempo na análise e se
considerasse a velocidade de circulação da moeda como função da
conjuntura económica. O coeficiente de proporcionalidade não seria., assim,
constante e a lógica quantitativa não seria automática.

A escola de Cambridge introduziu novas interpretações sobre o valor da
moeda, partindo da investigação quantitativa, mas superando-a. Marshall,
Robertson e Keynes recusaram sempre qualquer automatismo à equação geral
de trocas, procurando introduzir-lhe factores explicativos ligados aos
comportamentos e expectativas dos sujeitos económicos. Alfred Marshall
formulou, aliás, uma equação comparável à de Irving Fisher:

M=KPQ.
A única diferença estaria na inclusão do conceito K, algo indefinido (que seria
matematicamente o inverso da velocidade de circulação da moeda) - M:K=PQ -
e que corresponderia à preferência pela liquidez, ou seja, à percentagem de
rendimento que os sujeitos económicos desejam possuir em moeda.
Dennis Robertson partiu da fórmula de Alfred Marshall, precisando melhor o
conceito K. Segundo esta equação, o nível geral de preços dependeria da
quantidade de moeda e do montante do rendimento que os sujeitos
económicos mantêm líquido, e utilizável imediatamente em moeda. Assim,
P=M: (KR). O nível geral de preços P varia na razão directa da massa
monetária M e na razão inversa da reserva líquida KR, sendo K a preferência
pela liquidez e R o rendimento nacional. O nível de preços não depende
apenas da quantidade de moeda, mas também do comportamento psicológico
dos sujeitos económicos.
Os críticos de Robertson vieram, no entanto, dizer que ele apenas tinha em
consideração o rendimento e não as transacções, o que não permitia aferir o
real valor da moeda. Perante a crítica, D. Robertson reformulou a sua equação
para P'=M: (K'T). P é o nível geral de preços das transacções, T o volume das
transacções e K' a percentagem sobre o volume de transacções que os
sujeitos económicos desejam manter em espécies monetárias líquidas.

John Maynard Keynes foi quem melhor desenvolveu o conceito de reserva
líquida. Introduziu o conceito de unidade complexa de consumo, que
corresponde ao conjunto de artigos normalmente objecto de aquisição e
consumo numa comunidade. Tendo por centro aquele conceito, Keynes
apresentou a seguinte equação:

N= P (K+RK')

N representa a moeda em circulação acrescida das reservas bancárias; P é o
preço global da unidade complexa de consumo, K é a quantidade de unidades
complexas de consumo para cuja aquisição se conserva moeda metálica ou
papel moeda, K' é a quantidade de da unidades complexas para cuja aquisição
se conserva moeda escritural, R é a relação mantida entre as reservas
bancárias e os depósitos. Pressupõe-se, assim, um volume de transacções
constante. O nível geral de preço varia quando a massa monetária se altera.
No entanto, ainda poderia variar, mas na razão inversa, quando K, K' ou R
sofressem modificação. Enquanto K e K’ dependeriam dos hábitos da
comunidade R variaria de acordo com a política bancária.

Se é verdade que o próprio J.M. Keynes reconheceu que a sua equação se
limitava aos preços de consumo, o certo é que ela nos permite compreender a
interacção entre os comportamentos psicológicos dos sujeitos económicos e a
política monetária. Note-se que na sua célebre Teoria Geral do Emprego, Juro
e Moeda (1936), o autor apresentou uma fórmula muito simplificada para
explicar o valor da moeda. J.M. Keynes entendia que só depois de se alcançar
uma situação de pleno emprego o aumento de moeda produziria aumento do
nível geral de preços. P= Y: O, sendo Y as despesas em moeda e O o volume
de bens e serviços produzidos. Assim, os movimentos de moeda apenas se
repercutiriam nos preços em conjunturas de pleno emprego dos recursos
produtivos. Como é evidente a primeira equação de Keynes apenas se
aplicaria em situação de pleno emprego.

Knut Wicksell (1851-1926), fundador da escola sueca da economia, deu um
contributo decisivo para o apuramento do valor da moeda. No seu estudo de
1898 sobre o juro e os preços (Geldzins und Güterpreise) demonstrou que os
preços variam segundo as alterações nos investimentos e que o nível destes
depende da taxa de juro nas aplicações de capitais. Em cada momento haveria
uma taxa de juro natural, adequada ao equilíbrio entre a poupança e o
investimento. Se os bancos estipulassem um juro correspondente à taxa
natural a produção desenvolver-se-ia regularmente. Se o juro bancário fosse
inferior ao juro natural, os investimentos cresceriam, o emprego aumentaria,
aproximar-nos-íamos do pleno emprego e o nível geral de preços aumentaria.
Quando o juro bancário fosse superior ao juro natural haveria baixa de
produção e desemprego. Assim, para Wicksell o valor da moeda dependeria da
variação dos investimentos. Tal como em Keynes, também aqui só há aumento
do nível geral de preços se houver equilíbrio e pleno emprego. Pela primeira
vez, encontramos a moeda inserida numa teoria geral de desenvolvimento
económico.

F. von Wieser (1851-1926), da escola austríaca, estuda o valor da moeda em
função da teoria do valor dos bens em geral. Como marginalista entende que o
valor da moeda também depende da importância atribuída à última unidade
monetária disponível. No entanto, esta última utilidade é indirecta - tem a ver
com o poder de compra dessa unidade monetária. Eis porque o rendimento
assume aqui uma importância fundamental. Quando o rendimento aumenta, os
sujeitos económicos dispõem-se a dar maior número de unidades monetárias
para satisfação das suas necessidades. Logo, os preços tendem a subir e o
valor da moeda a reduzir-se. A equação de von Wieser é, pois, P = R: Q. P é o
nível geral de preços, R o rendimento nominal monetário, Q o volume de
transacções ou rendimento real. Assim, as variações de preços não são
determinadas automaticamente pelas alterações da massa monetária,
dependendo de apreciações subjectivas. Temos, assim, que é determinante
conhecermos qual a propensão marginal para o consumo e a propensão
marginal para a poupança por parte dos diversos agentes económicos - pode
assim haver acréscimos na massa monetária sem influência no rendimento, e
variações no valor da moeda não originados pelo crescimento da massa
monetária.
Em princípio segundo a teoria do rendimento, um aumento de
rendimentos traduz-se em acréscimo no volume de transacções ou na
velocidade de circulação da moeda.

Albert Aftalion aperfeiçoou as conclusões a que chegou a escola marginalista..
Se foi importante o facto de von Wieser ter posto a ênfase no rendimento e na
raridade, a verdade é que a utilidade da moeda apresenta especificidades que
devem ser expressamente consideradas. Assim, para Aftalion não basta
considerar a satisfação de necessidades pela última unidade monetária, é
indispensável ter em consideração a satisfação esperada pela utilização
dessa última unidade monetária. Há, pois, múltiplos factores a influenciar o
valor da moeda, a partir dos conceitos de raridade e de utilidade - desde as
emissões monetárias, o montante de moeda escritural em curso, os câmbios,
às relações com o estrangeiro, a que acrescem desde as quantidades de bens
produzidas e transaccionadas ou os respectivos custos ao clima dos negócios.
O valor da moeda dependerá, no pressuposto, de haver um volume de
transacções constante, não só do rendimento mas também da previsão das
variações futuras do poder de compra da moeda.

As expectativas
psicológicas têm um papel fundamental - a falta de confiança, o pessimismo,
as ondas de pânico podem induzir quebras acentuadas no valor da moeda…
Afinal, o valor da moeda depende de um conjunto complexo de factores
económicos, sociais e psicológicos.

11.4. Procura e oferta de moeda. A criação monetária. Moeda escritural e
multiplicador de crédito.

A procura de moeda no decurso de um determinado período corresponde às
somas adquiridas nesse mesmo período que o agente económico escolhe
conservar sob a forma líquida. Devemos recordar o circuito económico, no qual
as famílias, as empresas e o Estado se relacionam entre si… A procura de
moeda está, deste modo, inserida na escolha do consumidor, no seio das
famílias, e na escolha do produtor, no que respeita à empresas. Já vimos quais
os motivos da preferência pela liquidez (transacção, precaução e especulação).
Os agentes económicos definem pelos seus comportamentos a procura de
moeda e indicam os factores económicos que fazem variar essa procura, bem
como o sentido em que actuam.

A preferência pela liquidez é influenciada por
dois factores - de um lado, a taxa de juro; de outro, o rendimento.

O nível da taxa de juro influencia negativamente a preferência pela liquidez,
uma vez que quanto mais alto ele for menor será a tendência para manter a
liquidez dos meios monetários. A taxa de juro é o custo de oportunidade
referente à detenção da moeda. A procura de moeda aparece, assim, como
uma função decrescente da taxa de juro.

O nível do rendimento influencia, pelo contrário, positivamente a procura de
moeda. Quanto mais elevado for o rendimento maior será a tendência para
deter moeda líquida apta para a compra de bens e serviços. A procura de
moeda surge, assim, como função do rendimento.
Já analisámos as diferentes formas de moeda - metálica, papel moeda,
escritural - bem como a quase moeda. Importa agora referir a criação
monetária pelos bancos comerciais e pelos bancos centrais.~

Como já vimos, a
moeda escritural resulta da criação monetária pelo sistema bancário,
correspondendo a operações de escrita, que são lançadas em conta corrente,
apenas existindo movimentos monetários em relação aos saldos, a crédito ou a
débito. A moeda escritural reporta-se ao conjunto dos “saldos dos depósitos à
ordem”.

Começando pela banca comercial, verificamos que o crédito bancário dá lugar
a criação monetária. Como é que tal fenómeno decorre? Estamos perante a
criação de moeda escritural. Suponhamos que o Banco A concede um crédito
de 1000 Euros à empresa B. A empresa B vê creditada na sua conta a referida
quantia. E com ela procede a pagamentos, através de depósitos bancários. Os
bancos beneficiários desses depósitos vão dispor desses montantes para
realizarem novos empréstimos e esses empréstimos vão gerar novas
despesas, novos depósitos e novos empréstimos.
Tudo se passa de modo semelhante ao que ocorre com o multiplicador de
investimentos já estudado. No entanto, aqui em lugar de nos referirmos à
propensão marginal para a poupança, referimo-nos ao coeficiente de reserva
dum banco comercial - que é a percentagem do montante dos depósitos que
deverá ficar sob a forma líquida e que não poderá ser objecto de empréstimo.
Neste caso, partamos do princípio de que o coeficiente de reserva é de 20%.
Ora, sabendo nós que o multiplicador K é igual ao acréscimo de moeda
escritural ΔM a dividir pelo acréscimo de crédito ΔC, e também que K é o
inverso do coeficiente de reserva, então o multiplicador será de 5. K(5)= ΔM
(5000) : ΔC (1000) ou K(5)= 1: 20%.
O crédito concedido pelo banco A de 1000 Euros vai gerar pelo depósito da
empresa B no Banco C a concessão, por parte deste, de créditos no valor de
800 Euros e à manutenção de uma reserva líquida de 200 Euros… O
fenómeno de criação de moeda escritural pelo sistema bancário vai ocorrer
deste modo e de forma sucessiva. A quantidade de moeda bancária nova (ΔM)
criada pelo multiplicador de crédito é obtida multiplicando o montante do crédito
inicial (ΔC) pelo inverso do coeficiente de reserva (5).
A criação de moeda bancária é tanto mais forte quanto o coeficiente de reserva
dos bancos comerciais for mais fraco. Se o coeficiente for apenas de 10% o
multiplicador será de 10. À semelhança do que ocorre no multiplicador de
investimento também aqui o efeito só tem consequências reais se estivermos
em situação na qual não há pleno emprego de todos os factores de produção.
A moeda criada pelos bancos centrais reveste-se de duas formas - ou a
emissão de notas (papel-moeda) ou a inscrição de uma soma na conta
corrente aberta pelo banco central em nome da instituição de crédito comercial
considerada. Assim, a moeda do banco central é criada quer por ocasião das
operações de crédito outorgadas por ele aos bancos comerciais, quer por
ocasião das operações de compra de moeda estrangeira no mercado cambial
(divisas). Assim se estabelece uma relação estreita entre a actividade do
banco central e a economia. À medida que a economia cresce e que o
multiplicador de investimento gera acréscimo de rendimento vai havendo
condições para a criação monetária sem que ela dê origem a inflação.
Os Bancos Centrais têm outras funções além da emissão monetária - a saber,
a supervisão prudencial do sistema financeiro, de modo a garantir a solidez e
a confiança nos intermediários financeiros. Garante-se, assim, por exemplo à
banca comercial a realização das provisões ou reservas indispensáveis à boa
saúde financeira do sector. Os Bancos Centrais poderão ainda ser Caixas
centrais do Tesouro, terem a seu cargo a gestão das reservas cambiais ou
serem as Câmaras de Compensação que permitam aos intermediários
financeiros realizarem entre si as operações bancárias de natureza escritural.
Hoje os Bancos Centrais da União Económica e Monetária (UEM) participam
no Sistema Europeu de Bancos Centrais (SEBC), como veremos a seguir.

Para uma boa compreensão do funcionamento da moeda, importa ainda
alinhavar algumas notas sobre a evolução dos sistemas monetários.

I.

O sistema tradicional do padrão ouro colapsou na 1ª Grande Guerra. Entre
1925 e 1931 ainda foi fugazmente restabelecido numa modalidade mitigada
(ouro-divisas). Em 1933, porém, o Presidente F. D. Roosevelt nacionalizou o
ouro na posse dos cidadãos e revogou os contratos nos quais os pagamentos
fossem especificados em ouro. Em Julho de 1944 reuniu-se em Bretton
Woods (New Hampshire) a Conferência que lançaria o novo Sistema
Monetário Internacional (SMI) no pós-Guerra.
Apesar do Reino Unido ter sido representado por J. M. Keynes, a conferência
foi marcada por Harry D. White, Sub-Secretário de Estado do Tesouro dos
EUA. O plano de White viria a ser aprovado. Nele o valor das moedas seria
definido por um sistema de paridades fixas relativamente ao Dólar dos EUA. E
não já em relação ao ouro. Indirectamente havia, porém, uma referência ao
ouro, uma vez que o Dólar era convertível em ouro para cidadãos estrangeiros.
Uma Onça de ouro fino valia, então, 35 dólares. Assim, as reservas dos bancos
centrais passaram a poder ser constituídas por ouro ou por Dólares dos EUA.

Para gerir este sistema foram criados o Fundo Monetário Internacional (FMI)
e o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (Banco
Mundial). O FMI teria a seu cargo a correcção dos desequilíbrios externos
originados no curto prazo e o BIRD teria a tarefa de apoiar as acções ligadas
ao desenvolvimento e ao médio e longo prazos. O plano de Keynes não foi
aceite. Previa a criação de uma moeda internacional, o Bancor, convertível nas
diferentes moedas nacionais e nele se propunham medidas de
acompanhamento e estabilização quer para os países em situação
excedentária quer para os países em situação negativa no tocante aos
pagamentos externos.
A evolução da economia mundial conduziu, no entanto, a que a criação
monetária em Dólares tenha ultrapassado largamente as reservas em ouro
norte-americanas de Fort Knox. Em 15 de Agosto de 1971 o Presidente Nixon
decidiu, perante a crise do sistema, unilateralmente pôr fim à convertibilidade
internacional do Dólar em ouro - dando um golpe fatal no sistema monetário.

Chegava a desmonetarização do ouro e a instauração dos câmbios flutuantes.
O sistema monetário internacional de Bretton Woods deu lugar a una lógica
regional, deixando de se basear no Dólar no ouro e passando a referir-se aos
Direitos de Saque Especiais (DSE) criados em 1969 como moeda de
regularização entre autoridades monetárias.

II.

A história da moeda única europeia remonta à Cimeira de Haia (Dezembro
de 1969). Na sequência do plano Barre sobre cooperação monetária (1968), o
Primeiro Ministro do Luxemburgo Pierre Werner (1913-2002) foi encarregado,
em Março de 1970 da presidência do grupo especial de estudos para o
estabelecimento de um plano por etapas relativo à União Económica e
Monetária - trabalho que culminará no relatório, apresentado em 8 de Outubro
de 1970 à Comissão Europeia e aos governos dos Estados membros. Estavam
lançadas as bases da união monetária, prevendo-se um sistema comunitário
de bancos centrais, a liberalização dos movimentos de capitais e a fixação
irrevogável da paridade entre as moedas europeias, com a transferência de
importantes competências para a Comunidade.
A realização desta união deveria ocorrer, segundo Pierre Werner, em duas
etapas. Na primeira, a começar em 1 de Junho de 1971, definir-se-iam, com
reforço da cooperação entre os bancos centrais, as orientações fundamentais
de política económica e monetária. As margens de flutuação das diferentes
moedas da Comunidade seriam contidas em limites estáveis. A segunda, após
um rigoroso balanço feito até ao 31 de Dezembro de 1973, previa que as
acções prosseguidas passassem a uma disciplina mais rigorosa, criando-se um
Fundo Europeu de Cooperação Monetária (FECOM), que praticaria as
intervenções necessárias no mercado de câmbios para manter a coesão
monetária dos países membros. Para Werner seria indispensável, porém,
haver um "centro de decisão", um conselho encarregado de definir a política
macro-económica dos seis, responsável perante o Parlamento europeu, com
poderes acrescidos e eleito directamente por sufrágio universal.
A Comissão europeia aprovou em 22 de Março de 1971 um Plano, com base
no documento. Aí se previam três etapas, que deveriam culminar na união
económica e monetária, antes do final da década - tendo a França recusado a
"ideia" de um centro de decisão. No ano seguinte (7.3.72) viria a ser criada a
Serpente Monetária Europeia, preparatória do Sistema Monetário Europeu,
limitando a 2,25%, para mais e para menos, a margem máxima de flutuação
entre o valor da moeda mais valorizada e da moeda menos valorizada do
sistema.
A crise do Dólar da Primavera de 1971, o Smithtsonian Agreement de
Dezembro de 1971 e o choque petrolífero de 1973 comprometeriam o
cumprimento dos calendários e a concretização do plano. O sistema da
serpente não teve resultados satisfatórios. Em 1979 foi inaugurado o Sistema
Monetário Europeu (SME). Então foi criada a unidade de conta europeia - o
Ecu, European Currency Unit - usando-se o critério da unidade de conta cabaz,
cujo valor era definido com base no peso relativo de cada uma das moedas dos
Estados participantes no SME.
Dez anos depois, o Plano Delors (Abril de 1989) lançou o processo que
culminaria no Tratado de Maastricht (adoptado em Dezembro de 1991 e
entrado em vigor em 1 de Novembro de 1993) e na criação da UEM e do Euro.

Aí se adoptaram critérios de convergência nominal tendentes à introdução
da moeda única: estabilidade do nível de preços, aproximação das taxas de
juro de longo prazo dos níveis verificados nos países com melhores resultados
em termos de inflação, estabilidade da cotação da moeda e da disciplina das
finanças públicas, avaliada em termos de grandeza do desequilíbrio do
orçamento (défice não superior a 3% do PIB) e da dívida pública (não superior
a 60% do PIB).

Em Maio de 1998 os chefes de Governo da Comunidade confirmaram que a
União Económica e Monetária (UEM) começaria a funcionar a 1 de Janeiro
de 1999, sendo o grupo fundador constituído por 11 países (Alemanha, Áustria,
Bélgica, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Irlanda, Itália, Luxemburgo e
Portugal). O Reino Unido e a Dinamarca fizeram uso da faculdade que o
Tratado lhes atribuía e ficaram de fora. A Grécia e a Suécia não cumpriram os
critérios de convergência – vindo a Grécia a aderir posteriormente (2001). Em 1
de Janeiro de 1999 foram fixadas definitiva e irrevogavelmente as taxas a que
as moedas nacionais foram substituídas pelo Euro. Hoje (2009) fazem parte
deste sistema de “cooperação reforçada” 16 dos 27 Estados-membros (além
dos fundadores: Grécia, Eslovénia, Chipre, Malta e Eslováquia). Se Portugal
cumpriu à partida todos os requisitos de convergência nominal, a verdade é
que quer a Bélgica, quer a Itália, quer a Grécia não cumpriram o limite da
dívida pública de 60% do PIB, já que ultrapassavam os 100%. A posteriori veio
a verificar-se ainda que a Grécia não cumpriu também o critério do défice
orçamental.

No caso português 1 Euro correspondeu a 200,482 escudos. Para servir de
base à União monetária foi criada uma estrutura de base federal constituída
pelo Banco Central Europeu (com sede em Frankfurt) e pelos Bancos
Centrais nacionais dos Estados membros da União - o Sistema Europeu de
Bancos Centrais (SEBC).

As vantagens da moeda única são de dois tipos:

eliminação dos custos de conversão de umas moedas nas outras para realizar
transacções internacionais (câmbios);

a eliminação dos custos de incerteza quanto aos câmbios futuros.

Há também mais transparência e concorrência nos mercados.

A desvantagem da moeda única resulta de os Estados não poderem
manipular os instrumentos monetários - taxas de juro de curto prazo e taxa de
câmbio da moeda, para favorecer a competitividade das exportações. Como
disse Pierre Werner, "o Euro constitui uma grande novidade nos mercados
financeiros internacionais. Tornar-se-á, sem dúvida, uma moeda de reserva,
sem aspirar necessariamente a um monopólio. A moeda única no limiar do
terceiro milénio é um grande resultado do entendimento entre os homens"
(1998).


III.

Em Portugal, de 1977 a 1990, a política monetária obedeceu a uma política
cambial de desvalorização deslizante. A partir de 1986 a taxa de depreciação
foi definida abaixo do diferencial de inflação entre Portugal e os principais
parceiros comerciais, a fim de reduzir esse diferencial. A partir de 1990 e até
Março de 1992 a desvalorização deslizante foi abandonada, vigorando um
índice composto pelas principais moedas europeias. Em Abril de 1992 o
Escudo aderiu ao Mecanismo de Taxas de Câmbio do SME, obedecendo à
banda de flutuação de mais ou menos 6%. Em Novembro de 1992, em virtude
de um ambiente de grande turbulência monetária, que determinou o abandono
do mecanismo pela lira e pela libra, o Escudo desvaloriza 6%. E em Maio de
1993 há um realinhamento adicional de -6,5%, em virtude da situação
internacional dos mercados. Em Agosto de 1993, seria definido no âmbito do
SME um alargamento das bandas de flutuação do Mecanismo de Taxas de
Câmbio para mais ou menos 15%. O Escudo conheceu, porém, uma grande
estabilidade a partir de então, havendo apenas em Março de 1995 um último
ajustamento de 3,5%.

IV.

O impropriamente designado Pacto de Estabilidade e Crescimento foi
adoptado, no âmbito da aplicação do artigo 104º do TUE, para garantir a
credibilidade do Euro e consta de dois Regulamentos do Conselho da União
Europeia relativos ao reforço da supervisão das situações orçamentais e à
clarificação da aplicação do procedimento sobre os défices excessivos, bem
como de uma Resolução do Conselho, adoptada na Conselho Europeu de
Amesterdão de 17 de Junho de 1997. Não se trata de um Pacto
intergovernamental, mas de uma Resolução política e de dois instrumentos
técnicos (Regulamentos CE nºs 1466/97 e 1467/97), que podem ser objecto de
alteração.
Estamos perante meios de salvaguardar a solidez das finanças públicas na
terceira fase da União Económica e Monetária, de forma a reforçar as
condições para a estabilidade de preços e a garantir um crescimento
sustentável conducente à criação de emprego. O objectivo visado de médio
prazo é, assim, o de alcançar posições orçamentais próximas do equilíbrio
(“close to balance”) ou excedentárias, que permitirão aos Estados membros
enfrentar as flutuações cíclicas normais, mantendo o défice público abaixo do
valor de referência de 3% do PIB. No caso de persistência de défice superior a
3% do PIB, não sendo a situação considerada excepcional e temporária, o país
fica sujeito a sanções pecuniárias, que podem assumir a forma de uma multa
de montante até 0,5% do PIB.
De acordo com os regulamentos, os países do Euro apresentarão programas
de estabilidade, enquanto os países não participantes na UEM continuarão a
apresentar programas de convergência. Em 1997 falou-se inicialmente apenas
de um Pacto de Estabilidade, tendo, porém, prevalecido o ponto de vista
segundo o qual o Crescimento económico não poderia ficar arredado ou
esquecido. Nesse sentido, ainda que timidamente, foi incluída a referência ao
crescimento e à criação de emprego.

Em finais de 2002, a Comissão Europeia, perante os sinais de abrandamento
e de recessão económicos veio a considerar a necessidade de os
regulamentos serem interpretados com inteligência e flexibilidade, tendo em
consideração as necessidades de combate à recessão, de investimento e de
criação de emprego, sem prejuízo do prosseguimento de um esforço de médio
prazo para a redução sustentada da despesa corrente. A violação em 2003 do
limite de 3 por cento para o défice orçamental pela França e pela Alemanha
determinou uma proposta da Comissão de aplicação das sanções previstas,
que o Conselho rejeitou. Perante este facto a Comissão suscitou junto do
Tribunal de Justiça a apreciação da conformidade da decisão do Conselho
relativamente aos Tratados da União Europeia. A nova Comissão europeia,
investida no Outono de 2004 apresentou ao Conselho Europeu uma revisão
dos regulamentos de 1997.
Assim, em 23 de Março de 2005 foram alterados os regulamentos de 1997
(através dos Regulamentos CE nºs 1055/2005 e 1056/2005, publicados a 27 de
Junho de 2005), no sentido de um maior realismo e flexibilidade. Nenhum
procedimento será levantado contra um Estado em caso de haver crescimento
negativo ou de se estar num período prolongado de muito fraco crescimento,
enquanto antes se exigia uma quebra de produto de pelo menos 2%. Por outro
lado, um Estado que registe um défice excessivo temporário, próximo do valor
de referência de 3% poderá invocar uma série de “factores pertinentes”, que
evitam o desencadear do procedimento, ligados ao crescimento potencial, ao
ciclo económico, à concretização de reformas económicas (aposentação,
segurança social), às políticas de investigação e desenvolvimento, aos
esforços orçamentais com efeito a médio prazo…
O prazo de correcção deixa de ser de um ano, passa a ser de dois anos, com
possibilidade de prolongamento, em casos devidamente justificados. Por fim,
prevê-se a existência de um mecanismo preventivo que permita
diferenciadamente aos Estados-membros atingirem um equilíbrio ou um
excedente orçamental, num caminho de sustentabilidade a médio prazo das
finanças públicas, bem como a vigilância reforçada para que a dívida se
aproxime do valor de referência de 60%.

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