segunda-feira, janeiro 12, 2009

 

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1º Semestre

Direito Romano - Conjunto de normas que vigoram em Roma.

Desde cerca de 1900 a 1950, verifica-se uma profunda crise do ensino e dos estudos (no seu aspecto jurídico) do Ius Romanum. Crise essa que foi superada em 1956, após o que o Direito se transformou numa parte integrante e essencial da formação de todo e qualquer Jurista.

Hoje entende-se que, quanto mais intenso for o conhecimento do Ius Romanum mais nítida e mais firme será a consciencialização do nosso actual Direito.

Noção de Ius

Como geralmente acontece com as coisas difíceis, ainda hoje não se sabe concretamente a origem da palavra Ius

Ius

Iussum - Segundo uns vem de Iussum (ordenar, preceituar); Então o Ius significaria o que está preceituado ou ordenado.

Yung - Para outros, deriva da palavra Yung segundo a qual Ius seria aquilo que foi determinado pelo juízes em Assembleia, visto serem estes a expressarem o pensar da comunidade.

IousModernamente, e já antes, vários autores pensam que Ius tenha a sua origem na palavra Ious, algo procedente da divindade.


Iustum - O Dr. Sebastião Cruz parece inclinar-se para Iustum. Logo Ius é tudo o que tem especial relação com o Justo.

Âmbito da expressão Ius Romanum

Ius Romanum Stricto Sensu = 753 a. C. – 565 d.C.

a) Ius Romanum Stricto Sensu = Ius Civile (Cives) + Ius Peregrini/ Gentium (Peregrinis)

Costume

b) Ius Romanum Stricto Sensu = Ius Civile (Cives) Lex

Iurisprudêntia

+ Ius Praetorium (actividade do magistrado Pretor)

A expressão Ius Romanum pode ser tomada em 3 acepções (sentidos):

1) Stricto Sensu

2) Lato Sensu

3) Sensu Latissimo

O Stricto Senso é igual ao conceito de Direito Romano, ou seja, é o conjunto de normas jurídicas que vigoraram em Roma e seus territórios desde 753 a.C. a 565 d.C., ou seja 13 séculos de existência.

O Lato Senso traduz na tradição romanista desde o Sec VI d.C. até à actualidade.

Pode dizer-se que a vida do Direito Romano termina no Sec. VI, mas a sua vivência projecta-se até aos nossos dias.

O Senso Latissimo compreende tanto o Ius Romanum (Direito Romano Stricto Senso) como a tradição romanista (Direito Romano Lato Senso), ou seja de 753 a.C. até aos dias de hoje.

O objecto do nosso estudo será o Ius Romanum Stricto Sensu, ou seja, o conjunto de normas jurídicas que iniciam a sua vigência no ano de formação de Roma, como cidade (753 a. C. até à morte do primeiro dos mais importantes Imperadores do Império Romano do Oriente – o Imperador Justiniano que morre em 565 d.C.).

A análise destes, quase 13 séculos de existência do Império Romano, far-se-á por referência ás épocas históricas e políticas que se podem delimitar na vida deste Direito.

Noção de Ius Romanum por referência aos sistemas jurídicos que o compunham e cujos critérios distintos radicavam:

a) No diferente grupo dos seus destinatários;

b) No diferente conjunto das respectivas fontes de Direito

Uma cabal noção de Direito Romano, não pode circunscrever-se à indicação do seu período de vigência. Com efeito, atendendo à profunda relação existente entre este Direito e o próprio Império, que levou Sebastião Cruz a afirmar “que o Direito Romano era um verdadeiro Direito Imperial”, é natural que o Direito Romano tivesse tido uma evolução quase que paralela com a do próprio Império.

Inicialmente, em Roma aplicava-se Direito Romano que significava apenas Ius Civile.

Assim, num primeiro momento que antecede a formação do império e em que o Direito Romano tem por objectivo exclusivo regulamentar as relações jurídicas dos elementos da sociedade de Roma, titulares de cidadania romana – o Direito Romano identificava-se com o chamado Ius Civile (por Ius Civile deve entender-se o conjunto de normas juridico-romanas aplicadas exclusivamente aos Cives (aos cidadãos romanos)).

Num segundo momento, que se inicia com a expansão territorial de Roma e a consequente conquista de novos territórios e subordinação dos seus povos, coloca-se o seguinte problema:

- Aqueles povos, aos quais Roma reconhece a possibilidade de manterem a sua liberdade, ou seja, que não reduz a escravos, começavam a estabelecer relações jurídicas com cidadãos romanos e necessidade regulamentar. Contudo, o Ius Civile não o podia fazer porque não foi criado com esse objectivo, sendo assim, tornava-se imperioso a criação de um outro sistema de normas, também juridico-romanas, mas cujos destinatários já não eram exclusivamente os Cives, mas também, os Peregrinis. Surge então, o Ius Peregrine que tal como o Ius Civile é Direito Romano, mas que visa regulamentar a relação jurídica em que, pelo menos, uma das partes seja Peregrinis.

Periodização histórica do Ius Romanum

Ao longo dos 13 séculos de existência do Direito Romano destacam-se 4 fases históricas.

Atendendo para o efeito, a um critério que denominamos de jurídico-interno. Este critério permite traçar uma espécie de ciclo genético na vida deste Direito.

Identificada a fase do seu nascimento ou formação que se apelida de Fase Arcaica, seguida pela fase do seu desenvolvimento e auge que se chama de Clássica, à qual sucede a fase da sua decadência denominada por Pós-Clássica e por último a da sua codificação, que em homenagem à principal figura deste período e que se chama Fase Justinianeia.

Fase Arcaica

Inicia-se em 753 a.C. (ano de formação de Roma como cidade) e termina em 130 a.C. (ano do aparecimento de uma das mais importantes leis do Direito Romano – Lex Aebutia de Formulis), é a fase da formação das instituições jurídico-romanas, e por isso, a sua característica é a imperfeição, sendo de referir que nesta fase, entre o Direito, a Moral e a Religião existe uma espécie de continum, ou seja, pode mesmo dizer-se que estes 3 mundos formam um todo.

A Fase Arcaica subdivide-se em 2 etapas:

1ª – (753 a.C. a 242 a.C.), denomina-se de período exclusivo dos Ius Civile.

2ª – (242 a.C. a 130 a.C.) é caracterizada pela coexistência do Ius Civile e do Ius Peregrini ou Gentium (o ano de 242 a.C. marca o aparecimento do Magistrado Pretor Peregrino, que tinha por função, resolver os litígios em que pelo menos umas das partes era um Peregrini. Ora, da actuação deste Magistrado nasce um conjunto de normas jurídico-romanas que constituíam o chamado Ius Peregrini.

Fase Clássica

Inicia-se em 130 a.C. e termina em 230 d.C., é o período de desenvolvimento e apogeu do Direito Romano, pelo que a sua característica é a perfeição. Caracteriza-se pela exactidão e perfeição, sendo que a grandeza do Ius Romanum encontra-se nesta época. Em grande medida esta perfeição ficou a dever-se à actividade notável de alguns Jurisconsultos Romanos que não só se manifestaram exemplares intérpretes deste Direito, como o aplicaram de forma notável às situações da vida social, bem como criaram normas para algum caso especial, não previsto nas normas já existentes, pelo que se pode dizer que a ciência jurídica desta época, ou seja a Iurisprudêntia era muito criadora.

De entre estes Jurisconsultos notáveis destacam-se dois: Ulpianus e Iulianus.

Segundo o Historiador Álvaro D’ors esta época subdivide-se em 3 fases:

1 – Fase pré-clássica – Período de grande desenvolvimento do Ius Romanum

2 – Fase clássica central – Período de maior esplendor e perfeição do Ius Romanum

3 – Fase clássica tardia – Período em que já se nota uma certa decadência do Ius Romanum, isto porque neste período os Jurisconsultos começaram a limitar-se ás obras de compilação perdendo o génio criador.

Fase Pós - Clássica

Inicia-se em 230 d.C. e termina em 530 d.C., é o período sem individualidade própria, pois medeia entre a época Clássica e a Justinianeia, caracteriza-se pela decadência do Ius Romanum, devido a factores vários, dentro dos quais se destaca, como característica geral, a perda do génio criativo dos Jurisconsultos Romanum que deixam de produzir obras novas, para passar a elaborar resumos das obras clássicas ou compilações, onde repetem o que foi dito pelo Jurisconsultos Classicus.

A característica desta fase é a confusão jurídica quer a nível conceptual quer a nível terminológico.

Muito importante (sai no teste)

Características especiais:

No Império Romano do Ocidente, o processo de decadência do Direito Romano atinge um nível tal, que se fala mesmo de uma vulgarização deste Direito. Assim sendo, a partir deste período e até à queda do Império Romano do Ocidente, o Direito que nele vigorou foi chamado Direito Romano Vulgar. Como factores decisivos para o aparecimento deste Direito Romano Vulgar encontram-se os seguintes:

a) A circunstância de nos territórios que constituíam o Império Romano do Ocidente, existirem já povos a que convencionou chamar-se Povos Autóctones, os quais dispunham de um Direito essencialmente de base consuetudinária (de antigo uso), tendo havido uma natural mistura entre esse Direito e o Direito Romano.

b) Ao facto de no Império Romano do Ocidente não existirem escolas de Direito, o que justificava a profunda impreparação dos seus juristas, incapazes de entender, interpretar e, em consequência, aplicar à prática social, os textos do Direito Romano Clássico. Assim sendo, na prática jurídica e forense, nesta parte do Império, e que se utilizavam eram traduções, cópias e resumos imperfeitos e muitas vezes entre si contraditórios do Direito Romano Clássico.

c) Ao facto desta parte do Império ter sido muito invadido por vários povos, a que os Romanos chamavam Povos Bárbaros, de entre os quais se destacam os Germânicos e que eram titulares de um Direito bem estruturado, que acabou por sobrepor-se às referidas cópias imperfeitas dos textos de Direito Romano Clássico.

d) Por último, a vulgarização do Direito foi uma expressão de um fenómeno generalizado de vulgarização cultural, que se reflectiu também, por exemplo, na utilização do Latim Vulgar.

Em conclusão, todos os referidos factores contribuíram decisivamente para um empobrecimento a nível conceptual terminológico e estrutural do Direito Romano.

Diversamente no Império Romano do Oriente, o Direito Pós-Clássico não conduziu ao Direito Romano Vulgar, porque devido à actividade do Imperador Justiniano se travou o processo de decadência do Direito Romano

Fase Justinianeia

Inicia-se em 530 d.C. e termina no ano da morte do Imperador, em homenagem ao qual esta fase existiu, referimo-nos ao Imperador Justiniano, que morre em 565 d.C.

Advertência inicial: em bom rigor, esta época histórica só existe para o Direito Romano do Império do Oriente, caracterizado por um esforço de codificação do Direito Romano, sobretudo clássico, cujo grande mentor foi o Imperador Justiniano, que tendo sido um grande classicista, procurou pôr termo ao processo da decadência do Direito Romano, mediante uma valorização do Direito produzido na época clássica.

Dentro desta sua finalidade, Justiniano encarregou um grupo de Juristas das Escolas de Constantinopla e Beirute, com destaque para Triboniano, da feitura daquela que é considerada a principal obra escrita deste Direito – O Corpus Iuris Civilis – C.I.C.

Para todos os historiadores do Direito Romano, esta obra representa a principal fonte Cognoscendi do Direito Romano e, ao mandar elabora-la, Justiniano elaborou planos que claramente demonstram que a sua intenção era a de proceder a uma selecção e compilação de todo o Direito Romano produzido até si, dividindo em: Ius Romanum Vetus e Ius Romanum Novum.

O primeiro é todo o Direito Romano produzido pelas suas diversas fontes (pelo costume) quer na acepção de Mores Maiorum, quer as de consuetudo, pela Lex, quer em Stricto Senso (na Lex Rogata; Plebiscito; Lex Dictae e Lex Datae), quer na Lato Sensu (pelos Senatusconsultos e pelas Constituições Imperiais) e a Iurisprudêntia

Costume ÌMores Maiorum

Ì Consuetudo

ÌLex Rogata

Lex Ì Stricto Sensu Ì Plebiscito

Ì Lex Dictae

ÌLex Datae

Lato Sensu – Senatusconsultos (Constituição imperial)

Iurisprudêntia (= actual doutrina) até ao Séc. IV d.C.

Enquanto o Ius Romanum Novum é todo o Direito Romano produzido a partir do Séc. IV d.C., sendo que este Direito produzido a partir do Séc. IV d.C. tinha como única fonte, as Constituições Imperiais.

Com efeito, vivia-se já o período político do principado, que correspondia a uma centralização de todos os poderes (incluindo o legislativo), na figura do Imperador, o qual passou a produzir leis chamadas Constituições Imperiais.

Quanto à sua estrutura interna, esta obra encontrava-se dividida em 4 grandes partes:

A 1ª que, segundo a tradição, foi elaborada pelo próprio Justiniano, chamava-se Institutiones, e consistiu numa espécie de manual introdutório para o estudo e compreensão do Corpus Iuris Civilis.

A 2ª continha o Ius Romanum Vetus e muito particularmente o Ius Prodença da época clássica chamava-se Digesto.

A 3ª continha o Ius Romanum Novum, ou seja, era uma compilação de Constituições Imperiais e chamava-se Codex.

A 4ª, e última, mandada elaborar porque algumas Constituições Imperiais não puderam ser compiladas no Codex, chamava-se Novellae.

“A título de nota, ler sobre o Corpus Iuris Civilis, pag. 35 a 37 do manual”

A periodização política do Ius Romanum

A intrínseca relação existente entre o Direito Romano e o Império Romano (Imperium)

Imperium – Poder de soberania ao qual ninguém se pode impor

Todo o Direito, sendo princípio constitutivo da acção social, emerge de uma sociedade, à qual regressa, em seguida, com o intuito de a regular. Significa isto que, todo o Direito é uma tradução normativa das especificações e das nucleares intenções de validade da sociedade a que se encontra directamente relacionada.

O que acaba de se dizer, vale exemplarmente para o Direito Romano que sempre apresentou uma profunda relação com o próprio Império Romano. Segundo Sebastião Cruz “o Direito Romano foi um Direito tipicamente Imperial” é uma manifestação disto, o facto de, o período de mais perfeição deste Direito ter coincidido com a maior expansão e conciliação do Império Romano e seu poder politico, referimo-nos à época clássica central.

A principal razão do ser desta intrínseca relação entre o Direito Romano e o Império Romano reside no facto de “todo o Ius ser um Vis” isto é, todo o Direito necessita para subsistir e ter efectividade de se fundar numa força que deve, contudo, entender-se como aquilo a que os Romanos chamavam uma Auctóritas (menos uma autoridade e mais uma legitimidade).

O critério adoptado;

Partindo das considerações que fizemos, o critério será o seguinte:

- Procurar-se-á determinar quais os órgãos ou estatutos políticos que, em Roma ao longo de todo o referido período, detinham o poder de soberania a que se chamava de Imperium

As várias formas políticas do Direito Romano

No início as formas políticas originárias resumiam-se: ou ao Estado-cidade, ou ao Estado-território.

Estado-cidade – É um agrupamento de homens livres, estabelecidos sobre um pequeno território, todos dispostos a defende-lo contra qualquer ingerência (interferência) estranha e sobretudo onde igualmente todos detêm uma parcela igual de poder.

Estado-território – Agrupamento de homens onde só um exerce o poder de modo absoluto e exclusivo.

As fases políticas:

- Monarquia (753 a.C. a 510 a.C.)

- República (510 a.C. a 27 a.C)

- Principado (território sujeito à jurisdição de um príncipe) (27 a.C. aos finais do Séc.III d.C.)

- Dominado (Finais do Séc. III ao ano 476 d.C.)

Monarquia

Comitia

Curiata

Lex Curiata

Rei; Senado; Povo

1 – Rei

Patrícios

2 – Populus Romanus

Plebeus

3 - Senado

Quando em 753 a.C. Roma se constituiu como uma cidade, adopta, para o efeito, o modelo de organização chamado Estado-Cidade, ou seja, a Civitas, que se caracteriza pelo facto de todos os homens, que a constituem, deterem uma igual parcela de poder. Nascendo como um Estado-Cidade colocava-se de imediato o problema da representatividade desse poder, que se encontrava, de modo igual, repartido pelos vários membros da comunidade.

A solução encontrada constituiu na criação do cargo de Rei, entendido como o Director da Civitas, ou seja, aquele que detendo o poder de Império, deveria gerir os destinos da cidade.

Em Roma, o cargo de Rei, sendo vitalício não era hereditário, ou seja, o Rei podia indicar o seu sucessor, mas este só seria Rei, após a investidura pelo Populus Romanus, reunindo num certo tipo de comícios, que se chamavam Comitia Curiata e ao acto de investidura de alguém, no cargo de Rei, chamava-se Lex Curiata D’Imperium, isto porque, para os romanos o poder (soberania) residia no povo que o transmitia ao Rei.

O Populus Romanus (Povo) era integrado por duas camadas distintas: uma mais aristocrata, os Patrícios, e outra mais humilde, os Plebeus, que entre si apresentavam manifestamente clivagens quanto à titularidade de Direitos e privilégios, ou seja os Patrícios tinham todos os direitos e os Plebeus não, o que originou várias lutas.

Exemplo:

Até ao ano de 320 a.C. só os Patrícios podiam ser membros do Senado.

O Populus Romanus exercia os poderes que possuía, sempre e só, na medida em que se reunisse em comícios ou assembleias populares, cujos mais importantes, nesta época, eram os comícios Curiata, onde se fazia a investidura do sucessor do Rei, em novo Rei, consoante a sua finalidade, podia falar-se nos seguintes principais comícios:

a) Comitia Curiata

Aqueles em que se produzia a Lex Curiata D’Imperium – A investidura do sucessor do Rei.

b) Comitia Centuriata

As centúrias eram agrupamentos de soldados e nestes comícios realizavam-se dois tipos de acções:

Ou se procedia à eleição de Magistrados Ordinários hierarquicamente superiores (Censor, Cônsul e Pretor)

Ou à votação de projectos de Lei elaborados por estes Magistrados e rogados ao povo para que este os votasse favoravelmente.

c) Comitia Tributa

As Tribus eram divisões territoriais de carácter militar, utilizadas frequentemente pelos Plebeus para construírem uma espécie de pequenos estados dentro do grande estado, que era a cidade de Roma. Os chefes destas Tribus, que eram também os que comandavam as lutas dos Plebeus. Lutas essas de igualdade com os Patrícios, ao qual se chamavam de Tributos ou Plebe e mais tarde na fase da Republica desempenhavam o papel de Magistrados.

d) Concilia Plebis

Eram comícios compostos, apenas, por Plebeus. Organizados com a finalidade de votar projectos de Lei, elaborados pelas Tribunas da Plebe, que caso fossem objecto de uma votação favorável, convertiam-se em normas jurídicas chamadas de Plebiscitos.

Quanto ao Senado, era durante a fase da Monarquia um órgão consultivo do Rei. Inicialmente esta junta consultiva era constituída pelos Patres, fundadores da Civitas e mais tarde pelos homens experimentados da vida que eram escolhidos apenas entre os Patrícios. Tinham uma composição aristocrática, visto que, até ao ano de 320 a.C. com a chamada Lex Oliva, só os Patrícios podiam integrar a composição do Senado, para além dos seus poderes consultivos. Só mais tarde em 312 a.C., com a Lex Ovinia os Plebeus ganham entrada definitiva chamando-se conscripti O Senado nesta fase detinha os seguintes outros poderes:

a) Nomear a Interrex, isto é, aquele que desempenharia o cargo de Rei, no lapso de tempo, desde a morte do antigo Rei até à investidura do novo Rei.

b) Conceder a aprovação às Leis votadas pelo povo nos comícios mediante a Auctoritas patrum (aprovação)

c) Imanar pareceres que funcionavam, sem parecer vinculativo, perante as consultas que lhes eram feitas e os quais se chamavam Senatusconsultum.

REPUBLICA

Magistraturas; Pretor; Senado; Povo

Vai desde, 510 a.C. a 27 a.C.

O elemento caracterizador da fase da Republica, são os Magistrados, desaparecendo, obviamente, o cargo de Rei.

O termo Magistratus etimologicamente (estudo a origem e derivação das palavras) significa, quer o cargo de governar (magistratura), quer a pessoa que exerce esse cargo (magistrado).

As magistraturas – O poder supremo não reside nesta época num só Rei, mas sim, em dois Cônsules, que são magistrados e exercem o seu poder por um ano e são eleitos pelo povo.

Em Roma, os Magistrados eram dois tipos, consoante pertencessem ou não a uma espécie de carreira diplomática, a que se chamavam Cursus Honorum.

Os que pertenciam aos Cursus Honorum designavam-se Magistrados Ordinários e os outros Magistrados Extraordinários.

Quanto aos Magistrados Ordinários encontravam-se dentro desta cadeira diplomática hierarquicamente organizados segundo um critério mais de dignidade do que propriamente de poderes.

No topo da hierarquia estava o Censor, em 2º lugar estava o Cônsul, em 3º lugar o Pretor, e 4º lugar o Edil Curul e por último o Questor.

Estes Magistrados Ordinários possuíam os seguintes poderes:

a) Poder de potestas, ou seja, poder de representar o Populus Romanum mediante a elaboração de projectos de leis, cujas votações eram rogadas pelo Magistrado proponente, no Populum reunido em comícios. Se essa votação fosse favorável e em seguida o Senado concedesse essa aprovação, nascia a Lex Rogata, que foi a mais importante da lei pública em Roma.

b) Poder de Imperium, que era o poder de soberania que os Magistrados elaboravam e ao qual nenhum cidadão se poderia opor (muito importante).

Este poder permitia ao Pretor, na resolução dos litígios à sua apreciação, emanava ordens que eram acatadas pelas partes envolvidas nesse litígio. Precisamente porque se fundava no Poder de Imperium. Como detinha o poder de soberania que antes cabia ao Rei, continha as seguintes faculdades:

- Comandar o exército

- Convocar o Senado

- Convocar a Assembleia Popular

- Administrar a Justiça.

No entanto, este poder é limitado por três circunstâncias muito importantes:

1. Temporalidade – Posto que cada magistratura durava apenas 1 ano

2. Pluralidade – dado que o poder se encontra repartido por várias magistraturas.

3. Colegialidade – Visto que dentro de cada magistratura existia mais do que um Magistrado. Os Magistrados Ordinários encontravam-se hierarquicamente relacionados entre si, de onde resultava a seguinte importante consequência: Todo o Magistrado hierarquicamente superior a um outro possuía o poder de vetar ou até anular qualquer decisão ou projecto de norma, elaborada pelo Magistrado que lhe era hierarquicamente inferior. A este poder chamava-se Ius Intercessionis.

.Poder Iurisdictio, era o poder de administrar a justiça de forma normal e corrente. Era o poder principal do Pretor. Competia igualmente ao Edil Curul, porém só para organizar os processos litigiosos, e também ao Questor, mas só para administrar a justiça em causas criminais.

De todos os Magistrados Ordinários, apenas o Pretor reunia, em simultâneo, a titularidade destes 3 poderes.

O segundo tipo de Magistrados que existiram em Roma, na época da Republica, foram os Magistrados Extraordinários, assim chamados por não pertencerem aos Cursus Honorum e eram 3:

1- Os Tribunos da Plebe - eram normalmente chefe das rebeliões levadas a cabo pelos Plebeus na sua constante luta por um regime de igualdade e privilégios com os Patrícios. Os tribunos da plebe, sendo embora, Magistrados Extraordinários possuíam de uma forma exemplar o Ius Intercessionis, porque podiam vetar ao até anular qualquer decisão ou projecto de norma elaborado por um qualquer Magistrado Ordinário. Para além deste poder, detinham um outro muito importante que consistia em elaborar projectos de normas relativos a interesses próprios dos Plebeus que depois eram apresentados e cuja votação era rogada a esses mesmos plebeus reunidos num tipo especial de comício chamado os Concilia Plebis. Se estas normas fossem votadas favoravelmente neste tipo de comícios (não eram em seguida apresentadas ao Senado para aprovação) se convertiam em normas jurídicas de carácter legal chamadas de Plebiscitos.

2 – Os Governadores da província (Ler Sebastião Cruz, pag. 76)

3 – O Ditador - Fazia parte de uma magistratura que para além de extraordinária era excepcional, pois não fazia parte da vida normal e permanente de Roma.

Nascia com a chamada Ius titum, isto é com a suspensão do ordenamento civil devido a calamidades públicas, motivadas por uma crise política interna (ex. Revoltas populares) ou externa (Guerras com o estrangeiro).

O Ditador concentrava em si todos os poderes da Civitas e assim o seu poder de Imperium era um poder sem qualquer limitação.

Nota: O poder de Imperium só pertenceu ao Cônsul, ao Pretor e ao Ditador, diferentemente ao que sucede com o poder de Potestas que é comum a todos os Magistrados.

Quanto ao Pretor – Em 367 a.C. foi criada a Magistratura dos Pretores e, portanto, a palavra Praetor passa a significar o Magistrado especialmente encarregue de administrar a justiça, de uma forma normal e corrente, nas causas civis.

O Pretor presidia à primeira fase do processo jurídico romano, a chamada fase In Iure onde se fazia a análise dos aspectos jurídicos da causa.

Na segunda fase do processo, a chamada Apud Iudicem, era feita a análise da questão de facto (prova e sentença). Esta fase era presidida pelo Iudex, ou seja, um particular diferente do Pretor.

Na fase inicial, apenas existia um Pretor, mas a partir do ano de 242 a.C. a administração da justiça foi distribuída por 2 Pretores, o Pretor Urbano e o Pretor Peregrino.

O Pretor Urbano tinha a seu cargo a organização dos processos cives nos quais apenas interviessem cidadãos romanos, ou seja, apenas aplicava o Ius Civile.

O Pretor Peregrino tinha a seu cargo a organização dos processos em que, pelo menos, uma das partes era Peregrini, ou seja, apenas aplicava o Ius Gentium.

Quanto ao Senado – Este é o órgão político por excelência da república, chamam-se Senatus Populusque Romanus. Era constituído pelas pessoas mais importantes e influentes da Civitas e tinha um verdadeiro carácter aristocrático.

O Senado não possuía poder de Imperium, mas tinha a Auctóritas, ou seja, o prestígio, gozando de grande influência na sociedade.

As suas decisões jurídicas, os chamados Senatusconsulta, apesar de terem a forma de meros conselhos, na prática eram verdadeiras ordens. No entanto a sua função mais importante, dentro do campo jurídico era a de conceder a Auctóritas Patrum para que as leis depois de votadas e aprovadas nos comícios - Comitia Centuriata, tivessem validade.

Quanto ao Povo – É o terceiro elemento da Constituição política republicana. Reuniam-se em Assembleia ou comícios com os seguintes poderes:

- Eleger os Magistrados

- Votar leis por eles propostas

- Funcionar como tribunal de última instância quando tinha lugar o Provocatio ad Populum, que surgia quando qualquer cidadão, nos casos mais graves, apelava para a Assembleia do povo (Comitia Centuriata) contra as decisões dos Magistrados.

Na república há 3 espécies de comícios:

- Comitia Curiata

- Comitia Centuriata, que intervém na eleição dos cônsules, dos Pretores, dos Ditadores e dos Censores e eram nos comícios que se procediam à votação das Leis que estes Magistrados propunham.

- Comitia Tributa, onde se elegiam alguns Magistrados menores e votavam-se certas Leis.

Para além destes três haviam os chamados Concilia Plebis, cujas decisões se denominavam Plebiscitos.

Os Plebiscitos no início não tinham carácter vinculativo, apenas a Lex Valeria Horacia de 449 a.C. se reconhece força obrigatória dos Plebiscitos mas apenas relativamente à Plebe.

Mais tarde com a Lex Hortensia de 287 a.C. é que é reconhecida força obrigatória dos Plebiscitos em relação a todo o Povo Romano, sendo equiparados às Leis comiciais.

Principado

Princeps; Senado; Povo

Vai desde 27 a.C. até 284 d.C. (Séc. III)

Se a Monarquia teve como elemento característico o Rei e a Republica os Magistrados, o Principado quando plenamente instalado como nova forma de organização política de Roma, tiveram como elemento polarizador o Princeps, ou Imperador.

Certa altura a Constituição política republicana torna-se insuficiente para as novas realidades e entra em crises sucessivas devido a diversos factores:

- O alargamento extraordinário do poder de Roma

- O aparecimento de novas classes sociais

- Lutas entre classes de vária ordem

- Revolta dos escravos que pretendem a liberdade

O povo Romano desmoralizado com os seus políticos volta-se para Octávio César Augusto, pois entendiam ser este o mais indicado para restabelecer a paz, a justiça, a moral, a política e a economia, retirando, assim, o país do caos que se encontrava nos últimos tempos.

Este ficou conhecido historicamente pela sua habilidade política, e em consequência, pelo processo estratégico que desenvolveu para centralizar em si todos os poderes sem, contudo, romper abruptamente com as estruturas políticas da República.

Octávio César Augusto aproveitando-se de todas estas circunstâncias, instaura uma nova forma constitucional – O Principado, (ficando ainda conhecido como o Pacificador, pois alcança uma paz duradoura que ficou conhecida na história como a Pax Augusta.).

Constituição política do Principado:

Princeps - A criação do Princeps é a grande novidade desta reforma constitucional, pois é a figura central da nova Constituição política.

O Princeps não é um Magistrado, mas antes um novo órgão político de carácter permanente investido de um Imperium especial de uma Tribunícia Potestas vitalícia que compreendia todos os Direito e deveres de um Tribuno da Plebe.

Octávio César Augusto, com o seu talento político, vai concentrando, pouco a pouco, na figura dos Princeps todos os poderes, apesar de as antigas magistraturas republicanas se manterem, o seu poder é quase irrelevante, pois estão subordinadas ao Princeps.

No início o Senado tem uma certa importância, atendendo fundamentalmente à sua posição aristocrática, Octávio César Augusto concede-lhes poder legislativo, pelo que só a partir deste momento os Senatusconsultos passam a ter natureza de verdadeiras leis do Ius Civile.

Contudo, a concessão de poder legislativo ao Senado foi também estratégica porque visava, por um lado esvaziar o Populus Romanum deste poder, e por outro lado permitir ao Imperador uma fácil conversão em leis de matérias que este pretendesse ver aprovadas como tal.

É por este motivo que a breve trecho os Senatusconsultos deixam de ser normas jurídicas de natureza legal produzidas pelo Senado, para se converterem nas chamadas Oraciones Princeps, representando extensões da vontade do Imperador, que convoca o Senado, expunha oralmente a matéria que pretendia ver convertida em lei, alcançando esse seu objectivo sem quase nenhuma oposição, posto que tais matérias eram votadas quase sempre sem previa discussão.

Pode-se assim dizer que a autoridade política do Senado foi gradualmente transferida para o Princeps.

Povo – Os comícios mantêm-se mas com o decurso do tempo vão deixando de funcionar, pois Octávio César Augusto retira-lhe o poder legislativo, pois este passa para o Senado conduzindo aqueles à extinção por inactividade, dado que, como foi visto na época da Republica, os comícios populares existiam essencialmente para a votação de propostas de normas elaboradas por Magistrados Ordinários (Lex Rogata) ou extraordinários (Plebiscito), e a outra parte passa para o exército que é um elemento novo que se vai afirmando cada vez mais decisivo e que fiscalizava quase tudo e dependiam exclusivamente do Imperador.

É neste contexto que o Principado se implementa em Roma, e que o Imperador se converte ele próprio num legislador.

As leis produzidas unilateralmente pelo Imperador chamavam-se Constituições Imperiais.

A partir do Sec. IV d.C., as Constituições Imperiais, também conhecidas por Leges, são em Roma a única fonte do Direito Romano.

A este Direito Romano, que se identificava como Constituições Imperiais, convencionou-se chamar-se Ius Romanum Novum, e foi compilado na época Justinianeia, encontrando-se no Codex e nos Novellae, que são partes integrantes do Corpus Iuris Civilis.

Dominado

Absolutismo

4ª Época política de Roma – 284 d.C. a 476 d.C.

Corresponde ao período historicamente conhecido de Baixo-império e é instalado em Roma pelo Imperador Deocleciano.

Deocleciano subiu ao poder em 284 aclamado Imperador pelos seus companheiros de armas, pois era um soldado severo, energético e autoritário.

Este inaugura um novo regime político proclamando-se Dominus, senhor único e Deus, daí chamar-se a este período Dominado, ou Império Absoluto.

Auto intitulava-se Deus pois entendia que o poder provinha de uma investidura divina e não de uma Lex Curiata d’ Imperium.

Estabelece-se, assim, uma forte rivalidade entre Deocleciano e o chefe da igreja, em virtude da qual, Deocleciano ordenou uma violenta perseguição aos cristãos.

Factos principais da época do Dominado:

1) Reforma político-administrativa de Deocleciano

2) Reconhecimento de Deocleciano da impossibilidade de manter todo o império sob seu único comando, havendo portanto, tendência para dividi-lo entre dois Imperadores. Deocleciano no Oriente e Maximiano no Ocidente.

Constantino consegue mais tarde uma união de Império, mas por pouco tempo, pois as divisões continuam a suceder.

O Império foi reunido pela última vez por Teodósio em 394 d.C. mas em 395 d.C., divide definitivamente o Império pelos seus dois filhos: Honório no Ocidente e Arcádio no Oriente.

3) Dá-se o reconhecimento do cristianismo como religião oficial a partir do tempo de Constantino.

4) O Dominado é também marcado pelas invasões barbaras.

Nota: Ver quadro no manual de págs. 82 a 87.

Fontes de Direito do Ius Civile

Classificação:

v Exsistendi – Órgãos Produtores

v Manifestandi – Modos de produção

v Cognoscendi – Documentos escritos

Fontes Manifestandi do Ius Civile

I) Costume

- Até ao Sec. IV d.C.Mores Maiorum

- Após o Sec. IV d.C.Consuetudo

II) Lex

- Lex Privata (Não é um verdadeiro Direito)

A sua base é um negócio privado, surgiu antes da Lei Pública e trata-se de um acto de disposição acerca de
uma coisa própria

- Lex pública

Consiste numa promessa solene da comunidade social, portanto baseia-se num Negócio Jurídico

- Stricto Senso

a) Lex Rogata (plebeus/ Patrícios)

1º tipo de Lei publica, depois da Lei da XII Tábuas

b) Plebiscito (só plebeus)

c) Leges Datae e Dictae (para Sebastião Cruz não tem o mesmo valor que as duas anteriores)

- Lato Senso

a) Senatusconsultos

b) Constituições Imperiais

III) Iurisprudêntia (= ciência do Direito; Doutrina)

1) A expressão Fontes do Direito foi introduzida no mundo jurídico por Cícero. Tendo-se, desde então, generalizado a sua utilização com a seguinte significação:

- A de órgãos produtores do Direito – Exsistendi

- A de modos de manifestação do Direito – Manifestandi

- A de textos ou documentos escritos, onde se encontra compilado
o Direito – Cognoscendi

As Fontes de Direito do Ius Civile são, em consonância com o que se disse, classificados em 3 grupos:

a) Fontes Exsistendi, isto é, órgãos produtores das normas jurídicas do Ius Civile. Os quais, atendendo às diversas fases da periodização política deste Direito são:

a) o Populus Romanus;

b) o Rei;

c) os Magistrados Ordinários e Extraordinários;

d) o Senado;

e) o Imperador.

Por exemplo:

No que toca à Lex Rogata, que é uma fonte Manifestandi do Ius Civile as suas fontes Exsistendi são os Magistrados Ordinários, que a propõem. O Povo reunido em comícios que a vota favoravelmente, e o Senado que lhe concede aprovação.

Quanto ao Plebiscito também fonte Manifestandi do Ius Civile. As suas fontes Exsistendi são o Magistrado Extraordinário e Tribuno da Plebe que o propõe, e os Consilium plebis que os votam.

Quanto ao Senatusconsultos a sua fonte Exsistendi é o Senado e quanto às constituições imperiais a sua fonte Exsistendi é o Imperador.

As normas jurídicas de natureza consuetudinária do Ius Civile têm como fonte Exsistendi o Populus Romanus e a natureza doutrinária tem essa fonte no Iurisprudêntia que numa fase inicial era exclusivamente os sumos pontífices.

b) Fontes manifestandi são os modos de manifestação ou revelação (modos de produção) deste Direito designadamente Costume, Lex, Iurisprudêntia.

c) Fontes Cognoscendi do Ius Civile são os documentos escritos onde este Direito se encontra e que permite o seu conhecimento.

De entre as várias fontes Cognoscendi do Ius Civile destaca-se o Corpus Iuris Civiles

Fontes Manisfestandi do Ius Civile

I – Costume

O Costume, na ordem do tempo e até certo ponto na da importância, é a primeira fonte Manisfestandi. A sua fonte Exsistendi é o Populus Romanum.

Temos de demonstrar 2 conceitos: O conceito moderno e o conceito Romano.

O conceito moderno corresponde ao consuetudo, no conceito romano o costume é o Mores Maiorum.

Como todos os Direitos primitivos também o Direito Romano começou por ser um Direito consuetudinário, Isto é, cujo o principal modo de formação era o Costume.

A questão que se coloca, era o de saber o que era o Costume para os Romanos nas fontes jurídicas e extra-jurídicas romanas e aparecem 3 palavras para indicar a ideia de Costume:

1 – Usus

2 – Mores Maiorum

3 - Consuetudo

Conceito moderno (Consuetudo) e conceito Romano (Mores Maiorum)

A partir do Sec. IV d.C. e devido ao importante fenómeno e consequente automatização do Direito em relação à moral e à religião. Cria-se em Roma um novo conceito de Costume enquanto fonte de Direito, este que equivale ao actual conceito de Costume existente no Direito da família Romano-germânica.

A esse conceito chamava-se Consuetudo que é uma palavra que surge na terminologia jurídica mais ou menos na época pós – clássica, para traduzir a ideia de Costume como uma observância constante e uniforme de uma regra de conduta pelos membros de uma comunidade (elemento matérial da noção de Costume) devido à convicção da sua obrigatoriedade jurídica (elemento psicológico-juridico da noção de costume)

Em Roma até ao Sec. IV d.C. o Costume, enquanto fonte de Direito, era entendido na acepção de Mores Maiorum (uma condição inveterada que se impunha aos cidadãos como norma e como fonte de normas nas suas relações recíprocas) com o seguinte sentido “tradição de uma comprovada moralidade”. Este é o verdadeiro Costume romano. Assim para os Romanos não existiam bens e maus Costumes, pois o Costume Romano era algo sempre honesto, moral e digno de ser imitado, além disso se os Mores Maiorum são a tradição de uma comprovada moralidade então não pode pensar-se que o Direito Romano enquanto Direito consuetudinário tenha nascido espontaneamente. Isto porque, para os romanos todas as novas regras ainda que impostas por novas necessidades derivam dos antigos princípios. Assim competia aos Juristas descobrir e revelar esses novos princípios contidos nos antigos, sendo esta a função da primitiva ciência do Direito, ou seja da Iurisprudentia.

Na base deste conceito romano do Costume, encontra-se a profunda relação existente, neste período, entre o Direito, a moral e a religião, enquanto dimensões integrantes e reciprocamente inter-relacionadas da prática social. Com efeito compondo estas 3 dimensões.

Continum ininterrupto compreende-se que o mundo do Direito sofresse profundas influências morais e religiosas. Uma dessas influências, dizia respeito ao conceito de costume, sendo que para os Romanos todas as práticas que fossem justas, honestas e moralmente incontestáveis eram dignas de serem imitadas convertendo-se em costumes.

É também dentro deste contexto que o Direito Romano de base consuetudinária do período em questão tivesse uma criação espontânea.

Com efeito neste período os novos princípios ainda que imergentes de novas necessidades eram sempre retirados dos velhos princípios.

A esta actividade, que consistia em extraírem princípios de comprovada moralidade de novas normas orientadoras da prática social, chamava-se Interpretatio e o Direito que assim era criado chamava-se Ius Non Scriptum ou Direito não escrito.

Mores Maiorum e Ius non scriptum

A primitiva Interpretatio ou Iurisprudêntia - Como já se referiu a primitiva ciência do Direito devia revelar e descobrir os novos princípios contidos nos antigos princípios, ou seja, devia descobrir os Ius Continum no Mores Maiorum. Ora como nesta época o Direito, a moral e a religião constituíam um todo, a função da Interpretatio cabia apenas aos sacerdotes pontífices, sendo que estes se dedicavam exclusivamente à referida Interpretatio, pelo que esta se identificava com a Iurisprudêntia.

Fase do Costume enquanto Mores Maiorum como fonte do Ius Romanum

1ª Etapa – Época arcaica (753 – 242 a.C.)

Nesta época temos de distinguir 2 períodos:

a) Antes da Lei da XII Tábuas – Os Mores Maiorum eram a única fonte do Ius Romanum,

b) Após a lei da XII Tábua – Os Mores Maiorum ainda continuam como fonte importante do Ius Romanum, sobretudo no que diz respeito a matérias de Direito público. Quanto a Direito privado, agora a fonte principal é a Lei das XII Tábuas, que tal como sucedia com os Mores Maiorum também era necessário descobrir tudo o que nela continha. Por essa razão a Interpretatio volta-se quase exclusivamente para a Lei da XII Tábua e só muito raramente para os Mores Maiorum.

2ª Etapa – Ainda na Época arcaica (242 - 130 a.C.)

Nesta época o Costume só tem importância no Direito público.

3ª Etapa – Época Clássica (130 a.C.- 230 d.C)

Nesta época, os Mores Maiorum quase desaparecem por completo como fonte autónoma do Ius Romanum.

4ª Etapa – Época Pós-clássica (130 d.C. – 530 d.c.)

O Direito Romano sempre defendeu que a Lei (Lex) é uma das várias fontes de Direito, mas não a única e nem sequer a mais importante.

Surge o consuetudo (Costume) como fonte de Direito e desempenhando a função de correctivo da Lei, que nesta época era só a vontade do Imperador que se manifestava nas Constituições Imperiais.

II – A Lei (Lex)

A lei enquanto fonte Manifestandi do Ius Civile, assumia duas acepções distintas consoante se fundasse numa declaração solene baseada num compromisso entre os sujeitos ou num compromisso entre o órgão que elaborava a lei (a sua fonte Exsistendi) e a própria comunidade (Sponsio). À primeira chamava-se Lex privata e ela consistia na base dos diversos negócios jurídicos celebrados em Roma porquanto vigorava o princípio de que aquilo que os sujeitos diziam, valeria como Lei. A segunda chamava-se Lex pública, sendo que nos inícios o principal género de Lex pública do Direito romano era a Lei comicial, isto é, a lei votada pelo povo reunido em comícios.

Importante: É na votação da proposta de lei, elaborada por um Magistrado Ordinário ou Extraordinário no exercício do respectivo poder de potestas, que se traduzia o poder legislativo do Populus Romanus. Sendo por este exercício essencialmente durante a fase da república e que lhe foi retirado por Octávio César Augusto durante a fase do Principado. Dentro das leis comiciais existiam dois géneros, a chamada Lex Rogata e o Plebiscito que entre si tinham as seguintes similitudes (semelhanças):

a) Provinham ambas de propostas elaboradas por Magistrados.

b) A sua votação era rogada, isto é, pedida de forma solene por estes mesmos Magistrados, ao povo reunido em comícios. A este pedido solene de votação chamava-se rogatio (pedido), porém entre a Lex Rogata e o Plebiscito, existiam também grandes diferenças, nomeadamente, o facto de a Lex Rogata ter sempre como Magistrado proponente, um Magistrado Ordinário que ao elaborar a proposta de Lei exercia o seu poder de potestas, ou seja de representação do Populus Romanus, enquanto que o Plebiscito era exclusivamente da iniciativa do Magistrado Extraordinário - Tribuno da Plebe.

c) A Lex Rogata era votada pelo povo reunido ora nos Comitia Centuriata (se a sua proposta fosse da autoria do censor, cônsul ou Pretor) ou nos comitia tributa (se a sua proposta proviesse do Edil Curul ou Questor). Já o Plebiscito só podia ser votado pelo Populus Romanus nos Concilia Plebis o que significava que enquanto a Lex Rogata era votada quer por Plebeus quer por Patrícios, os Plebiscitos só eram por Plebeus.

d) Por último a Lex Rogata envolvia no seu processo de formação três órgãos, o Magistrado Ordinário que a propunha, o povo reunido em comícios que a votava e o Senado que lhe conferia aprovação. Já o Plebiscito envolvia apenas dois órgãos sendo que aquele que o produzia, o Magistrado Extraordinário - tribuno da plebe, e aquele que a votava os Plebeus reunidos nos Concilia Plebis.

e) Para finalizar, enquanto que a Lex Rogata observa os requisitos subjacentes às várias fases do seu processo de formação, se convertia numa Lei com carácter vinculativo para todo o Populus Romanus, já o Plebiscito, inicialmente, apenas tinha carácter vinculativo para os Plebeus pelo que em bom rigor não podia considerar-se uma autêntica Lei do Ius Civile.

Análise da 2ª fonte do Ius manifestandi – A Lex

1 - No Direito Romano a Lei entendia-se em duas acepções distintas, a Lex privata e a Lex pública.

2 – O nosso objectivo de estudo será a Lex pública.

3 – A Lex pública em sentido estrito comportava as seguintes espécies:

a) Lex Rogata

b) Plebiscito

c) Leges Datae e Dictae

4 – Análise detalhada da primeira Lex pública e comicial do Direito Romano, a Lei das XII tábuas.

4.1 – O seu valor, a sua divisão interna e o seu conteúdo.

4.2 - Consideração detalhada tábua III da lei das XII tábuas, que versava sobre as consequências decorrentes do incumprimento voluntário da obrigação jurídica de pagar, que da válida celebração de uma Stipulatio (de um negócio jurídico que consistia num empréstimo em dinheiro) nascia para o sujeito responsável pela dívida.

1 - No Direito Romano a Lei entendia-se em duas acepções distintas, a Lex privata e a Lex pública.

Em Roma, nos inícios, a Lei enquanto fonte manifestandi do Direito Romano, era entendida no sentido de Lex privata e de Lex pública. A Lex privata era a declaração solene de valor normativo que tinha por base um negócio jurídico privado, na medida em que, de acordo com um princípio consagrado no Direito Romano, quando alguém celebrava um negócio jurídico, aquilo que ficava dito por palavras, valeria como Direito, já a Lex pública era a declaração solene com valor normativo, que tinha na sua base um compromisso entre o Magistrado que a propunha e a comunidade social que reunida em comícios a votava. É da circunstância de ser votada pelo povo reunido em comícios que resulta a sua natureza de Lei pública.

2 – O nosso objectivo de estudo será a Lex pública.

O nosso objecto de estudo será a Lei pública do Direito Romano, por análise das várias espécies que esta Lei conheceu, quer quando entendida como Lei em sentido eStricto, quer como Lei em sentido amplo.

3 – Em sentido estrito a lei pública subdividia-se nas seguintes espécies:

a) Lex Rogata

Terá sido a espécie mais usual de Lei pública do Direito Romano e traduzia uma deliberação solene com valor normativo, proposta por um Magistrado Ordinário no exercício do seu poder de Potestas, votada após a respectiva votação pelo povo reunido nos comícios das centúrias e depois aprovado pelo Senado mediante a concessão da Auctoritas Patrum. Tratava-se pois, de uma Lei pública e comicial que tinha como fontes Exsistendi um Magistrado Ordinário, o Populus Romanum e o Senado. Denominava-se de Lex Rogata porque para se converter em autêntica Lei, necessitava ser favoravelmente votada pelo povo, reunido em comícios, e essa votação era desencadeada por um pedido, um verdadeiro rogo, que ao comício popular era dirigido pelo Magistrado proponente. O processo de formação de uma Lex Rogata exigia a observância das seguintes fases:

1ª - Promulgatio – era a fase da afixação da proposta de Lei durante três semanas num lugar público para que o povo a lesse e tomasse conhecimento do seu conteúdo. A partir do momento em que a Lei era afixada (promulgada), a sua proposta tornava-se inalterável, sendo portanto insusceptível de qualquer alteração.

2ª - Conciones – Decorridas as referidas três semanas, podiam convocar-se reuniões sem carácter oficial nem jurídico, normalmente por iniciativa do Magistrado proponente e com a finalidade de discutir o conteúdo da proposta da norma. A estas reuniões chamavam-se Conciones, porque para que alguém nelas falasse era necessário que o Magistrado, que a elas presidia, concedesse a palavra. Os discursos favoráveis ao conteúdo da norma chamavam-se suasiones e os desfavoráveis dissuasiones.

3ª - Rogatio – Celebradas ou não as conciones, o Magistrado proponente, findo o prazo da promulgatio, rogava ao povo reunido nos comícios das centúrias, a votação da proposta da norma, através da seguinte pergunta: “Quereis e ordenais cidadãos?”. A fase da rogatio era verdadeiramente essencial à validade do processo de formação da Lex Rogata, porque permitia ao povo, reunido nos comícios, o exercício do seu poder legislativo que se traduzia na faculdade de poder votar favoravelmente, desfavoravelmente, ou abster-se de votar a proposta de lei.

4ª – Votação - Caso o Povo reunido nos comícios das Centúrias votasse favoravelmente a proposta de Lei, tal como lhe tinha sido rogado pelo Magistrado Ordinário proponente, esta proposta convertia-se numa autêntica Lei que, no entanto, para entrar em vigor necessitava ainda a aprovação do Senado.

Inicialmente a votação era oral tornando-se depois escrita e secreta por força da Lex Papiria Tabellania

5ª – Aprovação pelo Senado - Depois de votada favoravelmente pelo Povo a Lei era levada ao Senado para aprovação mediante a concepção da Auctoritas Patrum.

Tornando-se então perfeita e apta para entrar em vigor o processo de formação da Lex Rogata.

Afixação – O processo de formação da Lex Rogata conclui-se com a afixação da Lei no Fórum público, para meros efeitos de publicidade (conhecimento) da mesma.

Era assim que nascia uma Lei.

b) Plebiscito

Foi outra das espécies de Lex Pública e comicial do Direito Romano.

Com efeito, tal como a Lex Rogata era uma deliberação solene com valor normativo que resultava de um compromisso entre o Magistrado que a propunha e o Povo reunido em comícios que a votava.

Tal também como a Lex Rogata, o Plebiscito via a sua votação ser rogada pelo Magistrado proponente ao Povo.

Diferentemente da Lex Rogata, o Plebiscito era exclusivamente elaborado por um Magistrado Extraordinário, o Tribuno da Plebe, votado pelo Povo reunido nos Concilia Plebis e nunca sujeito à aprovação pelo Senado, o que significa que apenas possuía duas fontes Exsistendi - O Tribuno da Plebe e os Concilia Plebis.

Também diversamente do que sucedia com a Lex Rogata, que após a aprovação pelo Senado entrava em vigor com um carácter geral vinculando quer Patrícios, quer Plebeus. O Plebiscito até ao ano de 287 a.C. apenas vinculava os Plebeus, pelo que não possuía até ao referido ano a mesma dignidade normativa da Lex Rogata.

c) Leges Dictae e Datae

Até ao ano 242 a.C. em Roma prevaleciam as Leges Datae sendo que segundo o Dr. Sebastião Cruz, do Sec. V ao Sec. III a.C. o Direito Romano apenas conheceu como leis públicas e comiciais a Lex Rogata e o Plebiscito.

Após o Sec.III a.C. que sabe-se terem existido dois outros géneros de Leis públicas e comiciais do Direito Romano - As Leges Datae e Dictae

As primeiras terão sido Leis proferidas por um Magistrado no exercício de um poder especial que o Povo nele delegou e as segundas proferidas por um Magistrado no exercício de poderes que lhe eram próprios.

Com a instituição do Principado, enquanto forma de organização política de Roma e dentro da estratégia levada a cabo pelo Imperador Octávio César Augusto com vista à centralização de todos os poderes na sua pessoa, os poderes legislativos são retirados aos comícios populares para serem atribuídos ao Senado, o que conduz ao desaparecimento daqueles por inactividade e em consequência ao igual desaparecimento das Leis que nestes comícios eram produzidas – Lex Rogata e Plebiscito.

A partir do Sec. I d.C. surge um outro tipo de Leis do Direito Romano produzidas pelo Senado e a partir do Sec. IV vive-se em Roma o verdadeiro império das leis produzidas pelo Imperador que se convertem na única fonte manifestandi do Ius Civile.

4 – Análise da Lei das XII Tábuas

Para o Dr. Sebastião Cruz a Lei das XII Tábuas terá sido a primeira Lei pública e comicial do Direito Romano.

Se bem que existam na Doutrina certos autores que discordam do Dr. Sebastião Cruz considerando que as primeiras Leis Públicas e comiciais do Direito Romano terão sido as chamadas Leges Regiare e o Ius Papiriano que consistiam numa colectânea de leis produzidas no Sec. VII a VI a.C. votadas favoravelmente em comícios populares sob proposta de Rei e mais tarde compiladas pelo Sumo Pontífice Papirios.

O Dr. Sebastião Cruz considera, no entanto, que estas Leges Legiae terão sido na verdade meros preceitos consuetudinários.

A Lei das XII Tábuas é assim para este autor entendida como a verdadeira primeira Lei pública e comicial do Direito Romano.

Trata-se de uma Lei elaborada por volta do ano 450 a.C. por um organismo especialmente eleito para este efeito, sendo depois votada pelo Povo reunido nos comícios da Centúria e afixada no Fórum público e publicada em 12 Tábuas de madeira.

Pensa-se ter nascido de uma das várias rebeliões sociais desencadeadas pelos Plebeus na sua constante luta por um regime de igualdade de Direitos com os Patrícios.

4.1 – O seu valor, a sua divisão interna e o seu conteúdo.

Quanto à sua divisão interna é uma Lei composta por 12 partes equivalentes às 12 tábuas em que foi publicada e cada uma dessas partes subdividia-se em várias Vis ou fragmentos.

Da 1ª à 3ª regulamentam-se matérias de Processo Civil, da 4ª à 5ª o Direito da Família e sucessões. Na versava-se sobre os negócios jurídicos, da 7ª à 12ª sobre o Direito Penal.

Na sua Tábua III regulamentavam-se as consequências resultante do não cumprimento voluntário (isto é, não imputável a um qualquer factor externo à própria vontade do sujeito como ocorrerá num caso de estado de necessidade ou de perda de todos os bens devido a uma catástrofe natural) da obrigação jurídica de pagar por parte do sujeito responsável pela dívida.

Por sujeito responsável pela divida deve entender-se quer o sujeito que a contrai, isto é, o devedor, quer o sujeito que perante o credor se responsabiliza pelo pagamento da divida contraída pelo devedor, isto é, o fiador.

4.2 - Consideração detalhada tábua III da lei das XII tábuas, que versava sobre as consequências decorrentes do incumprimento voluntário da obrigação jurídica de pagar, que da válida celebração de uma Stipulatio (de um negócio jurídico que consistia num empréstimo em dinheiro) nascia para o sujeito responsável pela dívida.

A obrigação jurídica de pagar é o correspectivo do Direito de exigir o pagamento, sendo que, quer essa obrigação, quer este Direito, são os efeitos que se produzem na esfera jurídica dos sujeitos envolvidos na válida celebração de um negócio jurídico que consiste num empréstimo em dinheiro e que no Direito Romano chamava-se Stipulátio.

Segundo o disposto na 1ª Lei da Tábua III, sempre que o responsável pela divida não cumpri-se voluntariamente com a sua obrigação jurídica de pagar, o credor levava-o a tribunal, dando-se inicio à chamada acção declarativa. Esta tinha por finalidade, declarar a existência da divida e, em consequência, do Direito do sujeito credor e a obrigação do sujeito responsável pela divida.

Introduzido o pedido em tribunal iniciava-se o processo jurisdicional, que deve entender-se como conjunto organizado de actos que se desenvolvem desde o momento em que o pedido é introduzido em tribunal até ao momento em que ele é resolvido através da emanação da Sentença.

O processo jurisdicional romano admitia duas fases:

1) Fase In Iure, era presidida pelo Pretor e nela se desenvolviam as principais actividades que sustentavam a resolução do litígio, designadamente a análise da natureza jurídica do pedido e a recolha e produção da prova.

2) Apud Iudicem, era presidida por um particular – o Iudex, ao qual cabia emanar a sentença.

Durante a Acção declarativa podiam ocorrer uma das seguintes duas situações:

a) O responsável pela divida confessava-a, obtendo-se assim um confessio In Iure, logo na primeira fase do processo jurisdicional e não se transitando portanto para a fase Apud Iudicem.

b) Não existindo qualquer confissão após a produção da prova na fase Apud Iudicem, o Iudex emanava uma sentença condenado o responsável pela dívida obtendo-se assim, uma Iudicatio.

Muito importante

Quer o confessio In Iure, quer a Iudicatio assumem a natureza de verdadeiros títulos executivos permitindo ao Pretor, em caso da insistência no incumprimento por parte do responsável pela dívida abrir acção executiva sem a necessidade de voltar a proceder à recolha e analise de qualquer prova.

De acordo com a 2ª Lei da Tábua III, após o confessio In Iure ou a emanação da Iudicatio é concedido ao responsável pela divida um período de 30 dias para que este pague. Este período de 30 dias era entendido como um verdadeiro período de tréguas, desde logo, porque se proibia toda e qualquer espécie de vingança privada. Findo este período e não ocorrendo o pagamento, o credor podia agarrar na pessoa do responsável pela divida levando-o de novo ao tribunal para se dar inicio à fase executiva.

A 3ª Lei da Tábua III dispunha que uma vez em tribunal, o responsável pela divida visse a sua pessoa ser adjudicada à pessoa do credor por força da Manius iniectio que o Pretor proferia.

Esta Manius iniectio permitia, portanto, o apoderamento físico da pessoa do responsável pela dívida, pelo credor, que o levava para sua casa onde o mantinha em cárcere privado.

A 4ª Lei da Tábua III referia a situação de quase escravidão em que o responsável da dívida se passava a encontrar e em consequência a limitação do núcleo essencial dos seus direitos de personalidade.

Contudo também se referia nesta Lei que uma vez que o responsável da divida ainda conservava a sua condição de Sui Iuris, ele mantinha a capacidade de gozo e de exercício de Direito sobre o seu património. O que lhe será essencial para o eventual exercício da primeira forma do Direito de pactar, tal como consagrado na 5ª Lei da Tábua III.

De acordo com esta 5ª Lei, o responsável pela dívida, de forma a evitar a fase final da acção executiva, que traduzia a perda da sua condição de Sui Iuris e a consequente conversão em escravo, podia exercer com o sujeito credor o Direito de pactar mediante uma das seguintes formas:

a) Decidia, e comunicava tal decisão ao credor, pagar o montante da dívida, assim se auto-libertando (a partir da Lex Vallia – 160 a.C.);

b) Era resgatado por alguém;

c) Decidia entregar-se ao credor como seu serviçal e criado para qualquer tipo de função até que a dívida se considerasse paga, momento em que se libertaria.

Se contudo, não fosse exercido este Direito de pactar, o responsável pela dívida manter-se-ia preso durante mais 60 dias – período no qual seria levado a 3 feiras públicas consecutivas, onde o valor da sua divida era anunciado pelo Pretor na expectativa que algum familiar ou amigo paga-se resgatando, assim, o sujeito.

Se nada do que se acaba de descrever acontecesse, chegava-se à fase final da execução da dívida, que de acordo com a 6ª Lei da Tábua III, se traduzia na conversão do sujeito em escravo e, em consequência, na sua transferência para o domínio do Direito de propriedade do credor que, enquanto proprietário, podia fazer do escravo o que bem entende-se, isto é, podia usa-lo, vende-lo ou mata-lo e esquarteja-lo para efeitos de prevenção geral face aos demais sujeitos da sociedade Romana.

Acção declarativa

a) Confessio In Iure, na fase In-Iure (Pretor)

ou

b) Iudicatio na fase Apud-Iudicem (particular – Iudex)

Acção executiva

a) Manius Iniectio

b) Direito de Pactar ó

ó Acto de se nexundare

c) 3ª Feiras Públicas

d) Perda da condição de Sui Iuris e conversão em escravo

e) Transferência para a propriedade do credor enquanto um verdadeiro “Res

Continuação da análise da Lei enquanto Fonte Manifestandi do Ius Civile

A Lei em sentido amplo

Os Senatusconsultos

1) Noção de Senatusconsultos e a sua importância enquanto fonte Manifestandi do Ius Civile

Desde a criação de Roma como cidade – 753 a.C. as estruturas políticas romanas contavam com o Senado como um dos órgão titular do poder de soberania. No entanto, até à fase do Principado, o Senado não dispunha de poder legislativo. Pelo que os Senatusconsultos, até à referida fase, tinham a acepção de respostas dadas pelo Senado ás consultas que lhes eram feitas sobre determinadas questões ou matérias, ou seja, tinham carácter consultivo. Se bem que na transição da fase da monarquia para a da república os Senatusconsultos na prática deixassem de consistir em conselhos para se converterem em ordens.

Só no Principado (a partir do Sec. I a.C.) ganham carácter normativo transformando-se em verdadeiras leis do Ius Civile, ou seja, fonte mediata de Direito.

Tal ocorre dentro da estratégia desenvolvida pelo Imperador Octávio César Augusto visando centralizar na sua pessoa todos os poderes, decidiu tirar o poder legislativo aos comícios populares, que acabam assim por desaparecer devido à sua inactividade e concede esse poder ao Senado que sendo uma assembleia de natureza aristocrata oferecia uma oposição às intenções do Imperador.

A partir do Sec. I a.C. a acepção de Senatusconsultos é pois a de leis produzidas pelo Senado.

À medida que as estruturas próprias do Senado se vão consolidando na organização política de Roma e que o Imperador vai aumentando os seus poderes os Senatusconsultos passam também a ser manifestações da vontade do Imperador, posto que este sempre que pretendia ver uma determinada matéria convertida em Lei reunia o Senado, expunha oralmente as suas intenções e as leis eram por este órgão aprovadas quase sem prévia discussão.

Inicia-se a decadência aos Senatusconsultos enquanto fonte manifestandi do Ius Civile e estes passam a ser chamados de Orationes Princeps.

A partir do Sec. IV d.C. o Direito Romano é exclusivamente produzido pelo Imperador através das suas Constituições Imperiais, desaparecendo então qualquer tipo de Lei em consequência os Senatusconsultos.

2 - Análise detalhada do Senatusconsultum Velleianum

Senatusconsultum Velleianum

Aplicava-se

v

= Motivação para a celebração do negócio jurídico

Aos negócios jurídicos da Intercessio (intervenção favorável a favor de outrem)
= Tipo de negócio jurídico celebrado por cidadãs romanas devido às falsas promessas de casamento feitas pelo sujeito devedor

Não se aplicava

v A qualquer outro regime jurídico, mesmo que celebrado pela cidadã romana devido ao aliciamento feito através das falsas promessas de casamento.

v Á Intercessio celebrada de má-fé por parte da cidadã romana, pois o Senatusconsultos Velleianum protegia as mulheres enganadas mas não as enganadoras.

v À Intercessio celebrada para a prossecução de um interesse patrimonial próprio por parte da cidadã romana.

2.1 – Trata-se de uma lei produzida pelo Senado por volta do ano 56 d.C. e que deve o seu nome ao facto de ter sido proposta pelo Cônsul Velleus.

2.2 – Na base da produção desta Lei pelo Senado, encontrava-se a intenção de proteger as cidadãs Romanas que tivessem sido levadas a responsabilizar-se por divida ou dividas contraídas por um cidadão romano em virtude de falsas promessas de casamento que este lhes tivesse feito.

Proibiu a todas as mulheres, a pratica de actos de Intercessio a favor de qualquer homem, ou seja, proibiu que elas se responsabilizassem, e de qualquer forma, pelas dívidas contraídas por um homem.

O Senado invocou, portanto, para justificar esta Lei, razões que se prendiam com a fragilidade própria do sexo feminino e com princípios da sociedade romana que designadamente não consideravam ser conveniente que as mulheres desempenhassem cargos viris.

O objectivo desta Lei foi:

- Proibindo a celebração do negócio jurídico da Intercessio às cidadãs romanas impedir as frequentes situações de ruína patrimonial e pessoal, em que estas acabavam por cair, visto que normalmente não obtinham do sujeito devedor a realização das promessas por ele feitas e quase sempre no momento em que o credor demandava alguém para o pagamento da divida optava pela cidadã intercedente visto esta dispor de uma maior capacidade patrimonial.

2.3 – Âmbito de aplicação desta Lei

Como toda a norma jurídica também este Senatusconsultos possuía um específico âmbito de aplicação.

Só regulamentava as situações concretas em que:

a) O negócio jurídico celebrado pela cidadã romana fosse uma Intercessio, ou seja intervenção favorável a favor de outrem.

b) A motivação que esteve na base da celebração desse negócio jurídico tivesse sido o aliciamento sofrido pela referida cidadã através de falsas promessas de casamento que lhe haviam sido feitas pelo sujeito devedor.

Note-se que os dois referidos requisitos são cumulativos pelo que este Senatusconsultos não se aplicava sempre que:

a) Aos negócios jurídicos celebrados pela cidadã romana fossem um outro que não a Intercessio e mesmo que tivessem existido as falsas promessas de casamento feitas pelo sujeito devedor (assim, por exemplo, se a cidadã romana convencida que se casaria com o sujeito devedor decidisse doar-lhe um determinado bem ou quantia em dinheiro que o sujeito depois utilizaria para o pagamento da divida ainda que nesta hipótese a motivação e o fim que levava a cidadã romana à celebração do negócio jurídico tivessem sido os mesmos que se exigem para a aplicação deste Senatusconsultos não aplicará tal lei porque o negócio jurídico celebrado não foi uma Intercessio);

b) Aos negócios jurídicos de Intercessio celebrados pela cidadã romana de má-fé porque nesta hipótese a motivação que conduz à celebração do negócio jurídico reside num intuito deliberado e consciente de prejudicar o sujeito credor e como o Direito nunca protege a má-fé não pode permitir-se a aplicação deste Senatusconsultos a este tipo de Intercessio.

c) Aos negócios jurídicos Intercessio celebrados pela cidadã romana com vista à prossecução (prosseguimento) de um interesse próprio (tal acontecerá, por exemplo, se for ela própria também devedora do sujeito credor em causa e se ao realizar a Intercessio a favor do cidadão devedor, ela obtiver do sujeito credor, por exemplo, a dilatação do prazo para o pagamento da sua própria divida).

3) Noção de espécies de Intercessio

A Intercessio era o negócio jurídico pelo qual alguém (neste caso a cidadã romana) intercedia a favor de outrem responsabilizando-se pelas dívidas que esse outro havia contraído.

A consequência jurídica da válida celebração da Intercessio é tornar a cidadã intercedente em sujeito responsável pelo pagamento da dívida, sendo assim, findo o prazo estabelecido o credor podia demandar a intercedente para o cumprimento da obrigação jurídica de pagar.

A Intercessio podia realizar-se através de uma das seguintes três espécies:

a) Intercessio cumulativa - o que ocorria sempre que a cidadã intercedente se responsabilizava perante o credor pela dívida conjuntamente com o sujeito devedor. Sendo assim, passavam a ser dois os sujeitos responsáveis pela dívida e o credor podia demandar um ou outro desses sujeitos.

b) Intercessio privativa - ocorria sempre que a cidadã intercedente se obrigava perante o credor no lugar do devedor cuja obrigação se extinguia. Sendo assim, só a cidadã intercedente era demandada para o cumprimento da dívida.

c) Intercessio tacita - ocorria sempre que a cidadã intercedente se obrigava perante o credor ab initio, isto é, desde o inicio, para que o sujeito devedor nem sequer aparecesse. Sendo assim, na prática só ela era demandada para o cumprimento da dívida.

Nota importante

A Intercessio no Direito Romano surge-nos com uma determinada acepção quando pensado no contexto do Direito Privado, e uma outra quando pensada no contexto do Direito Público.

No Direito privado a Intercessio é um negócio jurídico pelo qual alguém se responsabiliza pelas dívidas de outrem.

No Direito público é o poder que assistia ao Magistrado extraordinário – Tribuno da Plebe, de vetar ou anular decisões tomadas por um qualquer Magistrado Ordinário sem que entre eles existisse uma relação de hierarquia (chamava-se a este poder Ius Intercessionis)

4) Consequências da aplicação do Senatusconsultos Velleianum

Reunidos os requisitos cumulativos necessários para a aplicação desta Lei, essa Lei conduzia ao seguinte:

- O negócio jurídico da Intercessio que a cidadã romana tivesse celebrado por ter sido a tal conduzida, mediante falsas promessas de casamento que o sujeito devedor lhe havia feito não era considerado inválido face aos Ius Civile mas sobre ela impendia a sanção da ineficácia.

Sendo ineficaz esse negócio jurídico não produzia os seus efeitos típicos, o que significava que quando demanda pelo credor para pagar a cidadã intercedente podia recusar-se a faze-lo e sustentava esta sua recusa na protecção que lhe era conferida por este Senatusconsultos invocando a seu favor um exceptio Senatusconsultos velleianum (a exceptio era uma das clausulas que integravam a formula processual que durante o processo jurisdicional finda a fase In Iure ou então, o Pretor podia, desde logo, inutilizar o pedido do credor ao demandar a mulher intercessora, mediante a denegatio actiones. O Pretor regia e entregava ao Iudex para que este emanasse a sentença.

Esta cláusula continha alguma ou algumas circunstâncias que funcionavam como atenuantes do comportamento do sujeito demandado.

No caso concreto a exceptio invocava a existência do Senatusconsultos velleianum que visando proteger a cidadã intercedente introduzia uma excepção à regra segundo a qual todo aquele que se responsabiliza pela divida de outro, pode ser pelo credor, nas mesmas condições esse outro demandado para o pagamento dessa dívida.

Caso a cidadã romana tivesse pago, ignorando estar assistida pela protecção deste Senatusconsultos, podia reclamar o que pagou, pois entendia-se que a mulher intercedente não ficava efectivamente obrigada, nem sequer contraia uma obrigação natural.

Senatusconsultum Macedonianum (75 d.C.)

Requisitos cumulativos:

a) Stipulatio (Tipo de negocio jurídico)

b) FiliusFamilia »»» Sujeito devedor

c) Divida contraída para a prática de actos de imoralidade

FiliusFamilia: - Com PatérFamilia vivo

- Não pode ser emancipado

Analise do Senatusconsultum Macedonianum

1 – Ano de entrada em vigor e razão de sua denominação.

2 – Razão de ser e noção de FiliusFamilia.

3 – Âmbito de aplicação

4 – Consequências da aplicação desta lei

5 – Formas de reacção do FiliusFamilia quando demandado para pagar.

6 – Pessoas a quem a protecção deste Senatusconsultos era concedida.

1 – Ano de entrada em vigor e razão de sua denominação.

Trata-se de uma lei produzida pelo Senado para entrar em vigor em 75 d.C. Teve na base da sua formação a seguinte ocorrência, da qual derivou a sua denominação:

O FiliusFamilia Macedónio, devido ao endividamento em que se colocou por ter celebrado vários empréstimos em dinheiro, com vista à prática de actos de imoralidade, acabou por matar o PaterFamilia, com vista a tornar-se ele próprio PaterFamilia, e a poder, assim, dispor livremente dos seus bens e pagar as suas dívidas.

2 – Razão de ser e noção de FiliusFamilia.

A razão de ser desta lei prende-se directamente com a estrutura típica da sociedade romana. Com efeito, esta sociedade encontrava-se organizada de modo a colocar o PaterFamilia como elemento nuclear, atribuindo-lhe a titularidade de todos os Direitos relativos, quer aos elementos do grupo familiar, quer aos bens que integravam o património da família.

Sendo assim, qualquer acto de disposição ou de administração desses bens necessitava, para ser juridicamente eficaz, de um prévio consentimento ou de uma ratificação à posteriori, por parte do PaterFamilia.

Compreende-se pois, que os negócios jurídicos celebrados pelos elementos restantes elementos da família só fossem juridicamente eficazes quando o PaterFamilia interviesse, consentindo-os ou ratificando-os.

Do que acaba de dizer-se, resulta que, no Direito Romano, a incapacidade de exercício de Direitos, resultasse, para além das situações de menoridade ou quaisquer outras, justificativas da interdição ou inabilitação do sujeito, também da circunstancia do PaterFamilia estar vivo e de não ter havido a emancipação desse sujeito.

A noção de FiliusFamilia prende-se, portanto, com as condições que se acabaram de referir, pelo que é FiliusFamilia, todo o cidadão romano que tenha o seu Pater vivo, e não se encontre emancipado, e isto independentemente da idade, do cargo profissional, e dos bens que eventualmente tenha herdado, lhe tenham sido doados, ou que ele tenha adquirido em virtude do rendimento do seu trabalho.

Nota: A emancipação é uma figura jurídica constituída para limitar os efeitos das incapacidades dos sujeitos, porque permite que o incapaz, quando emancipado, se torne titular de uma mais ou menos ampla capacidade de exercício de Direitos.

No Direito Português a emancipação existe para conceder ao menor de 16 anos de idade a referida capacidade, e opera-se nos termos do disposto no Código Civil por força do casamento. No Direito Romano a emancipação permitia ao FiliusFamilia que ainda tivesse o seu Pater vivo uma maior capacidade de exercício de Direitos.

A noção de FiliusFamilia não deve confundir-se com a menoridade. Esta ultima é relativa a todo o cidadão romano que não tenha feito 24 ou 25 anos, enquanto FiliusFamilia é todo aquele que tem o Pater vivo e que não está emancipado, independentemente da idade.

3 – Âmbito de aplicação

O Senatusconsultos Macedonianum aplicava-se exclusivamente ao seguinte tipo de situação concreta:

a) Aos negócios jurídicos que consistiam em empréstimos em dinheiro (Stipulatio)

b) Em que o sujeito devedor era um FiliusFamilia

c) Sendo que a divida contraída visava permitir ao FiliusFamilia a prática de actos de imoralidade.

Sendo assim, esta lei não se aplicava:

a) A qualquer outro negócio jurídico celebrado pelo FiliusFamilia, e ainda que a finalidade também fosse obter dinheiro para a pratica de actos de imoralidade.

b) À Stipulatio que o FiliusFamilia celebrasse, usando para tal de má-fé, conseguindo, p. ex., convencer o credor de que já era um PaterFamilia.

c) A toda a Stipulatio que o FiliusFamilia celebrasse com vista à prossecução de outros fins que não a pratica de actos de imoralidade.

4 – Consequências da aplicação desta lei

Verificando-se cumulativamente os 3 requisitos necessários para aplicação desta lei, a consequência que se produzia era a seguinte:

A Stipulatio não fazia nascer para o sujeito devedor, o FiliusFamilia, a obrigação jurídica de pagar, mas tão só uma obrigação natural. A obrigação natural distingue-se da jurídica por não ser judicialmente exigível, visto fundamentar-se num mero dever social, pelo que o sujeito a cumpre ou não, consoante assim o entender (a noção de obrigação natural que hoje encontramos consagrado no Artº 402º do C. Civil reporta-se ao entendimento desta obrigação no Direito Romano).

5 – Formas de reacção do FiliusFamilia quando demandado para pagar.

Quando demandado para pagar pelo credor, o FiliusFamilia, por estar protegido por esta lei, podia recusar-se a tal pagamento invocando uma Exceptio senatusconsulti Macedoniani.

Com efeito, tal como sucede com o Senatusconsultos Velleianum, também neste caso o sujeito protegido, que é o FiliusFamilia, pode invocar a seu favor uma excepção à regra geral. Aqui, o Pretor podia, logo desde o início, não conceder a actio ao credor (denegatio actiones) ou se concedesse a actio, poderia mais tarde conceder-lhe uma exceptio que inutilizava a pretensão do demandante (credor)

No domínio do Senatusconsultos Velleianum a regra era a seguinte:

- todo aquele que celebrasse uma Intercessio tornava-se responsável pelo pagamento da divida,

e a excepção era:

- que sempre que a Intercessio fosse celebrada por uma cidadã romana, porque aliciada por falsas promessas de casamento por parte do cidadão devedor, essa cidadã não era considerada responsável pelo pagamento da divida.

No domínio do Senatusconsultos Macedonianum a regra é:

- Todo aquele que celebra um negócio jurídico de Stipulatio na qualidade de sujeito devedor, passa a ter a obrigação jurídica de pagar.

A excepção à regra é:

- Sempre que o sujeito devedor for um FiliusFamilia, e o empréstimo tiver sido contraído para a prática de actos de imoralidade, o sujeito devedor não tem uma obrigação jurídica de pagar, mas tão somente uma obrigação natural.

Note-se que, ao contrario do que sucede no domínio do Senatusconsultos Velleianum, a protecção dada ao FiliusFamilia é menor, porque, enquanto naquele, a cidadã intercedente, se pagar pode repetir, já o FiliusFamilia se cumprir espontaneamente com a sua obrigação natural de pagar, não pode depois repetir (esta proibição também se encontra actualmente consagrada no nosso Direito no Artº 403º do C. Civil).

6 – Pessoas a quem a protecção deste Senatusconsultos era concedida.

Por força da sucessão, a posição contratual do sujeito que, falecendo, é o autor dessa sucessão, transmite-se aos respectivos herdeiros. Esta regra, que se aplica também ao negócio jurídico de Stipulatio, e que traduz uma transmissão da dívida e da respectiva obrigação jurídica de pagar, do autor da sucessão para os respectivos herdeiros, não se aplica no âmbito destas dívidas contraídas por um FiliusFamilia para a prática de actos de imoralidade, pelo que a protecção concedida por esta lei aos FiliusFamilias se estende aos respectivos herdeiros.

Por outro lado, o FiliusFamilia, caso se tenha entretanto tornado PaterFamilia, ou caso tenha sido emancipado, continuará a não ter a obrigação jurídica de pagar a divida, excepto se a ratificar.

Por último, a protecção dada por esta lei ao FiliusFamilia também se estende ao respectivo Pater.

Constituições Imperiais

I) Edicta

II) Rescripta

a) Epistolas

b) Subscriptio

III) Mandata

IV) Decreta

As Constituições Imperiais como fontes Manifestandi do Ius Civile

1 – Noção

2 – Evolução do seu valor jurídico

3 – Tipos de Constituições Imperiais, do Sec. I - Sec IV d.C., e do Sec. IV - Sec VI d.C.

1 – Noção

As Constituições Imperiais eram leis do Direito Romano produzidas unilateralmente (directamente) pelo Imperador.

Quando analisadas quanto ao seu conteúdo, podiam ser decisões de varia natureza, como é o caso da Decreta, que eram decisões judiciais proferidas pelo Imperador, mas que na tipologia da fonte Manifestandi do Ius Civile surgem na fonte Lei.

2 – Evolução do seu valor jurídico

O Imperador ou Princeps surge dentro da estrutura política de Roma na fase do Principado. Inicialmente, e de acordo com a estratégia adoptada por Octávio César Augusto, o Imperador não detinha poder legislativo.

Com efeito, preparando o caminho para a centralização na sua pessoa de todos os poderes, este Imperador retirou o poder legislativo aos comícios populares, e atribui-o ao Senado. Surgem então as primeiras leis emanadas por este órgão, os chamados Senatusconsultos, que em breve se transformaram em verdadeiras expressões da vontade do Imperador, passando a designar-se por Orationes Princeps.

Durante o Sec. I, e até ao Sec. III d.C., as Constituições Imperiais não têm valor de Lei. Sendo na prática ordens dadas pelo Imperador, e acatadas sem qualquer oposição pelo Populus Romanum.

No Sec. III d.C., as Constituições Imperiais equiparam-se em verdadeiras leis, e a partir do Sec. IV constituem a única fonte do Ius Romanum. Vive-se então um período de absolutismo da lei, entendida como a decisão do Imperador.

As Constituições Imperiais foram, a mando do Imperador Justiniano, compiladas no Codex e nas Novellae do Corpus Iuris Civilis. Esta obra do Direito Romano é uma colectânea de Ius e de Leges, sendo que por Ius, neste contexto, deve entender-se o Ius Romanum Vetus, isto é, o Direito Romano produzido até ao Sec IV d.C. pelas seguintes fontes:

a) Costume, na acepção de Mores Maiorum e de Consuetudo.

b) Lei, designadamente as Lex Rogata, Datae e Dictae, Plebiscito, e Senatusconsultos.

c) E sobretudo Iurisprudentia

Na verdade, no Digesto encontram-se fundamentalmente fragmentos de obras dos Iurisprudentes da época clássica.

Quanto ao termo Leges, significa neste contexto, Ius Romanum Novum, isto é, Direito Romano produzido a partir do Sec IV d.C., exclusivamente pela fonte Constituições Imperiais.

3 – Tipos de Constituições Imperiais, do Sec. I - Sec IV d.C., e do Sec. IV - Sec VI d.C.

Durante o Sec I e até ao Sec. IV d.C., existiam 4 grandes tipos de Constituições Imperiais:

a) Edicta, eram Constituições Imperiais de carácter geral, emanadas pelo Imperador no uso do seu importante poder de Ius Proconsulare Maius.

b) Rescripta, eram Constituições Imperiais que consistiam em respostas dadas por escrito pelo Imperador aos pedidos ou perguntas que lhe eram feitas, designadamente, por elementos Populus Romanum e por Magistrados. No primeiro dos referidos casos, as Rescripta chamavam-se Subscriptio, e quando o Imperador respondia a perguntas que lhe eram feitas pelos Magistrados chamavam-se Epistolas.

c) Mandata, eram Constituições Imperiais que consistiam em ordens ou instruções dadas pelo Imperador aos Governadores de Província e a outros funcionários seus, pelo que revestiam a natureza de circulares sobre problemas administrativos.

d) Decreta, eram Constituições Imperiais que consistiam em decisões judiciais proferidas pelo Imperador na sua qualidade de Presidente dos Tribunais especiais que neste período existiam em Roma.

Após o Sec IV e até ao Sec. VI d.C., período que historicamente ficou conhecido por Baixo-Império, surgem mais dois novos tipos de Constituições Imperiais:

- as Adnotationes, e as Pragmaticae Sanctiones.

As primeiras eram Constituições Imperiais que consistiam numa nova forma de o Imperador responder aos pedidos que lhe eram feitos, inscrevendo nesses mesmos pedidos um rescrito, pelo qual concedia determinados favores, como o da isenção de impostos. As segundas terão sido Constituições Imperiais de carácter regional.

Iurisprudêntia como fonte Manifestandi do Ius Civile

1 – Sentido de Iurisprudêntia para os romanos

2 – Evolução da Iurisprudêntia como fonte do Ius Civile

3 – Evolução histórica da Iurisprudêntia

3.1 – Desde a criação de Roma como cidade até ao Sec. IV a.C., a Iurisprudêntia era uma atribuição exclusiva dos sumos pontífices

3.2 – A partir do Sec. IV a.C. opera-se a laicização da Iurisprudêntia

3.3 – A partir do Império, e sobretudo de Octávio César Augusto, assiste-se à universalização da Iurisprudêntia

1 – Sentido de Iurisprudêntia para os romanos

O Direito Romano era entendido como um problema prático em continuo processo de realização.

Com efeito, sendo um Direito profundamente comprometido com a Praxis social, realizava-se através da resolução dos casos concretos. É neste contexto que deve entender-se o sentido de Iurisprudêntia para os romanos. Na verdade, a Iurisprudêntia romana, sendo a ciência do Direito, era também uma técnica, devido à sua natureza de ciência pratica.

Em Roma, o Direito entendia-se mergulhado no mundo dos valores que deviam orientar a pratica social, e sendo assim, a ciência que se ocupava do estudo do Direito era uma Iurisprudêntia e não uma Iuris Sapientia, porque não tinha um carácter meramente teórico e especulativo, antes se concretizava numa actividade intelectual dirigida a descobrir o que era justo, honesto, útil, na convivência humana.

Para além desta finalidade, cabia também à Iurisprudêntia ensinar os homens como alcançar o justo e evitar o injusto, pelo que era uma ciência de natureza pratica.

2 – Evolução da Iurisprudêntia como fonte do Ius Civile

Inicialmente a Iurisprudêntia romana tinha por função nuclear a chamada Interpretatio.

Com efeito, cabia aos estudiosos do Direito indicar quais as matérias que deviam ser juridicamente reguladas, interpretar as normas existentes, indicar o seu carácter moral ou ético, e referir quando é que a norma jurídica já não tinha qualquer razão de ser.

Sendo assim, a Iurisprudêntia foi na realidade a primeira fonte do Direito Romano.

Contudo, durante a fase da Republica, a actividade da Iurisprudêntia não era oficialmente uma fonte de Direito, porque os responsa dos Iurisprudentes romanos nesta fase não tinham carácter obrigatório nem vinculativo.

É com Octávio César Augusto que esses responsa ganham pela primeira vez um carácter obrigatório e vinculativo.

Com efeito, dentro da sua estratégia de centralização de todos os poderes na sua pessoa, este Imperador chamou para junto de si, e colocou ao seu serviço, os Magistrados mais inteligentes, concedendo-lhes o prestígio que eles não dispunham anteriormente, Tal ocorreu através da atribuição do Ius respondendi ex autoritates princeps.

A partir do Imperador Adriano, Sec. II d.C. a Iurisprudentia cresce de importância, tornando-se oficialmente fonte imediata de Direito, porque os responsa dos Iurisprudentes que tinham o poder de Ius respondendi ex auctoritaté Princeps passam a ser considerados como Leges, visto possuírem uma natureza vinculativa, quer relativamente ao caso concreto em sede do qual foram emanados, quer relativamente a futuros casos, desde que semelhantes a esse.

3 – Evolução histórica da Iurisprudêntia

Inicialmente, no período que vai até o Sec IV a.C. em Roma o estudo do Direito era entendido como um verdadeiro sacerdócio, porque era desprovido de qualquer carácter lucrativo.

Compreende-se pois que neste período inicial a Iurisprudêntia fosse uma atribuição exclusiva dos sumos pontífices, apenas estes podiam ser Iurisprudentes. A partir de referido Sec. IV a.C. opera-se o processo de laicização da Iurisprudêntia, devido essencialmente aos seguintes 3 factores:

a) Ao surgimento da Lei das XII Tábuas, que foi a primeira lei escrita do Direito Romano, e nasceu de uma reivindicação dos plebeus por um regime de igualdade de tratamento com os patrícios.

b) Ao ensino público do Direito Romano que ficou a dever-se ao primeiro plebeu a ter o cargo de Pontífex Maximus (Tibério Coruncaneo).

c) Ao chamado Ius Flaviano, isto é, à primeira colectânea de formulas processuais redigida em Roma por um plebeu de nome Flávio, e que era escriva de um sumo pontífice de nome Apio Cláudio.

Este processo de laicização desemboca numa universalização da Iurisprudêntia a partir do império, visto que Octávio César Augusto concede a alguns Iurisprudentes, e independentemente da sua condição social, a Ius respondendi ex auctoritaté princeps, tornando-se a Iurisprudentia fonte oficial e imediata do Direito Romano.

Ius Praetorium

=> Parte mais importante do Ius Honorarium (todo o Ius Romanum non-civile) Verbal

=> Única fonte de Direito – Actuação do Magistrado Pretor

a. 1ª fase – In Iure

b. 2ª fase – Apud Iudicem

=> Relação de complementaridade, no sentido de correcção com o Ius Civile (o Pretor corrige)

Lex Aebutia de formulis

ó escrita

ó formula processual

Aqui o Pretor é intérprete da Lei, mas sobretudo defensor do Ius e da justiça, interpretando o Ius Civile e também corrigindo as suas aplicações injustas.

Pergunta e resposta para que a Stipulatio seja válida:

Credor: “Spondes Mihi dare?

Devedor: “Spondeo

Até 130 a.C.

Ordens do Pretor (em poder d’Imperium)

1) Stipulatio Praetoriae

a) ob dolum (dolo)

b) ob metum (coação)

2) Restitutiones in integrum(RII) c) ob aetatem (menores de idade)

d) ob fraudem creditariam (fraude feita ao credor)

e) ob errorem (erro desculpável)

3) Missions in possessiones – Embargos de bens

4) Interdicta

Exemplos:

1) Ordem dada pelo Pretor sempre e só a um litígio emergente de uma Stipulatio

2) Ordem dada pelo Pretor de restituir por inteiro, ou seja, desfazer o negócio jurídico.

Dolo – prejuízo grave feito a alguém de propósito

3) Modo que o Pretor tem de sancionar alguém por não obedecer a uma ordem sua

4) Ordens provisórias que tinham que ser confirmadas pelo Juiz para produzir efeitos.

Expedientes do Pretor

ó Anteriores ao ano 130 a.C. e baseados no seu Poder D’Imperium (Poder de soberania a que os cidadãos não podiam opor-se)

1 – É uma ordem dada pelo Pretor logo é diferente da Stipulatio enquanto negócio jurídico;

2 – É uma ordem dada pelo Pretor relativa a um litígio emergente de Stipulatio que não foi validamente celebrada;

2.1 – A Stipulatio enquanto negócio jurídico: natureza, efeitos, requisitos de validade face ao Ius Civile;

3 – Finalidade da Stipulatio Praetoriae

Expedientes do Pretor anteriores ao anos de 130 a.C. e baseado no seu poder D’Imperium

1 - Introdução

O Magistrado Ordinário Pretor Urbano detinha em simultâneo os 3 grandes poderes. Poderes esses que em Roma se reconheciam aos Magistrados do Cursus Honorum:

- Poder de Potestas

- Poder D’Imperium

- Poder de Iurisdictio

A principal função deste Magistrado consistia na resolução dos litígios concretos em que ambas as partes eram Cives.

Sempre que a sua intervenção fosse solicitada pelo sujeito, cujos interesses haviam sido lesados na celebração do negócio jurídico, tratando-se de litígios em que ambas as partes tinham cidadania romana, tal significa que o ordenamento jurídico, no seio do qual se encontrava a regulamentação destes litígios era o Ius Civile.

Sendo assim, ao resolver o litígio sujeito à sua actuação, o Pretor, após análise dos factos, concedia ou negava, ao sujeito, faculdades ou prerrogativas jurídicas que estavam consagradas no Ius Civile.

Mt. Importante: O que acaba de se dizer, é essencialmente válido para a actuação do Pretor até ao ano 130 a.C., posto que a partir deste ano, e devido a uma importante lei do Direito Romano, o Pretor passa a ter o poder de, em determinados litígios e para a sua resolução, conceder ao sujeito Actiones Praetoriae, isto é, Direitos, poderes ou faculdades jurídicas que ele próprio, Pretor, cria.

Exemplo:

Se em 128 a.C., Antonius, cidadão romano, celebrar com Bentus, cidadão romano, uma Stipulatio por força da qual se torna devedor da quantia de 10 mil sestércios, pelo prazo de 20 dias e caso ocorra ao 10º dia do referido prazo, uma grande incêndio que coloca Antonius numa situação de empobrecimento total.

Então, quando demandado para pagar, por Bentus, o que poderá Antonius fazer?

Tratando-se de uma situação que ocorre posteriormente ao ano de 130 a.C., se Antonius solicitar a intervenção do Pretor, este baseando-se no seu Poder D’ Iurisdictio vai, aos analisar os factos em litígio, concluir que o não cumprimento da obrigação jurídica, por Antonius não lhe é imputável, pois decorre de uma catástrofe natural.

Imbuído do espírito de justiça, que o caracteriza e por neste período dispõe de uma maior autonomia relativamente ao Ius Civile, o Pretor vai resolver este litígio concedendo aqui uma actio que ele próprio cria – Actio ficticiae, por força da qual o Pretor vai friccionar que o prazo para o pagamento da dívida não é de vinte dias, mas sim, por exemplo, de um ano, de modo a que Antonius reúna as condições patrimoniais necessárias para o pagamento da divida.

Ora, esta dilatação do prazo a que o Pretor recorre para a resolução deste caso concreto é criado por ele próprio e não pelo Ius Civile.

Até ao ano de 130 a.C. na resolução dos litígios sujeitos à sua apreciação, o Pretor lançava mão de 4 expedientes, ou seja, emanava 4 tipos de ordens com vista à resolução do litígio e fundamentava-as no seu poder D’Imperium. Um poder de soberania ao qual nenhum cidadão de Roma se podia opor. Compreende-se que em regra, as ordens do Pretor fossem acatadas pelos seus destinatários.

Expedientes do Pretor anteriores ao ano de 130 a.C. e baseados no seu poder D’Imperium

I – Stipulatio Praetoriae

1 – A Stipulatio Praetoriae era uma ordem dada pelo Pretor para a resolução de um litígio emergente de uma Stipulatio em cuja celebração não se havia observado algum ou alguns dos requisitos de validade deste negócio jurídico exigidos pelo Ius Civile.

2 – Sendo uma ordem dada pelo Pretor, com base no seu poder D’ Imperium, distinguia-se da Stipulatio que era um negócio jurídico, embora entre essa ordem e o negócio jurídico existisse uma relação intrínseca.

3 – Para bem compreender a Stipulatio Praetoriae é necessário caracterizar cabalmente o negócio jurídico da Stipulatio:

a) Era um negócio jurídico bilateral, porque celebrado entre duas partes;

b) Era um negócio jurídico de natureza obrigacional, porque a sua celebração nascia com a obrigação jurídica de pagar do sujeito devedor;

c) Era um negócio jurídico que tinha como efeitos típicos a criação de uma Actio ou de um direito para o sujeito credor e da correspectiva Obligatio do sujeito devedor;

d) Era um negócio jurídico que para ser validamente celebrado tinha de obedecer aos seguintes 6 requisitos cumulativos:

I) Requisitos de forma: consistia num negócio jurídico cuja forma se traduzia numa pergunta feita pelo credor “Spondes mihi dare?” e numa resposta dada pelo devedor “Spondeo”.

Sempre que o credor ou devedor não utilizassem estas palavras, mesmo que as substituíssem por sinónimos, como é o caso de termo “promito” a Stipulatio considerava-se nula por vício de forma.

II) Era um negócio jurídico oral/verbal, pelo que não podiam validamente celebrar os menores de 7 anos, surdos e mudos.

Se tal ocorresse a Stipulatio seria nula porque ferida de uma incapacidade do sujeito;

III) Era um negócio jurídico inter-presentes, pelo que se uma das partes se encontrasse ausente de Roma deveria fazer-se representar por alguém com poderes para tal;

IV) Entre a pergunta feita pelo credor e a resposta dada pelo devedor não deve existir um tempo superior ao que é humanamente exigível para fazer uma pergunta e dar uma resposta;

V) Era um negócio jurídico solene porque as partes invocavam os Deuses como testemunhas;

VI) Era um negócio jurídico abstracto porque o sujeito devedor não tinha que indicar a razão pela qual contraía o empréstimo.

4 – Se dois cidadãos romanos ao celebrarem uma Stipulatio não observassem algum ou alguns destes requisitos de validade a Stipulatio seria nula face ao Ius Civile. O que significava que o sujeito credor que havia efectivamente emprestado uma determinada soma em dinheiro, não tinha qualquer Direito para exigir o seu pagamento. Tal traduzia-se numa injustiça e a forma de reacção, ao dispor deste sujeito, consistia em solicitar a intervenção do Pretor, o qual após a análise dos factos em litígio emanaria uma Stipulatio Praetoriae cuja finalidade era a seguinte:

- Ordenar ás partes que viessem à sua presença para celebrarem, de novo, a Stipulatio que haviam já celebrado de modo inválido.

Sendo assim, a consequência da utilização deste expediente, pelo Pretor, traduzia-se numa criação válida de vínculo jurídico entre o sujeito devedor e o sujeito credor.

II – Restitutiones in integrum (RII) (desvinculo do negócio)

1 – É uma ordem dada pelo Pretor com base no seu poder d’ Imperium e que significa restituir por inteiro, ou seja, era uma ordem contrária à Stipulatio Praetoriae, pois há um negócio jurídico injusto mas válido.

2 – Tem portanto por finalidade, colocar as coisas tal como elas se encontravam antes da celebração do negócio jurídico que lesou os interesses de uma das partes.

3 – A consequência da aplicação de uma RII pelo Pretor consiste em desfazer o negócio jurídico e desvincular, assim, os sujeitos que nele foram partes.

4 – Os negócios jurídicos bilaterais, a que se chamam contratos, são por excelência um acordo entre vontades livres e iguais.

Sendo assim, sempre que a vontade negocial de um dos sujeitos não for livremente constituída, tal afectará a validade do negócio jurídico.

As vontades negociais não são validamente constituídas sempre que na sua base exista algum ou alguns dos seguintes elementos:

a. Coacção “ob metum

b. Má-fé

c. Dolo – quando o suj. Foi enganado “ob dolum”

d. Erro “ob errorem”

e. Incapacidade de exercício de Direito (menoridade) “ob aetatem”

f. Simulação

g. Fraude “ob fraudem creditorum”

5 – Atendendo a estes vários elementos as RII subdividem-se nas seguintes espécies:

a. RII OB METUM (Coacção)

Era a ordem que o Pretor emanava, com vista a desfazer um negócio jurídico celebrado sob coacção.

Advertência: Para o Ius Civile a coacção não constituía condição de nulidade do negócio jurídico, contudo tratava-se de um vício da verdade, pelo que o Pretor, caso se provasse a coacção e caso o sujeito coagido solicitasse a sua intervenção, afastava essa norma do Ius Civile e ordenava que o negócio jurídico se desfizesse.

b. RII OB DOLUM (dolo)

Era a ordem que o Pretor dava sempre que um negócio jurídico tivesse sido celebrado com dolo, ou seja, sempre que uma das partes tivesse deliberadamente induzido a outra à emanação da sua declaração negocial com intuito de a prejudicar.

c. RII OB ERROREM (erro)

Era a ordem que o Pretor dava, com vista a desfazer o negócio jurídico que um dos sujeitos tivesse celebrado porque se havia enganado. Contudo, esse erro ou engano tinha de classificar-se como desculpável, o que só acontecia se não tivesse existido qualquer má-fé por parte do sujeito que se enganou.

d. RII OB AETATEM (Menoridade)

Era a ordem que o Pretor dava, com vista a desfazer um negócio jurídico em que o sujeito lesado era um menor de idade (24/25 anos)

e. RII OB FRAUDEM CREDITORUM (Fraude feita ao credor)

A RII ob fraudem creditorum é uma ordem emanada pelo Pretor com base no seu poder D’Imperium e a favor do sujeito credor e contra o sujeito devedor e o directo adquirente dos bens do devedor.

Stipulatio válida Doação ou venda fictícia

A B C

Credor Devedor Directo adquirente dos bens do Dev.

Com a actuação do Pretor, este vai anular o negócio jurídico da doação ou venda fictícia e restitui todos os bens de C a B

Para que o Pretor emanasse esta ordem, que tinha por finalidade desfazer o negócio jurídico de doação ou de venda fictícia, celebrado entre o sujeito devedor e o sujeito directo adquirente dos bens era necessário que se encontrasse cumulativamente verificados os seguintes requisitos:

a) Má-fé do sujeito devedor, ou seja, intenção consciente de prejudicar o sujeito credor;

b) Má-fé do directo adquirente dos bens do devedor, ou seja, consciência das intenções do devedor e participação activa das mesmas;

c) Empobrecimento do sujeito devedor que tem de ser:

I) Provocado por si próprio e não por um qualquer estado de necessidade, uma catástrofe natural ou por um elemento exterior à sua vontade;

II) Empobrecimento total, com efeito se o devedor não transmitir na totalidade, através da doação ou venda fictícia, os seus bens ao directo adquirente, ou se antes de decorrido o prazo para o pagamento da divida o devedor obtém uma qualquer titulo, algum bem ou alguma soma em dinheiro, o credor far-se-á pagar com base nesse bem ou nessa soma em dinheiro;

III) Este empobrecimento tem de ser doloso, ou seja, o devedor tem de ter tido a intenção consciente de se empobrecer, para assim não cumprir com a sua obrigação jurídica de pagar.

d) Fraude feita ao credor, ou seja, prejuízo grave sofrido pelo sujeito credor com toda esta situação.

A actuação do Pretor caso na cadeia de transmissão dos bens do sujeito devedor intervindo um ou mais ulteriores adquirentes dos bens do devedor

Numa hipótese deste género a actuação do Pretor orientar-se-á pelos seguintes critérios:

1) Se o negócio jurídico celebrado entre o directo e o ulterior adquirente dos bens do devedor tiver natureza gratuita, isto é, se for uma doação, a actuação do Pretor traduzir-se-á sempre numa ordem que visa desfazer essa doação, independentemente de o ulterior adquirente se encontrar de boa ou má-fé – a essa ordem chama-se Interdictum utile

Stipulatio válida Doação ou venda fictícia

A B C D Boa-fé

Credor Devedor Directo adquirente Ulterior adq.

dos bens do Dev. Dos bens do Dev

Interdictum utile

2) Se o negócio jurídico celebrado entre o directo adquirente e o ulterior adquirente dos bens do devedor tiver natureza onerosa, isto é, se for uma compra e venda, é necessário atender à boa ou má-fé do ulterior adquirente.

Com efeito, se o ulterior adquirente estiver de boa-fé a compra e venda mantém-se válida e eficaz, mas se o ulterior adquirente estiver de má-fé a compra e venda irá desfazer-se por força de uma ordem emanada pelo Pretor e a que se chama Interdictum fraudatorium

Stipulatio válida Venda

A B C D má-fé

Credor Devedor Directo adquirente Ulterior adq.

dos bens do Dev. Dos bens do Dev

Interdictum fraudatorium

III – Missiones in possessiones (embargo de bens)

Era uma ordem dada pelo Pretor, com base no seu poder D’Imperium e que funcionava como um modo de sancionar o cidadão romano que houvesse desrespeitado uma outra ordem que lhe tivesse sido dirigida pelo Pretor.

As Missiones in possessiones são a origem da actual figura do embargo de bens e produziam as seguintes consequências:

- Em face do incumprimento por parte de sujeito devedor de uma ordem que era dada pelo Pretor para que ele cumprisse com a sua obrigação jurídica de pagar, o Pretor tendo em conta o montante da dívida em causa, determinaria que algum ou alguns dos bens do devedor se transferissem para o sujeito credor, com poderes de administração e fruição até que a divida se considerasse paga, momento em que o bem ou bens embargados retornariam à propriedade do sujeito devedor.

Isto significa que, as Missiones in Possessiones não operavam a transferência do Direito de propriedade do sujeito devedor para o sujeito credor, que o mesmo é dizer, o bem ou bens, objecto do embargo eram transmitidos ao credor com meros poderes de administração e fruição e já não com poderes de disposição.

IV – Interdicta

Interdicta ó Posse = poder de facto

Tratava-se de ordens dadas pelo Pretor, com base no seu poder D’Imperium que se distinguiam das demais por terem um carácter provisório.

Com efeito, estas ordens do Pretor necessitavam de ser confirmadas posteriormente pelo Juiz. Eram ordens que este Magistrado utilizava para resolver situações com aparência jurídica e cuja não resolução colocaria em perigo a paz jurídica da comunidade.

Interdicta relativa à posse

Sobre qualquer coisa móvel ou imóvel recaem vários Direitos reais, em que o principal é o Direito de propriedade e também um poder de facto a que se chama posse.

A posse não é portanto um Direito, mas tem implicações jurídicas importantes, de entre as quais se destaca a seguinte:

- Sempre que um sujeito tem a posse pacífica de uma coisa, de modo ininterrupto por um período de tempo que no Direito Romano era de 40 anos e no Direito Português é de 20 anos. Então por força da chamada uso capião esse sujeito tornava-se proprietário dessa coisa.

Por outro lado, atendendo ao modo como a posse é obtida, fala-se de posse pacífica que é aquela em que o sujeito actua de boa-fé. De posse clandestina que é aquela em que o sujeito adquire a posse sobre a coisa ou porque utilizou a violência ou porque convenceu o possuidor legítimo através de insistentes pedidos a ceder-lhe a coisa. Sendo que nesta última hipótese se fale de posse obtida a título precário.

No Direito Romano as situações relativas à posse das quais emergem litígios só podiam resolver-se mediante a intervenção do Pretor.

Interdicta Possessiones

1) Interdicta Retinendae Possessiones

a) Uti Possidetis

b) Utrubi

2) Interdicta Recuperandae Possessiones

a) Ad Precário

b) Unde Vi

c) Vi armata

As ordens que o Pretor emanava para a resolução destes litígios específicos chamavam-se Interdicta possessiones e subdividiam-se em 2 tipos:

a) Interdicta Retinendae Possessiones eram ordens de natureza proibitória que o Pretor emanava sempre que pretendia proibir que alguém que detinha uma posse pacífica fosse nela perturbado por outrem. Se a coisa possuída fosse um bem imóvel, a Interdicta Retinendae Possessiones chamava-se Uti Possidetis. Se a coisa possuída fosse um bem móvel a Interdicta Retinendae Possessiones chamava-se Utrubi.

b) Interdicta Recuperandae Possessiones eram ordens dadas pelo Pretor, com base no seu poder D’Imperium e de natureza restituitória, visava obrigar aquele que havia obtido a posse de uma coisa, de forma não pacifica, a restituir essa coisa (recuperar a posse).

A obtenção da posse de forma não pacifica podia realizar-se numa das seguintes situações:

1) Sempre que o possuidor da coisa cedendo a insistentes pedidos de um outro sujeito, lhe transmitisse a posse dessa coisa e caso posterior este possuidor, a título precário, se recusasse a restituir a coisa, o Pretor interviria a favor do 1º possuidor emanando uma ordem que se chamava Interdicta Recuperandae Possessiones Ad Precário

2) Sempre que alguém tivesse obtido pela violência a posse de uma coisa, recusando-se depois a restitui-la o Pretor emanaria uma ordem, com vista a essa restituição chamada Interdicta Recuperandae Possessiones Unde Vi.

3) Sempre que alguém perdesse a posse de uma coisa devido ao uso de violência e posteriormente organizando um grupo de homens armados, que o mesmo é dizer recorrendo à via armada, obtivesse a posse dessa mesma coisa. Caso o primeiro dos sujeitos envolvidos solicitasse a intervenção do Pretor, este magistrado, ponderando o grau de violência utilizado por ambos os sujeitos emanaria uma ordem, com vista à restituição da coisa para o sujeito que foi objecto da violência mais grave e essa ordem chamava-se Interdicta Recuperandae Possessiones Vi armata

Expedientes do Pretor posteriores ao ano de 130 a.C. e baseados no seu poder D’Iurisdictio

O Pretor cria Direito nos vários casos não previstos pelo Ius Civile, onde o Pretor concede uma actio própria (Actio Praetoriae), criando assim directamente Ius.

Ano 130 a.C. = Lex Aebutia de Formulis ó Impotência: Introduz uma nova forma de processar

= Agere per formulas

Atribuição ao Pretor de novos expedientes

1) Denegatio actiones

2) Exceptio

3) Actiones Praetoriae (com estas o Pretor pela 1ª vez cria Ius Praetorium de forma directa)

a) Actio in Factum Conceptae (tem a mesma finalidade da Stipulatio Praetoriae)

b) Actio Ficticiae

c) Actio Utile

d) Actio Adiecticiae Qualitis

Com efeito, este ano assinala o surgimento de uma importante Lei do Ius Civile, a chamada Lex Aebutia de Formulis. Esta Lei apresenta uma dupla importância que cumpre considerar:

1) No domínio do processo jurisdicional romano a Lex Aebutia de Formulis, vai introduzir uma nova forma de processar, a que se chama agere per formulas. Tal significa que o processo jurisdicional romano, que até então era oral, passa a ser todo ele escrito. Mantém-se a sua divisão em duas fases:

- A fase In Iure e a fase Apud Iudicem, mas doravante o Pretor, no final da fase In Iure, elabora um documento escrito, que apresenta ao Iudex e com base no qual este emana a sentença.

Este documento escrito é a fórmula processual, sendo que, consoante o tipo de pedido introduzido em Tribunal, assim se apresenta a redacção da formula processual.

A fórmula processual romana era integrada pelas seguintes cláusulas:

1) Cláusulas ordinárias

a) Intentio – onde se esclarecia a causa de pedir

b) Condemnatio – onde se indicava ao Iudex se ele deveria condenar ou absolver o sujeito demandado

2) Cláusulas eventuais

a) Demonstratio – onde se clarificava a Intentio

b) Adiudicatio – utilizada apenas quando se tratava de uma acção para divisão de uma coisa comum

3) Cláusulas extraordinárias

a) Exceptio – cláusula a favor do sujeito demandado que operava como uma espécie de circunstância atenuante para o comportamento violador

b) Praescriptio – era uma cláusula concedia a favor do sujeito demandante.

A Lex Aebutia de formulis tem também uma particular importância no que toca à actuação do Magistrado Pretor, na medida em que funda a atribuição de novos expedientes, com base no seu poder D’Iurisdictio.

Quanto a estes novos expedientes cumpre fazer as seguintes advertências:

a) Não substituem as anteriores, antes se lhes acrescentam.

Sendo que, o que se acaba de dizer admite, no entanto, a seguinte excepção: O expediente Stipulatio Praetoriae que o Pretor utilizava para num ano anterior a 130 a.C. resolver um litígio emergente de uma Stipulatio invalidamente celebrada é substituída pelo expediente Actio in Factum Conceptae se esse litígio ocorrer num ano posterior a 130 a.C.

b) Os novos expedientes dos Pretor já não se fundam no poder D’Imperium mas sim, no poder D’Iurisdictio, ou seja, no poder de administrar, de modo corrente, a Justiça.

c) No leque destes novos expedientes surgem as chamadas Actiones Praetoriae e o aparecimento deste tipo de Actiones tem a seguinte grande importância:

- Até ao ano de 130 a.C. o Pretor sempre que a sua intervenção era solicitada, intervinha, resolvendo o litígio concreto mediante a concepção ou a negação de Direitos, poderes ou faculdades jurídicas que se encontravam consagrados no Ius Civile. Isto significa que a actuação do Pretor, no período anterior ao ano 130 a.C. se traduzia, exclusivamente, na concepção ou negação de Actiones Civiles.

Diferentemente, a partir do ano 130 a.C. ainda que apenas para 4 tipos de situações específicas, o Pretor já pode, pela 1ª vez conceder ao sujeito, que solicita a sua intervenção, um Direito, poder ou faculdade que não está plasmado no Ius Civile , pelo que, é portanto criado ab inicio pelo próprio Pretor.

Quer isto dizer, que após o ano 130 a.C., pela 1ª vez o Pretor concede Actiones Praetoriae e neste sentido cria de forma directa “Ius Praetoriae”.

Exemplo:

Stipulatio validamente celebrada

Empobrecimento do devedor provocado por uma catástrofe natural, consequente impossibilidade de cumprir com a obrigação judicial de pagar.

Se esta situação ocorrer posteriormente ao ano 130 a.C., o Pretor, ponderando os interesses de ambas as partes envolvidas, posto que o devedor não cumpre devido a um elemento exterior à sua vontade, vai criar uma Actio própria, que não está consagrada no Ius Civile, e por força da qual, dilata o prazo para o pagamento da dívida em prol da Justiça.

Esta Actio, que se traduz, na prática, em permitir ao devedor um maior tempo para pagamento da divida, chama-se Actio Ficticiae e através dela, o Pretor cria, de forma directa Ius Praetariae.

Denegatio Actiones – Trata-se de um expediente que o Pretor utilizava, sempre que negava liminarmente ao sujeito a Actio Civilis.

Exceptio – Era um expediente que o Pretor utilizava, sempre que tendo concedido, ao sujeito, uma Actio Civilis, posteriormente, durante a fase in iure, concluía pela necessidade de frustrar ou inutilizar a Actio que havia sido concedida ao sujeito.

A Exceptio era uma cláusula que o Pretor introduzia na forma processual, e na qual referia alguma circunstância a favor do demandado, ou seja, inutilizava a pretenção do sujeito demandante.

Exemplo:

Mancipatio (transferência de propriedade) realizada sob coacção, não entrega da coisa pelo sujeito vendedor

- Incumprimento contratual

- Solicitação da intervenção do Pretor pelo sujeito comprador

Concepção a este de uma Actio Civilis, por força da qual o Direito de propriedade sobre a coisa se transfere da esfera jurídica do vendedor para a do comprador.

Porém, no decurso da fase In Iure, o Pretor apercebe-se e prova a existência de coacção, pelo que utiliza uma Exceptio para frustrar a Actio concedida ao sujeito comprador e para atenuar o comportamento do sujeito vendedor justificando a não entrega da coisa.

Nota: Quer no âmbito do Senatusconsultos Macedonianum quer no de Velleianum sempre que o Filliusfamilia e a cidadã intercedente se pretendia eximir ao cumprimento da obrigação jurídica de pagar, alegavam a protecção destes Senatusconsultos, invocando a seu favor uma Exceptio.

Actiones Praetoriae

1) Actiones in Factum conceptaeTrata-se de uma Actio criada pelo próprio Pretor sempre que lhe cumpre resolver um litígio idêntico àquele que lhe é apresentado no período anterior a 130 a.C., e para a resolução do qual, o Pretor utilizava uma Stipulatio Praetoriae. Tratava-se, como o próprio termo indica, de uma Actio que o próprio Pretor cria para dar protecção jurídica a uma situação que merece essa protecção, e não a tem da parte do Ius Civile.

2) Actiones Ficticiae – Trata-se de uma Actio que o Pretor cria por recurso à ficção, isto é, alterando ou introduzindo, na situação concreta, um elemento novo (P.ex. dilatações de prazo para o pagamento de uma dívida). Sendo que Pretor, assim, actua para a realização da Justiça e não para o favorecimento de uma das partes do litígio.

3) Actiones Utiles – É uma Actio que o Pretor cria, sempre que utiliza a analogia, ou seja, sempre que para a resolução do litigio, submetido à sua apreciação, o Pretor recorre à solução que para um caso semelhante o Ius Civile consagra.

4) Actiones adiecticiae qualitatis – Trata-se de uma Actio que o Pretor cria, sempre que pretende responsabilizar, total ou parcialmente, o PaterFamilia por uma dívida contraída por uma Filliusfamilia ou por um Cervos.

Exemplo:

O cidadão A, filho do comerciante Bentus, na qualidade de gerente do estabelecimento comercial do seu pai, contrai, perante o cidadão romano C, uma dívida no valor de 20 mil sestércios. Dinheiro que, efectivamente, utiliza para que a gerência do referido estabelecimento comercial. Quando demandado por C para pagar, A, enquanto Filliusfamilia, não o pode fazer. C solicita a intervenção do Pretor e este Magistrado, provado que fica, que a divida foi contraída para a gerência do estabelecimento comercial de B, concede a C, uma Actio Adiecticiae qualitatis, de forma a responsabilizar B totalmente, pela referida dívida, na hipótese em concreto.

Esta Actio diz-se institutória.

2º Semestre

1º Períodoó Período da individualização do Direito Português (meados do Sec. XII, Sec. XIII)

2º Períodoó Período do Direito Português de inspiração romano-canónica (meados do Sec. XIII, Sec. XVIII)

* Época do:

ð Renascimento do Direito romano Justinianeu

ð Renovação do Direito canónico

* Época das ordenações do Reino de Portugal

3º Períodoó Período da formação do Direito Português moderno (desde a governação Pombalina até à actualidade)

ð Época do jusnaturalismo racionalista (até 1820 +)

ð Época do individualismo (1820-1920 +)

ð Época do Direito social (de 1920 até à actualidade)

Cidadania romana (= conjunto de direitos no domínio do Direito privado e do Direito público – concedidos e regulados pelo Ius Civile)

ó Direito privado Ius Connubii

Ius Commercii

ó Direito público Ius Suffragii

– Faculdade de ser Magistrado

- Faculdade de se alistar no exército

Habitantes da Península à data e durante a ocupação romana:

1) Latinos antigos Ius Commercii

Ius Connubii

Ius Suffragii

Adquiriam mais cidadania romana se fixassem definitivamente residência em Roma

2) Latinos Coloniais Ius Commercii

Ius Suffragii

3) Latinos JunianosLex Iunia Norbana 19 d.C.)

Nunca obtinham a cidadania romana, pois nasciam com a condição de escravos e quando morriam regressavam a essa condição.

Direito Peninsular

1º Período – Período primitivo ou ibérico

1) Organização política dos povos Autóctones

2) A organização social e a relação de clientela na forma especial de devossio.

O período primitivo ou ibérico é o período da história do Direito peninsular que antecede à ocupação da península pelos romanos.

Aos povos que habitam a primitiva Hispânia neste período convencional chamam-se indígenas ou autóctones.

Quanto à sua organização política existia uma multiplicidade de modelos de organização estatal sendo que, os mais frequentes eram o Estado Cidade e o Estado Tribo. O primeiro corresponde ao modelo de organização que esteve na base do aparecimento da Polis grega e da Civitas romana e caracteriza-se como sendo um agrupamento de homens livres e detentores de uma igual parcela de poder, já o Estado Tribo tem uma natureza territorial e o poder não se encontra partilhado de forma igual pelos diversos membros da comunidade.

Quanto à organização social, os povos autóctones adoptaram a estrutura social típica do mundo antigo, que separava os homens livres dos escravos, havendo a referir dentro dos primeiros – os nóbilis, ou seja, aqueles homens livres que se destacavam dos demais pelo seu poder militar, pela riqueza, linhagem ou pelo cargo público que ocupavam.

Na primitiva Hispânia, no domínio da organização social cumpre referir a chamada relação clientela que aqui assumiu contornos específicos.

Esta relação surge sempre que por motivos de natureza económica, um homem livre se coloca sob a protecção de um homem poderoso, oferendo-lhe em troca todos os seus serviços.

Na primitiva Hispânia os clientes formavam, portanto um grupo especial específico e devido à situação de guerra quase permanente a relação de clientela assume neste território uma especificidade. Com efeito, não raras vezes os clientes acompanhavam o seu patrono na guerra, ofereciam a uma divindade religiosa a sua vida em troca da protecção do patrono, tornando-se então devotos e, a consequência disso, era a de que os devotos, caso o patrono morresse, em combate, teriam de suicidar-se, pois a relação de devossio, não lhe permitia, nessa hipótese regressar com vida à sua comunidade de origem.

Quanto aos regimes políticos que vigoravam na primitiva Hispânia, a regra era a das monarquias hereditárias e vitalícias e a excepção eras os regimes republicanos de função aristocrática.

Sob o ponto de vista político, convém ainda referir que esta coexistência, mais ou menos pacífica, dos diversos grupos autónomos e isolados não impedia, por vezes, normalmente em situações de ameaça de invasão estrangeira, que estes mesmos grupos se associassem ou através de confederações de tribos ou de cidades, ou através de subordinação de estados, como é o caso do império Tartésio, que se formulou pela subordinação de vários estados peninsulares à cidade de Tartesos.

2º Período – Período romano

1) O processo de romanização jurídica da península (o processo de extensão da cidadania romana aos latinos).

2) O Direito que vigorou na península no período romano.

3) Posição adoptada por Roma no campo político-administrativo face às comunidades indígenas.

1) A romanização jurídica da península tem de partir da seguinte consideração:

- Os habitantes da península chamados latinos e entre si distinguidos entre: latinos antigos, latinos coloniais e Latinos junianos eram relativamente ao Direito romano Peregrinis. Com efeito, não haviam sido reduzidos à condição de escravos, mantendo a sua liberdade e a possibilidade de regulamentarem as suas relações jurídicas pelos seus próprios Direito, ao que acresce que sempre que estabelecessem relações jurídicas com um cidadão romano essas relações eram reguladas pelo Ius peregrini.

A cidadania romana significava a concessão aos cives de um conjunto de Direitos quer no âmbito do Direito privado quer no Direito público.

No âmbito do Direito privado os cives tinham os seguintes Direitos:

a) Ius Connubii, ou seja, o Direito de celebrarem validamente casamento e de constituir família com todos os efeitos pessoais e patrimoniais daí decorrentes;

b) Ius Commercii, ou seja, o Direito de celebrarem validamente negócios jurídicos de natureza patrimonial como a Stipulatio e a Mancipatio.

No âmbito do Direito público os cives tinham os seguintes Direitos:

a) Ius Suffragii, ou seja, o Direito de votar nos comícios populares;

b) Ius Honorum, ou seja, o Direito de ascenderem à magistratura;

c) Ius Milita, ou seja, o Direito ou faculdade de se alistarem no exército romano.

Nota importante: Todos estes Direitos estavam consagrados e eram regulados pelo Ius Civile.

Quanto aos habitantes da península, os latinos antigos que eram os primitivos habitantes da cidade de Lacio, tinham o Ius Connubii, Ius Commercii, o Ius Suffragii e ainda a possibilidade de se tornarem cidadãos romanos caso fixassem residência definitiva em Roma.

Para além dos Latinos antigos a península era habitada pelos latinos Coloniais e pelos latinos Junianos.

Os latinos coloniais eram habitantes de províncias a quem a latinidade fora concedida como privilégio e eram titulares do Ius Commercii (Direito de celebrar validamente negócios jurídicos de carácter patrimonial) e do Ius Suffragii (Direito de votarem nos comícios populares).

Quanto aos latinos junianos eram os escravos que podiam alcançar a liberdade em vida, hipótese em que se tornariam juridicamente equiparados aos latinos coloniais, mas nunca adquiririam cidadania romana e quando morriam regressavam à condição de escravos. Esta situação jurídica estava regulada pela Lex Iunia Norbana de 19 d.C.

Nota muito importante: Quer os latinos antigos, quer os latinos coloniais obtinham a cidadania romana sempre que desempenhassem cargos públicos. É neste contexto e com base neste facto que Gaius, Jurisconsulto romano da época clássica, distingue entre latinidade maior e latinidade menor.

Fala-se de latinidade maior, se para ascender a cidadão romano, o latino tivesse feito parte do Senado local ou da Cúria.

Fala-se de latinidade menor se para esse efeito, bastasse o latino ter exercido alguma das magistraturas locais, tendo sido a latinidade menor a que Vespasiano, por volta de 73 d.C., concedeu a alguns latinos, iniciando o processo que haveria culminar com a concessão da cidadania romana a todos os públicos do império, em 212 d.C., pela Constituição Imperial de Caracala.

A concessão de cidadania romana aos latinos antigos e latinos coloniais traduz a essência do processo de romanização jurídica da península e teve na sua base dois grandes factores:

1º Factor

A concessão, por volta de 73 ou 74 d.C. por Vespasiano aos latinos da chamada latinidade menor de acordo com a qual todos os latinos que tivessem exercido um cargo público na península tornavam-se cidadão romanos. Chama-se a esta latinidade menor porque o Iurisconsulto romano Gaius ao estudar este fenómeno considerou o seguinte: Se Vespasiano tivesse feito depender a concessão da latinidade do facto de os latinos terem pertencido ao Senado ou à Cúria, então Vespasiano teria concedido aos latinos a latinidade maior, contudo como para que os latinos se tornassem cives, apenas bastava exercerem um cargo público local, então o que Vespasiano lhes concedeu foi a latinidade menor.

2º Factor

Ocorre no ano 212 d.C. quando por força da Constituição Imperial de Caracala se determina que todos os súbditos do império romano adquiram a cidadania romana convém referir que este 2º factor não teve entre nós o mesmo alcance que em outros pontos do Império porque de 73 a 212 d.C. muitos foram os latinos que se tornaram cidadãos romanos e por este motivo ainda que importante a Constituição imperial de Caracala representa entre nós, o colmatar de um processo que se iniciou vários anos antes da concessão da latinidade menor por Vespasiano aos habitantes da península.

3 – A atitude adoptada por Roma no plano económico-administrativo quanto às comunidades indígenas, isto é, às cidades existentes na península à data da invasão dos romanos pode considerar-se como uma atitude “tripartida” posto que:

a) Na generalidade dos casos a autonomia política destas cidades era respeitada;

b) Quando as cidades indígenas haviam oferecido grande resistência militar à ocupação romana, como aconteceu com a cidade de Numância, ficaram à mercê de Roma e deixaram de existir politicamente como cidades.

c) Roma concedeu a outro grupo de cidades a possibilidade de manterem a sua autonomia política e administrativa ainda que em condições diferentes. É quanto a este 3º grupo de cidades que deve fazer-se a seguinte distinção:

c.1) Cidades Estipendiárias – eram cidades que mantinham a sua autonomia embora o governados de província a pudesse alterar a qualquer momento, além disso tinham de conceder a Roma colaboração militar e pagar um imposto de natureza territorial a que se chamava Stipendum.

c.2) Cidades livres – Também mantinham a sua autonomia política, mas agora por força de um acto unilateral de Roma pelo que o governador de província não a podia alterar e também pagavam tributos a Roma.

c.3) Cidades livre e imunes - Tal como as duas anteriores também mantinham a sua autonomia e ao contrario das outras duas não pagavam qualquer imposto a Roma.

c.4) Cidades federadas – Também tinham autonomia em virtude de um tratado celebrado com Roma e estavam isentas do pagamento de impostos.

A par destas cidades indígenas os romanos trouxeram para a península dois tipos de cidades romanas.

a) Colónias – Eram criadas à margem de Roma e habitas pelos veteranos das legiões romanas.

b) Municípios – Cidades só de cives ou só de latinos e que nasciam da transformação de cidade indígenas a cujos habitantes haviam sido concedidos cidadania romana ou a latinidade menor.

Período germânico ou visigótico

Os povos germânicos chegaram à península no Sec. V e eram quatro:

- Suevos

- Alanos

- Vândalos

- Visigodos

Estes povos tinham uma cultura inferior à cultura romana e por isso o processo de infiltração foi bastante lento.

Causas das invasões germânicas:

Em 409 d.C. chegaram à península os Suevos, os Alanos e os Vândalos, em 429 d.C. os Vândalos e os Alanos deixaram a península e foram para o Norte de Africa, ficando apenas os Suevos. Depois chegaram os visigodos e durante quase um século estiveram em luta com os Suevos e os hipano-romanos, até 585 d.C. Neste ano há uma unificação de toda a península, passando toda ela a ser visigótica.

Até 585 d.C. o princípio base era o da personalidade porque os visigodos não impuseram a sua cultura. A partir desta data e com a unificação passa a existir a territorialidade.

O Direito visigótico a partir do Sec. VI

1) Leis dos bárbaros ou Leis populares

2) Leis romanas dos bárbaros

3) Leis capitulares

1) A propósito destes preceitos, alguns autores defendem que a designação de Leis surge incorrecta, na medida em que tratou, na realidade de preceitos consuetudinários que apenas se reduziram a escrito para evitar a deformação que decorreria da sua transmissão oral. Chamam-se de Leis populares e o seu Direito é Direito popular, por poder considerar-se que o povo, reunido em assembleias populares, é o órgão produtor destas leis.

Com efeito, é assim que as normas jurídicas são criadas, sempre em conformidade com o costume e a consciência colectiva. Por outro lado, quando estas leis são de iniciativa régia, necessitam da aprovação popular, por último, nenhuma alteração a estas leis se pode realizar sem o consentimento das referidas assembleias.

Quanto ao seu conteúdo, disciplinam matérias diversas como é o caso da Lei Sabica, relativa ao Direito e ao processo penal, enquanto que outras leis, já de origem visigótica dizem respeito ao Direito e ao processo civil.

2) As leis romanas dos bárbaros são colectâneas de Iure e de leges, elaboradas nos Estados germânicos com finalidades diversas e com âmbitos de aplicação igualmente diferentes (abrangem ora fragmentos de obras de juristas clássicos, ora Constituições imperiais). Para alguns autores, estas colectâneas aplicavam-se apenas à população germânica, como outras apenas à população romana, como é o caso da Lex Romana Visigithorum ou Breviário de Alarico.

3) Leis Capitulares eram conjuntos de normas jurídicas avulsas, promulgadas por reis germânicos, divididas formalmente em capítulos e versando sobretudo sobre matérias de Direito público e por vezes sobre assuntos eclesiásticos. Constituíam autênticos diplomas legislativos.

Fontes de Direito dos estados germânicos na acepção de documentos que contêm as normas jurídicas:

a) Formulários – formulas visigóticas

b) Diplomas de actos jurídicos concretos

a) Os formulários eram colectâneas de fórmulas destinadas à celebração de contratos ou de outros actos jurídicos. O mais importante formulários que chegou até nós, foi o das formulas visigóticas, que demonstram grandes influências de Direito Romano, o que se compreende na medida em que os germânicos adoptaram o sistema documental romano.

b) No tocante a esta documentação, destacam-se certos diplomas e cartas conservados até nós através dos cartórios ou livros de Constituições eclesiásticas.

Direito Visigótico (Terá sido um Direito de aplicação territorialista ou de aplicação personalista?)

Fontes de Direito Visigótico:

1 – Código de Eurico (475 ou 476 d.C)

2 – Breviário de Alarico ou Lex Romana Visigothorum (506 d.C.)

3 – Código revisto de Leovigildo (580 d.C.)

4 – Código visigótico (Lex Visigothorum Recesuindiana) (654 d.C.)

O problema: Terão estas fontes tido uma aplicação territorialista ou personalista?

Advertência: Este problema só se coloca quanto às fontes anteriores ao código revisto de Leovigildo.

1 – Durante o período germânico destaca-se o povo visigótico que apresenta a nível jurídico um Direito bastante bem estruturado, desde logo, no respeitante às respectivas fontes escritas.

2 – As fontes do Direito visigótico foram essencialmente as seguintes:

2.1 – Código de Eurico – É considerada a 1ª colectânea oficial de Direito visigótico e foi promulgada pelo Rei Eurico (475 ou 476 d.C.).

Trata-se de uma colectânea que se classifica como sendo uma Lei Barbara ou popular e que demonstra alguma receptividade do Direito romano vulgar.

Advertência: Antes da promulgação do Código de Eurico, conhece-se a existência de um conjunto de leis da iniciativa dos Reis Teodorico I e II e que versaram, essencialmente, sobre a questão da distribuição das terras peninsulares, em virtude, do acordo de hospitalidade, celebrado entre romanos e visigóticos.

2.2 – Breviário de Alarico – Promulgado em 506 d.C. pelo Rei Alarico III, é uma colectânea com um conteúdo muito particular e à qual subjazem a seguinte finalidade:

- Seleccionar quais as normas de Direito romano que podiam ser utilizadas nos Tribunais peninsulares neste período em questão.

Sendo assim, o Breviário de Alarico continha Ius ou fragmentos de obras de Iurisprudêntia romana da época clássica, tais como o Epitome do Jurisconsultos Gaius, as sentenças do Jurisconsultos Paulus e um fragmento da obra do Jurisconsultos Papirianus, para além, do Ius, o Breviário também continha leges, ou seja, Constituições Imperiais.

Tendo em conta o seu conteúdo, classificou-se como uma Lei romana dos Bárbaros, ou Lex Romana Visigothorum.

2.3 – Código revisto de Leovigildo – Promulgado no ano de 580 d.C., pelo Rei Leovigildo. Este código chegou até nós, mediante a recolha de algumas das suas normas, sob a denominação de Leis antigas no código visigótico, e veio actualizar o código de Eurico.

2.4 – Código Visigótico – Do Rei Leovigildo até ao Rei Recesvindo, a legislação visigótica conhece um grande incremento.

Vários monarcas foram responsáveis pela promulgação de diversas leis, entre os quais se destaca o Rei Xindasvindo, porém é o seu filho Recesvindo que acabará, em 654 d.C., por operar uma reforma na legislação visigótica e promulgar a última colectânea deste Direito chamado Código visigótico.

Este código que terá vigorado por cerca de 100 anos, elaborou-se com base em fontes de Direito romano, sobretudo anteriores ao Corpus Iuris Civilis, de Direito canónico e de Direito germânico.

3 – A propósito destas fontes de Direito visigótico, a doutrina tem vindo a discutir o problema de saber se a sua aplicação obedeceu ao princípio da territorialidade ou ao invés se se norteou pelo princípio da personalidade.

4 – Este problema, contudo, é circunscrito apenas à legislação visigótica anterior ao código revisto de Leovigildo, posto que, quanto a este código e ao código visigótico, a doutrina é consensual, em considerar a sua aplicação territorialista, devido ao facto de estes códigos conterem normas regulamentadoras de relações jurídicas entre romanos e visigóticos.

5 – O princípio da territorialidade significa que um Direito se aplica a todos os sujeitos que habitam um dado território, independentemente, da raça a que pertençam. Sendo assim, se se considerar que o Direito visigótico foi de aplicação territorialista, tal significa que se aplicou quer a visigóticos, quer a romanos, desde que estes sujeitos habitassem na Península.

6 – O princípio da personalidade significa que, um Direito se aplica apenas aos sujeitos pertencentes ao seu respectivo povo, pelo que, se se considerar que as fontes de Direito visigótico foram de aplicação personalista, tal significa que elas só regulamentaram as relações jurídicas dos visigóticos.

7 – A posição da doutrina, a propósito deste problema desenvolveu-se do seguinte modo:

7.1 – Até à segunda metade do Sec. XIX, a doutrina defendeu a aplicação territorial das fontes de Direito visigótico.

7.2 – Nos finais desse Sec. um historiador alemão de nome Eichhorn, vai defender o princípio da personalidade do Direito visigótico, sustentando a sua tese no seguinte argumento: No período em questão, existiram na península dois tipos de juízes diferentes – O Thiuphadus para resolver os litígios em que ambas as partes era visigóticas e o Iudex para resolver os litígios, em que ambas as partes eram romanos. Mais tarde, esta tese terá sido reafirmada por outro historiador alemão de nome Zeumer, e durante um longo período de tempo foi feita a tese dominante.

Porém, os defensores desta tese nunca conseguiram responder à seguinte questão: - Sendo o Direito visigótico de aplicação exclusiva aos visigóticos e mantendo-se os romanos a regulamentarem as suas relações pelas normas de Direito romano vulgar, então qual o Direito utilizado neste período para a resolução dos litígios em que uma parte fosse visigodo e uma outra um romano.

7.3 – Por volta de 1940 o historiador espanhol Garcia Gallo veio alterar este panorama, defendendo a tese da territorialidade do Direito visigótico. Para este autor, todas as fontes de Direito visigótico foram de aplicação indistinta aos visigodos e aos romanos que habitavam a península no período em questão.

Depois de afirmar a aplicação territorialista do Direito visigótico, Garcia Gallo defendeu, que as diversas fontes escritas deste Direito se revogaram umas outras de acordo com o princípio jurídico, segundo o qual a lei posterior derroga a lei anterior.

ó Garcia Gallo = São de aplicação territorial

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2

3

4

Sendo assim, quando em 506 d.C., o Breviário de Alarico é promulgado, revoga-se o código de Eurico, em 580 d.C. quando o código revisto de Leovigildo é promulgado, revoga-se o Breviário de Alarico, e por último, em 654 d.C., quando o código visigótico é promulgado, revoga-se o código revisto de Leovigildo.

7.4 – A posição adoptada neste curso é a do Prof. Paulo Merêa, que assume, relativamente, à de Garcia Gallo, uma atitude de concordância e de discordância. Com efeito, Paulo Merêa, concorda com Garcia Gallo no que toca à natureza territorialista com a aplicação das fontes de Direito visigótico, mas discorda quanto à questão da revogação destas colectâneas umas pelas outras.

Com efeito, para Paulo Merêa, atendendo ao conteúdo e à finalidade que subjazeu à criação do Breviário de Alarico, esta colectânea de Direito visigótico não pode ser considerada tal como as restantes, uma lei geral desse povo.

Com efeito, para Paulo Merêa, o Breviário de Alarico foi uma colectânea de natureza subsidiária e por esse motivo não teve a força normativa suficiente para revogar o código de Eurico.

Na sequência disto, este autor defendeu o seguinte: - O código de Eurico só foi revogado pelo código revisto de Leovigildo e este pelo Direito visigótico.

Quanto ao Breviário de Alarico ter-se-à mantido, ainda que como colectânea de natureza subsidiária, até ao ano em que o Rei Recesvindo, ao promulgar o código visigótico, decidiu revogar toda a legislação visigótica, ainda vigente. Que o mesmo é dizer, decidiu revogar quer o código revisto de Leovigildo, quer o Breviário de Alarico.

ó Paulo Merêa

1

3 2

4

A teoria defendida por Paulo Merêa comporta 3 consequências importantes:

a) A dilatação do período de vigência do código de Eurico, que segundo Paulo Merêa, vigorou desde 475-476 até 580 d.C.

b) A dilatação do período de vigência do próprio Breviário de Alarico, que ainda que sendo uma colectânea de natureza subsidiária, terá vigorado desde 506 até 654 d.C.

c) Permitiu que na doutrina se assumissem vozes discordantes quanto ao carácter territorial ou personalista da aplicação do Breviário de Alarico.

Com efeito, para alguns autores, se esta colectânea só continha normas de Direito romano, terá tido uma aplicação personalista, isto é, terá tido por finalidade regular apenas os litígios entre romanos. Para outros autores, a circunstancia desta colectânea conter normas de Direito romano apenas significava a grande recessão desse Direito no Direito visigótico, mas não implicou com a sua aplicação territorialista.

Há depois mais duas versões do código visigótico:

1 – Forma Ervigiana - promovida pelo Rei Ervigio

2 – Forma vulgata (foi de origem privada)

O código visigótico tinha uma sistematização de 12 livros. Os livros tinham títulos e os títulos tinham Leis.

3/5 das Leis do Código visigótico iniciavam com a expressão antiqua, quando assim não acontecia era porque estas leis foram elaboradas após o Rei Leovigildo.

Período muçulmano e da reconquista cristã

711 d.C. – Chegada dos muçulmanos como aliados de um Rei Visigótico, mas acabaram por reconquistar o reino.

Consequências da sua chegada:

Do ponto de vista do Direito, foi a perda da unidade jurídica, passando, assim, a existir duas vertentes jurídicas:

a) Código Visigótico

b) Direito Islâmico

Sai-se do sistema da territorialidade e o Direito passa a ser de aplicação personalista e segundo a crença religiosa.

Não há distinção entre o Direito e a religião, ou seja, há uma confusão entre a religião e o Direito.

Fontes de Direito islâmico:

1 – Alcorão – Conjunto das revelações de Alá ao profeta Maomé (escritas após a morte de Maomé)

2 – Summa – Conduta diária de Maomé que são entendidas como sendo o conjunto implícito de revelações de Alá. Só foram escritas no Sec. VII

Fontes complementares do Direito muçulmano:

1 – O consenso humano unânime da Comunidade – IFMA

A maneira de agir de todas a comunidade islâmica é entendida como uma manifestação indirecta da presença da Alá. Mas só a comunidade peninsular, que corresponde à escola de Direito muçulmano existente na península – Maliquita.

2 – A ciência do Direito – FIGH

Esta ciência foi fundamental, não perdia o carácter religioso, mas adoptava os preceitos do Alcorão e da Summa à prática, através dos estudiosos do Direito (Alfakis) que usavam a analogia e o raciocínio lógico.

Atitude dos muçulmanos perante os cristãos:

Para os islâmicos havia 2 tipos de pessoas:

a) Pagãos – Não têm qualquer tipo de religião e para se manterem livres e vivos tinham que se converter.

b) Agentes do livro – Contem preceitos ou textos sagrados resultantes de revelações divinas anteriores a Maomé. Estas pessoas não precisavam de se converter ao islamismo. Assim, se pagassem um imposto podiam manter a sua religião - Mulçarabes

O território era então ocupado por:

1 – Muçulmanos

2 – Cristãos

3 - Muçarabes

Aquando da reconquista cristã, surgem os Mudjas, que é um fenómeno paralelo aos Muçarabes e que dividem a população da península.

Perguntas sobre a matéria

1 – Refira desde o período germânico até à formação do reino de Portugal (Sec. XII) qual era o sistema jurídico vigente na península ibérica (personalidade ou territorial)?

2 – Para as 4 épocas caracterize o Direito apelando às suas fontes?

3 – Quais os factores da romanização jurídica e suas consequências?

4 – Direito romano vulgar, processos de vulgarização?

História do Direito Português

I Período (da fundação da nacionalidade a 1248 …)

1- Característica básica:

a manutenção das fontes do Direito Leonês

a) Código visigótico

b) Leis emanadas nas cúrias e/ ou comícios de Leão, Coiança e Oviedo

c) O costume (mt. importante)

d) Cartas de Foral ou forais

Como surgiu o reino de Portugal

ó Ponto de vista político

Nos finais do Sec. XI chegavam à península D. Henrique e D. Raimundo (condes) para casarem com as filhas de D. Afonso VI

D. Raimundo ó D. Urraca (filha legitima)

Reino de Leão

D. Henrique ó D. Teresa (filha ilegítima)

Cedeu-lhes (outorgando-lhes)

O condado portucalense

Há 3 teses sobre a cedência do Condado Portucalense:

1 - A terra Portucalense foi o dote de D. Teresa e revestiu a natureza de senhoria hereditária (até ao Prof. Alexandre Herculano).

2 – Defende que se trata de um cargo temporário e revogável quando o monarca leonês desejasse – era pois uma cedência amovível (Prof. Alexandre Herculano)

3 – O Prof. Paulo Merêa defende dois aspectos:

a) Terá sido uma doação de senhorio

b) A titulo hereditário

Reconquista:

Características:

1 – Não há unidade jurídica, embora com alguma persistência do Direito visigótico;

2 – As leis monárquicas tiveram muito pouco significado;

3 – Os tribunais tiveram uma aplicação importante, porque esclareciam o Direito – Era no tribunal que a aplicação da Lei era feita, na resolução do caso;

4 – É um Direito essencialmente consuetudinário e foraleiro.

1º Período

Período de individualização do Direito Português

1) Iniciando-se com a fundação da nossa nacionalidade (1143 – ano em que o Papa aprovou o Reino) e terminando nos inícios do Reino de D. Afonso III (1248), pelo que ocupa-o cerca de um século.

2) Trata-se de um período da individualização no nosso Direito relativamente ao Direito leonês.

Com efeito, tendo Portugal nascido de um desmembramento do Reino de Leão e Castela, é natural que nos primórdios da formação do nosso Direito, sejamos muito tributários do jurídico próprio desse Reino.

Compreende-se, assim, que o conjunto de fontes de Direito Português, neste período, tenha sido herdado do referido Reino Espanhol (Leão) e que à medida que o Direito Português vai avançando no tempo se afirma cada vez mais autónomo no contexto jurídico peninsular.

3) Enunciação das fontes de Direito leonês que persistem após a fundação da nossa nacionalidade e dividem-se em 3 categorias:

a) Direito Legislado

b) Direito Outorgado

c) Direito Consuetudinário

a) Direito legislado:

a.1) Código visigótico – Fonte de Direito visigótico, que se manteve durante todo o Sec. XII e tinha uma aplicação territorial e era muito importante porque fazia a unificação do Direito durante a reconquista. Começando a rarear no Sec. XIII, com o aparecimento do Direito Local e o Direito de inspiração Romano-canónica.

a.2) Leis emanadas nas cúrias e/ ou comícios (Consílios) das cidades espanholas de Leão (1017), Coiança (1055) e Oviedo (1115), destas cúrias saíram um conjunto de Leis que transitaram para o Direito Português.

As cúrias, eram Assembleias com um carácter político constituindo uma organização auxiliar do Rei e sendo a origem das futuras cortes, onde os representantes das diversas classes poderiam pôr Assentos à discussão (tinham carácter político) - enquanto que, os concílios eram reuniões de natureza eclesiástica.

b) Direitos Outorgados ou pactuados

Têm na sua base um acordo, um pacto, entre a entidade outorgante e os destinatários.

b.1) Cartas de privilégio são diplomas que para uma dada comunidade criam uma disciplina jurídica própria, mais favorável do que a comum.

b.1.1) Forais ou Cartas de Foral, são a primeira fonte de Direito local e são também essencialmente fontes de Direito público, podem ser outorgadas por reis, Clero e nobreza leoneses a uma dada localidade e que contêm normas que disciplinam as relações entre os habitantes, e entre os habitantes com a entidade outorgante – como por exemplo S. João da Pesqueira, Penalva, Paredes, Santarém

São fontes de carácter público, porque embora tendo um conteúdo e uma extensão variável normal, as matérias tratadas nos forais eram de Direito público.

Exemplo:

- Liberdade das pessoas que habitavam a terra;

- Tributação

- O modo de processar em tribunal (ónus da prova)

- A forma de tratar a terra, a quem ela pertencia, como era dividida.

Muitas vezes utilizava-se um foral, que já existia e aplicava-se a outras terras (localidades) – Família de forais (o foral de Salamanca).

c)Direito consuetudinário

Principal fonte de Direito privado.

Conceito: No costume abrangia-se tudo aquilo que não fosse Direito legislado, assim inclui-se no conceito, o costume (as práticas sociais) todo o tipo de sentenças (jurisprudência) e os pareceres dos juristas.

4) Com a progressiva individualização do Direito Português, relativamente ao Direito leonês, começavam a surgir fontes de Direito tipicamente portuguesas, que são designadamente as seguintes:

4.1 – O costume

4.2 – Cartas de Foral ou Forais, outorgadas por reis portugueses a terras portuguesas, como por exemplo, Stª. Maria da Feira

4.3 – Leis Gerais dos nossos monarcas, sendo de referir que o 1º conjunto de leis gerais portuguesas deve-se a D. Afonso II, que convocou uma reunião extraordinária da cúria, em Coimbra, no ano de 1211, da qual resultou esse conjunto de Leis Gerais Portuguesas, com forte influencia do Direito Romano Justinianeu.

5) (mt. import.) Atendendo às suas principais fontes de Direito, o Direito da nossa nacionalidade é caracterizado “como um Direito de base consuetudinária e foraleira”.

Com efeito, no domínio do Direito privado, a principal fonte foi o costume e no domínio do Direito público foram as Cartas de Foral.

5.1 – A razão, que justifica o grau de abundância de Cartas de Foral, é a enorme escassez de leis neste período da História do Direito Português, e prende-se com o objectivo sentido pelos nossos monarcas de consolidação do processo da reconquista cristã.

Com efeito, nem todos os muçulmanos haviam sido expulsos das terras peninsulares, pelo que, se temia uma reinvasão dessas mesmas terras.

A estratégia adoptada pelos nossos monarcas, para evitar essa reinvasão muçulmana, foi a de outorgarem Cartas de Foral, com o objectivo de seduzirem e fixarem as populações nas terras mais ermas (despovoadas), motivando-as ao seu cultivo, por se entender que uma terra habitada e cultivada é de muito mais difícil invasão que uma terra erma.

6) Análise da importância das Cartas de Foral, enquanto fonte de Direito Português, desde o período da fundação da nossa nacionalidade, até ao período da determinação da extinção destas fonte de Direito Portuguesa (Sec. XII/ Sec XIX).

6.1 – Os Forais, no período da fundação da nossa nacionalidade, pela razão que já foi mencionada, eram muito importantes, constituindo a mais importante fonte de Direito Português, no domínio do Direito público.

Por Carta de Foral, entende-se o documento outorgado pelo Rei, ou por um senhor laico ou eclesiástico, a uma determinada comunidade (e nunca a um sujeito ou grupo de sujeitos especificados), com vista à regulamentação de um certo tipo de relações dos membros da comunidade entre si e com a entidade outorgante.

Os Forais são uma fonte de Direito que pertencem a uma outra mais ampla chamada Cartas de Privilégio, onde também se incluem, por exemplo as Cartas de Povoação (idêntica às Cartas Foral, o que as distingue é a preocupação de povoar e iam sendo concedidas à medida que as terras iam sendo conquistadas), as Cartas de Feira (Documentos que permitiam a realização de feiras numa dada localidade – era criada com intuito comercial) e as Cartas de Franquia (Documento que existe no Direito Europeu mas são raras em Portugal. É uma forma de regulamentar as relações jurídicas entre os burgueses e os senhores feudais, em que estes permitem àqueles a ocupação das suas terras mediante uma pagamento de uma quantia).

Existiam também as Concórdias e concordatas que eram acordos celebrados entre o Estado e a igreja, em que ambas as partes se comprometem a reconhecer direitos e obrigações. Quando interviesse o Papa era uma concordata, quando só intervinha o Clero era uma Concórdia.

Os Forais nascem com uma enorme importância, na medida em que são os estatutos político-concelhios, que se que se encontram na base do surgimento da grande maioria das cidades e vilas portuguesas.

Quanto às matérias que disciplinavam, pertencem todas elas ao domínio do Direito público, com destaque para a questão do pagamento de impostos e a da prestação do serviço militar.

6.2 – Por volta dos finais do Sec. XIII, princípios do Sec. XIV, as populações começam nas cortes a queixarem-se, aos Reis dos Forais, invocando o seu carácter obsoleto (antiquado) e sobretudo, o facto de eles só se ocuparem com a questão do pagamento de impostos. É com base nestas queixas, que D. Manuel I, durante o seu reinado determina uma reforma de todos os Forais do Reino português. Com esta reforma, muitos dos Forais existentes desaparecem e os que se mantêm perdem a sua grande importância de estatutos politico-concelhios, para se converterem em diplomas apenas relativos ao pagamento de impostos.

6.3 – Iniciando-se com esta reforma o processo de decadência desta fonte de Direito Português. A sua extinção operar-se-á nos inícios do Sec. XIX, por determinação de Mouzinho da Silveira, que dentro de um projecto de melhoramento da agricultura portuguesa, considerou ou forais entraves a esse melhoramento, porque meramente preocupados com a questão do pagamento de impostos.

7) Análise da noção de costume no período da fundação da nossa nacionalidade e referencia a 3 manifestações de Jurisprudência obrigatória (de sentencas, com a natureza de precedentes vinculativos) existentes na história do nosso Direito.

No período da fundação da nossa nacionalidade, o costume, surge como a mais importante fonte de Direito privado e possui uma acepção mais ampla do que a que é frequente associar-se-lhe.

Com efeito, neste período, o costume abrangia todas as fontes de Direito, sem natureza legislativa, significa isto que, o costume abrangia também sentenças, designadamente as seguintes:

a) Sentenças da cúria régia ou costumes da corte.

b) Sentença de juízes municipais

c) Sentenças de juízes arbitrais ou alvidros, que eram aqueles que podiam ser escolhidos pelas partes envolvidas num litígio.

As sentenças destes últimos juízes referidos, distinguiam-se das demais pelas seguintes razões:

- Tratavam-se de decisões emanadas para a resolução de um litígio mas que tinham uma força jurídica que se estendia a outros litígios futuros, desde que, análogos (idênticos) a este primeiro. Eram, portanto, sentenças com a natureza de precedentes vinculativos e chamavam-se façanhas.

Mt. Imp: No Direito Português, à semelhança do que ocorre nos demais Direitos na família romano-germânica, e por oposição ao que sucede nos Direitos da família anglo-saxónica ou da Common law, a regra é de as sentenças judiciais terem uma força jurídica que se esgota no caso para o qual foram emanadas e a excepção é a de terem uma força jurídica que se mantém para além da resolução desse caso permitindo-lhes resolverem outros casos futuros, desde que, análogos a este primeiro. Contudo, ao longo da História do Direito Português, existiram 3 tipos de sentenças com natureza de precedentes vinculativos a constituírem, portanto, 3 manifestações de Jurisprudência obrigatória. Referimo-nos às façanhas, que surgem no período da individualização do nosso Direito, e que são o 1º tipo de jurisprudência obrigatória em Portugal, porque julgar por façanhas é julgar segundo um exemplo anterior, ou seja, o juiz está a aplicar a decisão que aplicou num caso similar. Aos estilos da corte, que surgem por volta do Sec. XV e que são sentenças emanadas pelos 2 tribunais supremos do Reino de Portugal (a Casa da Suplicação, que deu origem ao actual Supremo Tribunal de Justiça e a Casa do Cível, que deu origem ao actual Tribunal da Relação do Porto), e por fim os Assentos da Casa da Suplicação (estas decisões proferidas por este Tribunal tinham, contudo, uma particularidade que as distinguis das sentenças tout court (em sentido estrito) é que, ao contrario das sentenças judiciais que são emanadas para a resolução de um litigio, os Assentos eram proferidos quando existiam dúvidas quanto à interpretação de uma Lei).

Na actualidade, não existem no Direito Português qualquer sentença com natureza de precedentes vinculativos, posto que, graças ao Prof. Dr. Castanheira Neves, o Tribunal Constitucional decidiu declarar a inconstitucionalidade dos Assentos e, em consequência, proibi-los.

II Período – Período do Direito Português de inspiração romano-canónica (Sec. XIII – Sec. XVIII)

1 - Característica principal: É o período do Ius Commune ou Direito comum.

2 – Sub-divide-se em duas épocas:

1ª Época – Renascimento do Direito Romano Justinianeu

– e renovação do Direito canónico

2ª Época – Época das ordenações do Reino de Portugal

1ª Época

I) O Renascimento do Direito Romano Justinianeu

a) O Direito Romano Justinianeu

b) Renascimento: Sentido e alcance

c) Causas desse renascimento – as escolas de Direito que estudaram com uma intencionalidade prática, o CIC

1) Escola dos Glosadores

2) Escola dos Comentadores

3) Escola Hitórico-critica

4) Escola do Usus Modernus Pandectarum

1 – O período do Direito Português de inspiração romano-canónica, representa na História do nosso Direito, uma época verdadeiramente nuclear, porquanto, prolongando-se ao longo de 5 séculos, marca a evolução do nosso Direito, tendo por base ou como lastro jurídico subsistente o chamado Direito comum.

Num sentido amplo o Direito comum abrange 3 ordenamentos jurídicos:

- Ordenamento jurídico romano, canónico e o germânico.

Num sentido estrito e mais comummente utilizado reporta-se apenas ao Direito romano Justinianeu renascido e ao Direito canónico renovado.

Estes dois Direitos representam, portanto, a base sobre a qual se constrói o Direito Português, até finais do Sec. XVII princípios do Sec. XVIII, período em que o nosso Direito se afirma como um Direito próprio e de natureza estadual.

Sentido de renascimento

O fenómeno do renascimento do Direito Romano Justinianeu constitui na história da grande maioria dos Direitos continentais europeus um dos mais importantes processos para a formação desses Direitos. O mesmo se passando no contexto da História do Direito Português.

O Direito Romano Justinianeu, não teve nunca, por razões que se prendem, sobretudo, com a impreparação dos juristas, aplicação prática no Império romano do ocidente, onde, como se sabe, o Direito romano que vigorou foi o Direito romano vulgar.

Na parte oriental do Império, o Direito Romano Justinianeu, não teve também uma aplicação prática, por razões que talvez se tenham prendido pelo grau interno de complexidade e pela circunstância de os seus textos terem sido conservados nos centros de cultura eclesiástica, onde eram estudados como uma intervenção puramente especulativa.

Pode, portanto, a respeito deste Direito falar-se de uma espécie de adormecimento a que se põe termo, quando nos finais do Sec. XI, princípio do Sec. XII, na cidade Italiana de Bolonha, um jurista de nome Irnério, se propôs estudar os textos Justinianeus, numa versão completa e originária e com uma intencionalidade prática.

Inicia-se o processo de renascimento deste Direito, que deve entender-se como uma revitalização do interesse pelo estudo dos textos Justinianeus, com vista a deles extrair as soluções normativas necessárias para a resolução das controvérsias jurídicas.

Causas:

Quando se fala das causas do Renascimento do Direito Romano Justinianeu pretende aludir-se às várias escolas de Direito, que tendo por objectivo o estudo do CIC com uma intencionalidade prática, foram responsáveis pela revitalização do interesse que o modo jurídico passou a reconhecer ao Direito continuo nesta obra.

No início do fenómeno do renascimento encontra-se a Escolas dos Glosadores e Comentadores, mas para a consolidação deste renascimento contribuíram, decisivamente, a Escola Histórico-critica e a Escola do Uso Moderno.

Escola dos Glosadores

1 – Surge em Bolonha, nos finais do Sec. XI, princípios do Sec. XII como um pequeno centro de estudos em torno das lições do jurista Irnério (seu fundador), pelo que também se conhece por Escola Irneriana ou Escola Exegética.

A escola surge em 1088, o seu período de apogeu deve-se ao seu fundador Irnério, e manteve-se durante todo o Sec. XII. Nas primeiras décadas do Sec. XIII entra em declínio devido à exaustão do método.

O último contributo é dado por Acúrcio através da elaboração de uma obra - A Magna Glosa

2 – Objectivo – Esta Escola de Direito fundou-se, desenvolveu-se e evoluiu para uma verdadeira universidade com o objectivo claro de estudar os textos do CIC para os aplicar à prática social.

3 – Método de trabalho – O método utilizado pelo Glosadores para o estudo dos textos do CIC, foi o método da pura exegese (interpretação) textual, isto é, um método que consistia na interpretação textual ou literal dos referidos textos. Através deste método os juristas desta escola, procuravam entender o sentido dos textos Justinianeus, por referência exclusiva à sua letra, sendo embora certo, talvez este tenha sido o método possível para uma escola que inicia todo um longo processo de estudo da mais importante obra de Direito Romano. O certo é que este apego excessivo que os Glosadores tinham relativamente à letra dos textos Justinianeus, que consideravam uma espécie de textos intangível, significou a breve trecho a principal razão da decadência desta escola.

4 – Principais instrumentos de trabalho – Tendo em conta, que o método utilizado pelos Glosadores, foi a da pura exegese textual, compreende-se que o seu principal instrumento de trabalho tivesse sido a glosa. A qual consistia num pequeno esclarecimento interpretativo que inicialmente se reportava apenas a uma palavra do texto e era anotada entre as próprias linhas desse texto, falando-se então de glosas inter lineares e em seguida se apresentam como esclarecimentos mais extensos e completos referidos a um título ou parágrafo do texto e escrito na margem desse mesmo texto, falando-se então de glosas marginais.

5 – Por razões de ordem histórica e sobretudo didácticas, os Glosadores procederam a uma sistematização interna do CIC que não respeitou a originária.

Com efeito, na sua versão originária o CIC encontrava-se dividido em 4 grandes partes:

- As Institutiones, o Digesto, o Codex e as Novellae.

Ora, a sistematização adoptada pelo Glosadores foi a seguinte:

- Partindo dos 50 livros que compunha o Digesto os Glosadores criaram 3 grandes partes a que chamavam:

a) Digesto velho, que abrangia os primeiros 23 livros do Digesto e os 2 primeiros títulos do livro 24.

b) Digesto esforçado, que abrangia o livro 24 ao livro 38 do Digesto.

c) Digesto novo, que incluía os demais livros do Digesto (39 ao 50).

Em seguida, utilizando os 12 livros que compunham o Codex e as Institutiones, os Glosadores acrescentaram a estas 3 partes mais 2.

d) Codex, que incluía os 9 primeiros livros do Codex.

e) Volume pequeno ou autêntico, que incluía os 3 últimos livros do Codex, bem como as Institutiones e ainda uma colectânea chamada Autenticum.

6 – Decadência e mérito da escola nutrindo como já se afirmou um respeito quase que sagrado em relação aos textos do CIC, os Glosadores ao proporem-se estuda-lo cingiram-se à pura exegese textual, nunca se tendo, portanto, desprendido da letra do texto e, em consequência, não tendo construído nada de novo. A isto acresce que, sendo puros exegetas do texto, os Glosadores demonstravam claras deficiências aos domínios histórico-etimológico, pelo que não conhecendo, com rigor as circunstancias em que as normas do Direito Romano Justinianeu haviam sido elaboradas, tal conduziu a que estes juristas tivessem sustentado interpretações incorrectas dessas normas e, inclusive, a manifestação de algumas dotadas de notório carácter obsoleto.

7 - O grande mérito desta escola foi, sem dúvida, o de terem sido os primeiros juristas a proporem-se estudar os textos Justinianeus, com uma intencionalidade prática, ao que acresce que, como resultado desse estudo os Glosadores transformaram o conjunto diversificado de normas do CIC, num todo unitário e sistematizado, sendo assim, responsáveis pela criação da primeira dogmática jurídica autónoma da história universal.

8 – A figura de Acúrcio – Paradoxalmente é no período de decadência desta escola que surgiu o segundo mais importante Glosador de que há conhecimento, chamava-se Acúrcio e notabilizou-se por ter elaborado uma obra onde compilou, ordenou e sistematizou todas as glosas realizadas nos períodos anteriores a si. Esta obra a que se chama Magna Glosa de Acúrcio, passou a acompanhar uma cópia do CIC, presente em todos os Tribunais europeus e entre nós desde a promulgação das ordenações Afonsinas até ás reformas Pombalinas, teve o estatuto de fonte subsidiária do Direito Português.

Como chega até nós este Direito discutido em Itália?

1 – Intercambio de estudantes entre os diferentes países da Europa e de Bolonha.

2 – Fundação de universidades

Escola dos Comentadores

1 – A transição da escola dos Glosadores para a dos Comentadores realiza-se através do conjunto de juristas que se seguiram a Acúrcio – os chamados pós-acurcianos, tendo surgido em França, é contudo em Itália que esta nova escola se implementa e desenvolve entre os inícios do Sec. XIV e meados do Sec. XV. Também conhecida como Escola Bartolista.

Foram essencialmente dois os factores que explicam o surgimento desta nova escola e da nova metodologia, por ela defendida para o estudo do CIC.

a) Prende-se com a decadência da escola do Glosadores devido, sobretudo, ás insuficiências do seu método de trabalho e o segundo diz respeito ao prestígio que o método dialéctico havia adquirido durante o Sec. XIII, quando aplicado ao estudo da teologia e da filosofia, o que claramente incentivou a sua transposição para o domínio do estudo do Direito.

2 – Método de trabalho desta escola, na sequência do que se acaba de dizer, compreende-se que os Comentadores ao proporem-se estudar os textos Justinianeus, tentando utilizar o chamado método dialéctico, que se sustentava em duas premissas fundamentais:

- A primeira consistia na utilização da retórica argumentativa, ou da chamada arte de argumentar, como método de investigação científica e a segunda traduzia-se em, associar esta dialéctica ao pensamento aristotélico utilizando, então, como máxima o postulado básico desse pensamento – “tese – antítese – síntese

3 – Instrumento de trabalho – O comentário

4 – Mérito desta escola – Ao contrário dos Glosadores, que considerando o CIC um texto intangível, em nada renovaram, remetendo-se a uma atitude de puros exegetas da letras desses textos, os Comentadores adoptaram uma atitude muito diversa no estudo desta obra, usando sistematicamente o método escolástico e dialéctico, afastando-se progressivamente da letra do texto e adoptando, inclusivamente, o recurso a outras fontes de Direito para o estudo destes textos Justinianeus.

Os Comentadores contribuíram para o avanço da ciência jurídica, bem como, para uma maior conformidade às exigências práticas da época em que viveram.

A eles se deve, portanto, desde logo, a criação de alguns conceitos e figuras jurídicas em matérias que não tinham forte tradição humanística como é o caso do Direito Comercial; Direito Marítimo, Direito Internacional Privado e, inclusive, do Direito Penal.

5 – Declínio da escola – Ao longo da 2ª metade de Sec. XV, inicia-se o processo de declínio desta escola.

Com efeito, a breve trecho, e tal como aconteceram com os Glosadores, os Comentadores perdem o seu génio criativo e, ao invés de fazerem comentários dos textos Justinianeus, fazem comentários de outros comentários. Tal conduz a um emprego rotineiro do método escolástico e à consequente repetição de autores, de argumentos, tendo como corolário o uso abusivo do princípio da autoridade.

Com efeito, nesta fase de decadência, os Comentadores a propósitos das diversas questões jurídicas limitaram-se a enunciar os argumentos favoráveis e desfavoráveis e a lista dos respectivos autores, afastando em seguida os autores menos conceituados e optando pela posição dos mais conceituados.

Cria-se, então, a chamada opinião comum dos Doutores, que passa a ser o sustentáculo de todo o modo de entendimento das questões jurídicas no contexto desta escola de Direito.

Entre nós, e à semelhança do que sucedeu com a Magna Glosa de Acúrcio, a opinião comum dos Doutores, após as promulgações Manuelinas, ganha o estatuto de fonte subsidiária de Direito Português, que conserva até ao período das reformas pombalinas.

Escola Histórico-Critica

Esta Escola surge em Itália, no Sec. XVI, no período chamado do Humanismo Jurídico, o qual corresponde à fase do renascimento, ou também chamado período do Humanismo Renascentista (Humanismo – pela colocação do homem no centro do mundo. O homem é o objecto principal do estudo; Renascentista – período de renovação cientifico-literária que procura seguir os modelos da antiguidade clássica (grega e romana) e juntando as duas o objecto do saber era o homem através da cultura greco-romana).

Neste contexto entende-se que os juristas desta escola compreendam o Direito romano como uma manifestação da cultura clássica, o que tem como importante consequência, o facto destes juristas terem sido os primeiros a procurar nos textos Justinianeus as suas interpolações, ou seja, a proceder a um livre e crítico exame desses textos.

Surgindo em Itália, é contudo em França, na Universidade Bourges, que esta escola atingiu o seu esplendor, destacando-se aqui, o jurista Alciato.

Quanto à metodologia utilizada no estudo dos textos Justinianeus, confluem duas correntes essenciais, a primeira defensora de um estudo filológico-crítico dos textos Justinianeus e uma segunda defensora da autonomia do intérprete da exegese desses textos (numa atitude de clara rejeição do princípio da autoridade que os comentadores utilizavam abusivamente e que deu origem à chamada Opinião Comum dos Doutores).

O principal jurista desta escola foi Cujácio e a sua obra apresenta uma vasta exegese filológico-histórica dos textos Justinianeus.

Por isso, a escola em causa também é conhecida por Escola Cujaciana, ou Escola dos Juristas cultos ou Jurisconsultos Humanistas.

Esta escola vai alterar vários aspectos do ponto de vista da escola anterior que são os seguintes:

1 – O Direito romano passa a ser um dos objectivos e não o objecto do estudo.

2 – Estuda-se criticamente toda a cultura clássica que vai ser um dos postulados principais, isto é, havia uma liberdade crítica no exame das fontes do Direito romano.

Na medida em que, a metodologia do estudo dos textos Justinianeus, adoptada por esta escola, se distancia, claramente, da que é própria dos Comentadores, um pouco por toda a Europa, desenvolvendo-se, quanto ao método a adoptar no ensino universitário do Direito uma querela (alteração) entre estes dois métodos. O método bartolista, porque proveniente de Itália designava-se por Mós Itálicos, e o método histórico-crítico, porque desenvolvido em França, designava-se de Mós Gálicos.

Embora algumas universidades europeias, entre as quais as nossas, tenham manifestado uma certa abertura às ideias da Escola Histórico-Crítica, o certo é que nesta querela acabou por prevalecer o Mós Itálicos, que o mesmo é dizer, continuou a ser adoptado, nas universidades europeias, o método bartolista.

Em Portugal, houveram alguns seguidores do Mós Gálicos – Os Civilistas; Canonistas e os estudiosos do Direito Pátrio.

Entre nós, este método será substituído por um totalmente diferente aquando as reformas pombalinas.

Escola do Uso Moderno ou do Usus Modernos Pandectarum

Surge na Alemanha, no Sec. XVIII e o seu principal representante foi Samuel Stryk.

A metodologia adoptada, por esta escola, no estudo do Direito romano Justinianeu consistia em analisar os textos Justinianeus para determinar quais as normas que deveriam considerar-se obsoletas e quais aquelas que ainda eram susceptíveis de uso moderno.

Afirmar-se que uma norma é susceptível de uso moderno, tinha o seguinte significado, que o período em questão é juridicamente dominado pelo Jusnaturalismo racionalista, cujo postulado básico consistia em afirmar a existência do chamado Direito natural.

O Direito natural era um Direito ideal, na medida em que não se encontrava mergulhado no universo da prática social, era constituído por um conjunto de princípios imutáveis inerentes à própria condição da pessoa humana e aferidos através da razão.

Ao que acaba de dizer-se, acresce que o Sec. XVIII foi também o Sec. da afirmação por excelência dos Direitos Pátrios, que o mesmo é dizer, autonomização total dos vários Direitos europeus relativamente ao Direito comum, afirmando-se como Direitos de natureza estadual.

Neste contexto assim definido, entende-se que para os juristas desta escola uma norma de Direito romano Justinianeu era susceptível de uso moderno, se fosse conforme aos princípios do Direito natural racionalista e no Direito pátrio, ou seja, vai-se apenas aplicar o Direito quando aquele for susceptível de possíveis questões sociais vigentes naquela altura.

Entre nós, e as ideias preconizadas por esta escola, influenciaram, decisivamente, a utilização do Direito romano, a partir das reformas pombalinas.

O grande transmissor destas ideias, no nosso país, foi Luís António Vernei, conhecido, entre outros, como um estrangeirado e responsável, com esses outros homens, pela evolução significativa do saber em Portugal, no período em questão.

Renovação do Direito Canónico

1 – Noção de Direito Canónico

2 – Tipo de norma jurídico-canónicas

3 – Fontes de Direito Canónico

4 – O Direito Canónico desde o seu surgimento até ao período da sua renovação – Sec. XII

5 – As causas da renovação do Direito Canónico

6 – O Corpus Iuris Canonicis: Breve alusão ao conjunto de colectâneas que o integram.

1 – Noção de Direito Canónico

Por Direito Canónico deve entender-se o conjunto das normas jurídicas que disciplinam as matérias da competência da igreja católica.

2 – Tipo de norma jurídico-canónicas

As normas jurídicas canónicas, em sentido amplo, designam-se por Cânones, contudo à que proceder às seguintes distinções:

- Os Cânones, em sentido estrito, são as normas resultantes dos concílios ecuménicos (gerais) e a parte destas existem os Decretos ou Decretais, que são as normas da directa iniciativa do Papa.

3 – Fontes de Direito Canónico

A expressão Fontes de Direito é aqui entendida com o seguinte sentido:

- Origem e modo de formação das normas jurídico-canónicas e classificam-se em 2 tipos:

- Fontes de Direito divino

- Fontes de Direito Humano

As primeiras são a Sagrada Escritura (Antigo e novo testamento) e a Tradição, isto é, a obra dos Santos Padres. Quanto às segundas, que se desenvolvem, sobretudo, a partir do Sec. IV d.C. há de mencionar as seguintes:

a) Normas emanadas pelos Pontífices romanos, como por exemplo a Bula Papal,
Decretos ou Decretais.

b) Cânones dos concílios ecuménicos.

c) Diplomas de entidades eclesiásticas, como por exemplo os Bispos

d) Concordâncias ou Concordatas

e) Doutrina, ou seja, a obra científica dos Canonistas.

f) Jurisprudência, ou seja, o conjunto das sentenças da jurisdição eclesiástica.

g) Normas civis canonizadas, ou seja, normas de Direito Civil que a igreja reconhece e aplica.

4 – O Direito Canónico desde o seu surgimento até ao período da sua renovação – Sec. XII

Num período inicial que poderá dizer-se ir até ao Sec. IV a VI d.C., o Direito Canónico resultava, exclusivamente, das fontes de Direito Divino, sendo, portanto, de reduzido número, as normas jurídicas canónicas. A partir do Sec. IV, em diante, aumenta a produção destas normas porque ganham particular importância, as Fontes de Direito Humano.

O crescente número de normas jurídicas canónicas implica a elaboração de colectâneas que as compilassem.

Quanto a estas colectâneas são, inicialmente, dotadas de um pequeno grau de perfeição interno, e de entre elas podem destacar-se as seguintes:

- A Capitula de Martini – Ano 563 e de autoria de S. Martinho de Dume.

- A Collectio hispana – 633, mandada elaborar após o concilio de Toledo.

A este Direito Canónico produzido até ao Sec XII convencionou chamar-se Ius Canonicis Vetos, porque no Sec. referido assiste-se a uma renovação de grande importância deste Direito.

Renovação porque o Direito canónico nunca deixou de evoluir.

5 – As causas da renovação do Direito Canónico

As causas da renovação do Direito Canónico, a partir do Sec. XII, fala-se do Direito Canónico novo, encontram-se directamente relacionadas entre si. Com efeito, a crescente produção de normas de Direito Canónico exigia a elaboração de colectâneas cada vez mais perfeitas, que compilassem essas normas e por seu turno o surgimento dessas colectâneas provocou uma reelaboração e um avanço significativo da ciência jurídica do Direito Canónico.

Os factores que acabamos de mencionar, foram responsáveis pela progressão notável que se verificou, no âmbito deste Direito, a partir do Sec. XII.

6 – O Corpus Iuris Canonicis: Breve alusão ao conjunto de colectâneas que o integram.

Análise dos colectâneas de Direito Canónico elaboradas após o Sec. XII e que vieram a integrar a mais importante obra deste Direito, denominada de Corpus Iuris Canonicis por Gregório XIII, no ano de 1580. Esta designação é alterada em 1917, por Bento XV para Codex Iuris Canonicis:

a) Decreto de Graciano, Trata-se de uma colectânea de índole privada elaborada por iniciativa de João Graciano, Monge e Prof. na Universidade de Bolonha no ano de 1140. O objectivo terá sido o de coordenar e sistematizar as normas de Direito Canónico existentes e de afirmar a autonomia do Direito Canónico em relação à teologia, devido ao seu grau externo de perfeição. Esta colectânea, não obstante de ter sido de índole privada difundiu-se com a Lei Geral da Igreja e foi objecto particular de estudo, por parte de alguns canonistas que tomaram o nome de Decretistas.

b) Decretais de Gregório IX, é já uma colectânea de índole oficial, mandada organizar por Gregório IX a São Raimundo de PeñaFort e promulgada em 1234. São colectâneas de normas jurídicas canónicas papais que foram elaboradas após o Decreto de Graciano e incluía o Direito Canónico novo, dividindo-se em 5 livros.

Muito importante: A relação existente no âmbito de Direito Canónico entre o Decreto de Graciano e as Decretais de Gregório IX equivale àquela que no âmbito do Direito Romano existe entre o Digesto e o Codex. Com efeito, tal como no Digesto, encontramos compilado o Ius Romanum Vetos, também o Decreto de Graciano contém o Direito antigo da Igreja, do mesmo modo, tal como o Codex inclui o Ius Romanum Novum as Decretais de Gregório IX, contêm o Direito novo da Igreja.

c) Livro Sexto de Bonifácio VIII, é uma colectânea que agrupa todas as Epístulas pontifícias posteriores aos Decretais, tendo sido elaboradas por Bonifácio VIII em 1298 como um complemento das Decretais de Gregório IX. Ora, na medida em que as Decretais integravam 5 Livros e esta colectânea surge como seu complemento é natural que se tenha chamado Livro Sexto.

d) As Clementinas, elaboradas, após o Concílio de Viena de 1311, a mando do Papa Clemente V, a morte deste Papa conduziu a que esta colectânea só fosse aprovada em 1317 pelo Papa João XXII.

e) Extravagantes de João XXII e Extravagantes Comuns. Por Direito extravagante deve entender-se, aquele conjunto de normas que não se encontram organizadas em colectâneas de índole oficial.

Quando no ano de 1500 se decidiu editar o Decreto de Graciano, as Decretais de Gregório IX, o Livro Sexto de Bonifácio VIII e as Clementinas, o editor atendendo às normas extravagantes existentes acrescentou às 4 anteriores colectâneas duas outras que são assim de índole privada. Referimo-nos às Extravagantes de João XXII, que contêm Decretais posteriores a 1317, ou seja, posteriores às Clementinas e às Extravagantes Comuns que contêm Decretais dos Papas posteriores.

Corpus Iuris Canonicis tem uma importância fundamental porque vigorou até ao Sec XX, ou seja, até ao primeiro Cod. De Direito Canónico.

2ª Época

Época das ordenações do Reino de Portugal

1) Breve alusão a alguns aspectos concernentes às 3 ordenações do Reino de Portugal.

2) Analise detalhada do conjunto de fontes de Direito Português, fixadas pela primeira vez na História do nosso Direito, com rigor e precisão pelo Legislador das Ordenações Afonsinas.

2.1) Classificação dessas fontes em:

Fontes Primárias ou imediatas

Fontes Secundárias ou subsidiárias

2.2) Análise das fontes primárias ou imediatas.

2.3) Análise das fontes secundárias ou subsidiárias e dos critérios indicados pelos Legislador para a sua utilização em Tribunal.

2.4) Alterações introduzidas pelas Ordenações Manuelinas no quadro das fontes subsidiárias.

2.5) Alterações introduzidas pelas Ordenações Manuelinas no tocante à fonte imediata do Costume.

1) Breve alusão a alguns aspectos concernentes às 3 ordenações do Reino de Portugal.

As ordenações do Reino de Portugal, representam na História do nosso Direito as primeiras colectâneas de carácter oficial porque foram mandadas elaboradas e promulgadas pelos nossos Monarcas. Convém referir que, em nada se assemelham aos actuais códigos.

Com efeito, o movimento codificador, quer europeu quer português situa-se nos finais do Sec. XVIII princípios do Sec. XIX e no caso do português é uma consequência directa da Revolução liberal de 1820.

Um código representa uma compilação que reúne de forma detalhada e exaustiva as normas jurídicas relativas a um só ramo de Direito, pelo contrário as Ordenações representavam compilações de normas jurídicas relativas a várias matérias e concernentes a vários âmbitos ou domínios do Direito.

Foram 3 as Ordenações do Reino de Portugal:

a) Ordenações Afonsinas

Estas foram elaboradas devido aos pedidos insistentes, feitos nas Cortes, pela criação de uma colectânea de normas que compilassem e organizassem o Direito português vigente nesse período, contribuindo para uma maior certeza e segurança jurídica.

O início da sua feitura situa-se no reinado de D. João I, mas promulga-se pelo D. Duarte e pela regência do Infante D. Pedro (regente durante a menoridade do Rei D. Afonso V). É durante o reinando de D. Afonso V que, por alvará de Julho de 1446 se promulgam as Ordenações Afonsinas.

Sendo que, logo no ano de 1505 se iniciam os trabalhos que vão conduzir a sua reforma e substituição pelas Ordenações Manuelinas.

Tendo sido as primeiras Ordenações do Reino de Portugal representam um marco de importância verdadeiramente essencial na História do nosso Direito. Posto que contribuíram para a organização do sistema jurídico vigente na época e iniciaram o importante processo de autonomização do Direito português que se afirmou como um Direito próprio em relação ao Direito comum, visto que o Legislador das Ordenações Afonsinas, ao regulamentar a matéria concernente às fontes de Direito português vai classificar as normas de Direito Romano Justinianeu renascido e de Direito Canónico renovado como fontes subsidiárias do nosso Direito.

b) Ordenações Manuelinas

Tendo-se iniciado a sua feitura no ano de 1505, só serão promulgadas em 1521, data da morte de D. Manuel.

Relativamente às Ordenações Afonsinas representam algum avanço jurídico, sobretudo quanto às alterações que introduzem no quadro das fontes de Direito subsidiário fixadas pelo Legislador Afonsino, bem como, quanto à consideração do costume como fonte imediata de Direito português.

c) Ordenações Filipinas

Estas Ordenações foram elaboradas no período de governação dos Filipes, reis de Espanha. Período este que se caracteriza por uma grande instabilidade social, devido aos descontentamento generalizado por não sermos governados por um rei português.

O que acaba de dizer-se, justifica que, quando D. Filipe I manda elaborar estas Ordenações, que serão promulgadas por D. Filipe II, ano de 1603, o faça num espírito de total respeito pelas instituições e pela tradição jurídicas portuguesas. Sendo assim, compreende-se que estas Ordenações pouco ou nada tenham trazido de novo relativamente às anteriores, sendo consideradas como uma mera versão actualizada das Ordenações Manuelinas.

Promulgadas no ano de 1603, e ainda que alteradas em muitos aspectos por legislação extravagante, o certo é que estas Ordenações só foram totalmente revogadas aquando da entrada em vigor do 1º Cod. Civil Português, ano de 1867.

2) Analise detalhada do conjunto de fontes de Direito Português, fixadas pela primeira vez na História do nosso Direito, com rigor e precisão pelo Legislador das Ordenações Afonsinas.

Introdução:

Até à entrada em vigor das Ordenações Afonsinas vivia-se, em Portugal, uma situação de grave insegurança jurídica, posto que, não havendo um quadro rigoroso estabelecido das fontes do nosso Direito, sucedia que, pelos vários Tribunais espalhados por Portugal, à impreparação jurídica dos nossos Juízes, acrescentava-se o facto de estes utilizarem, mas suas sentenças, as mais diversas fonte de Direito.

Assim alguns Juízes recorriam a normas de Cod. Visigótico, outros utilizavam colectâneas de Direito Espanhol, traduzidas para português, e a grande maior parte deles serviam-se das traduções imperfeitas das obras de Direito Romano.

Esta situação de extrema gravidade é tomada em linha de conta pelo Legislador das Ordenações Afonsinas que será o 1º, na História do nosso Direito, a fixar com total rigor e precisão, hierarquizando-as e indicando, inclusive, os critérios para a sua utilização, as fontes do nosso Direito.

2.1) Classificação dessas fontes em:

Fontes Primárias ou imediatas

Fontes Secundárias ou subsidiárias

Ao abordar esta matéria, o Legislador das Ordenações Afonsinas, classificou as fontes do nosso Direito em 2 grandes grupos:

I) Fontes imediatas ou primárias, que seriam aquelas a que o Juiz deveria recorrer de modo imediato para procurar uma solução para o litígio submetido à sua apreciação.

II) Fontes subsidiárias ou secundárias, que seriam aquelas que o Juiz apenas utilizaria quando não encontrasse solução para o litígio nas fontes primárias ou imediatas do Direito Português.

Sempre que, ocorre esta situação, isto é, sempre que para resolver o litígio submetido à sua apreciação, o Juiz não encontrasse solução nas fontes primárias ou imediatas de Direito português, então estar-se-ia perante um caso omisso ou perante uma lacuna da Lei.

Na medida em que, o Juiz, tal como na actualidade (ver Artº. 8º Cod. Civil) se encontrava proibido de invocar a falta de lei para não julgar o litígio, que o mesmo é dizer, se encontrava proibido da pronúncia Non Liquet, então tornava-se necessário que ele procedesse à integração dessa lacuna.

Ao contrário do que sucede na actualidade, em que a integração das lacunas do Direito português, tal como plasmado no Artº. 10º do Cod. Civil, é feita dentro do próprio sistema jurídico (fala-se de integração intra sistemática), no período em questão, e por razões que se prendem com a natureza ainda incipiente (novas) do nosso Direito e a tendência para recorrer a Direitos estrangeiros, a integração das lacunas realizava-se mediante o recurso às chamadas fontes de Direito subsidiário (falava-se, então, de integração extra sistemática).

O Direito subsidiário, pode definir-se como, um conjunto de normas que são utilizadas sempre a um litígio submetido à apreciação de um Tribunal não encontre norma regulamentadora nas fontes imediatas, e que consubstanciam uma situação de lacuna ou caso omisso.

Cumpre acrescentar que, o Direito subsidiário tinha sempre natureza de Direito estrangeiro e esta situação manteve-se até à entrada em vigor do nosso 1º Cod. Civil, porque a forma de integração das lacunas do Direito português, tal como plasmado no Artº. 10º do Cod. Civil, tem a sua origem no nosso 1º Cod. Civil.

A problemática do Direito subsidiário, que o mesmo é dizer, a questão da integração das lacunas do Direito português, obedeceu, ao longo da história do nosso Direito, a 2 perspectivas racionalmente opostas – a primeira a que chamamos perspectiva tradicional, que se inicia com a promulgação, em 1446, das Ordenações Afonsinas, e que se entende até à publicação do nosso 1º código civil no ano de 1867. Nesta perspectiva, e por razões que se prendem, quer com uma certa insuficiência do nosso sistema jurídico, quer sobretudo com a predominância do Direito comum, a integração das lacunas fazia-se por recurso à norma de Direito estrangeiro. Era portanto uma integração extra-sistemática.

A segunda perspectiva desta problemática é a que se encontra plasmada no Artº. 10º do Cod. Civil, o qual remonta ao nosso 1º Cod. Civil, de 1867 e por força da qual a integração das lacunas do Direito português é sempre inter-sistemática, porque, ou o Juiz encontra um norma de Direito português que resolve um caso análogo ao caso omisso ou, o Juiz, invocando os princípios que fundamentam o sistema jurídico português, cria, ele próprio, a norma para regulamentar o caso omisso, não sendo portanto, admissível o recurso a normas de uma qualquer ordem jurídica estrangeira para integrar lacunas do Ordenamento jurídico português.

2.2) Análise das fontes primárias ou imediatas do Direito Português nas Ordenações do Reino de Portugal.

Fontes imediatas ou primárias

1 – Leis gerais emanadas pelos nossos monarcas

Antiguidade de pelo menos 10 anos

2 - Jurisprudência – Estilos da Corte Conformidade com a Lei

Introduzidas por pelo menos 2 actos do
Trib. Superior

Conforme a Lei

3 – Costume Para além da Lei

Contrária à Lei

Em 1446, quando D. João V manda promulgar as Ordenações Afonsinas, surge pela primeira vez, na história do nosso Direito, tratado com rigor e perfeição, o problema nas nossas fontes de Direito. O Legislador afonsino classificou estas fontes em imediatas ou primárias e subsidiárias ou secundárias.

As primeiras, como o próprio nome indica, eram aquelas a que os Juízes deveriam recorrer imediatamente ou em primeiro lugar, para solucionar o litígio submetido à sua apreciação. Tais fontes eram as seguintes:

a) Leis Gerais emanadas pelos nossos monarcas – Com efeito, a partir de meados do Sec. XIII, os nossos Reis começaram a exercer o poder legislativo, emanando uma série de normas de natureza legal, que assumiam, consoante as suas características, uma determinada classificação, sendo que as Leis Gerais se transformaram no principal modo de criação do Direito português.

b) Jurisprudência – Contudo não era toda a jurisprudência que funcionava como fonte imediata ou primária, mas tão só a jurisprudência constante e uniforme dos Tribunais Superiores, com destaque para a Casa da Suplicação. Essa jurisprudência era constituída por sentenças que se chamavam Estilos da Corte. Sendo que, para serem utilizadas em Tribunais como fonte primária ou imediata os Estilos da Corte, tinham de reunir, cumulativamente, 3 requisitos, isto é, tinham de ser conformes à Lei, tinham de ter uma antiguidade de pelo menos 10 anos e tinham de ter sido introduzidas por 2 sentenças de Tribunal Superior.

c) Costume – Quando deparamos com o costume como fonte imediata ou primária do nosso Direito, tal não pode deixar de causar alguma perplexidade, porquanto, esta fonte de Direito entra em fraca decadência a partir de meados do Sec. XIII sendo que, o Legislador Afonsino, a recupera ao dar-lhe estatuto de fonte imediata ou primária de Direito português. Ao que acaba de dizer-se acresce que, o costume era admitido, quer fosse conforme a Lei; para além da Lei e até mesmo contrário à Lei, desde que reunisse os seguintes requisitos: - O requisito da antiguidade, que era de 10 anos para o costume conforme e para além da Lei e de 40 anos para o costume contra a Lei e o requisito de nº de actos necessários para provar a existência do costume que a doutrina acabou por fixar em dois actos de natureza judicial.

Cumpre ainda acrescentar que, nas Ordenações Afonsinas, ao referir-se ao costume, o Legislador usava a seguinte expressão: “Costumes do Reino de Portugal antigamente usados” o que deixava pressupor a validade apenas dos costumes gerais (tal será alterado nas Ordenações Manuelinas).

2.3) Análise das fontes secundárias ou subsidiárias e dos critérios indicados pelos Legislador para a sua utilização em Tribunal, sempre que o Juiz não encontrasse solução nas fontes imediatas acabadas de referir, tal traduzia uma situação de lacuna do Direito português, que por força de o Juiz não poder abster-se de julgar, mesmo invocando falta de Lei, tinha de ser integrada com recurso a uma das seguintes fontes subsidiárias.

Fontes Subsidiárias ou secundárias

1 – Direito Comum, ou seja, normas de Direito Romano Justinianeu Renascido

e de Direito Canónico renovado

* Opinião comum dos Doutores

2 – Magna glosa de Acurcio (Esc. Glosadores)

3 – Comentários de Bartolo (Esc. Comentadores)

4 – A consula ao Rei que emanaria as Resuloções Régias

Quanto à primeira fonte de Direito subsidiário, a circunstancia de o Legislador ter colocado ao mesmo nível de paridade normas de 2 Ordenamentos juridicos distintos, levantava-se a questão de saber como utilizar estas normas. A este propósito o Legislador Afonsino foi exemplar fixando os seguintes critérios: - Para a utilização do Direito Romano Justinianeu Renascido e do Direito Canónico Renovado, o critério regra, consistia em separar os litígios consoante tivessem natureza temporal ou espiritual, sendo que, aos primeiros aplicava-se normas de Direito Romano Justinianeu Renascido e aos segundos normas de Direito Canónico Renovado. Contudo, e como manifestação de preponderancia do elemento religioso da sociedade da época, este critério regra comportava uma excepção, que consistia no seguinte: - Sempre que da aplicação das normas de Direito Romano Justinianeu Renascido, resultasse com ofensa intolerável aos princípios da Igreja Católica, deveria afastar-se essa aplicação e em seu lugar aplicar-se-ia Direito Canónico, era o chamado critério do pecado.

Para ilustrar o modo como o critério do pecado funcionava, o Legislador Afonsino deu o seguinte exemplo:

- Sobre todas as coisas, móveis e imóveis recaem Direitos reais, é o Direito de propriedade que confere ao seu titular todos os poderes de disposição e administração da coisa, incluindo, portanto o poder à sua posse. Contudo, pode suceder que a propriedade de uma coisa pretença a um sujeito e a sua posse a um outro. Sendo que, a posse tanto se adquire de boa-fé como de má-fé. Com o objectivo de proteger o possuidor e penalizar o proprietário que descura da coisa, foi criado um instituto da Uso Capião, por força do qual, desde que observados certos requisitos, o possuidor adquire o Direito de propriedade sobre a coisa.

Ora, para o Direito Romano esses requisitos eram o da posse ininterrupta pelo prazo de 40 anos e depois o da sua aquisição de boa ou má-fé. Ora, como se compreende o Direito Canónico não podia admitir que se atribuisse a propriedade a um possuidor de má-fé, pelo que, se surgisse um litígio deste tipo, perante um Tribunal português, ainda que se trata-se de uma questão temporal não se podia aplicar o Direito romano (se a posse tivesse sido adquirida de má-fé), devendo aplicar-se o Direito Canónico devido ao critério do pecado.

2.4 e 2.5) Alterações introduzidas pelas Ordenações Manuelinas no quadro das fontes imediatas e das fontes subsidiárias, tal como fixado na Ordenações Afonsinas.

Quanto ás fontes imediatas, o Legislador das Ordenações Manuelinas, veio consagrar a par com os costumes gerais, a validade dos costumes locais. Quanto às fontes subsidiárias ou secundárias, introduziu 2 alterações de vulto: A primeira prende-se com os critérios de utilização das normas de Direito romano e das de Direito Canónico, porquanto se aboliu a distinção entre litígios de natureza temporal e litígios de natureza espiritual, passando o Direito romano a regulamenta-las, mas manteve-se o critério do pecado, o que significava que o Juiz recorreria ao Direito Canónico, em qualquer litígio em que da aplicação de Direito romano resultasse pecado.

A 2ª alteração é relativa à introdução de uma nova fonte subsidiária, referimo-nos à Opinião Comum dos Doutores, que segundo o Legislador Manuelino, passava a funcionar como uma espécie de filho, relativamente à Magna Glosa de Acúrcio e aos comentários de Bartolo, pelo que estas duas obras só podiam ser utilizadas em Tribunais se fossem conformes à Opinião Comum dos Doutores.

A interpretação da Lei através dos Assentos da Casa da Suplicação

Até D. Manuel I as duvidas interpretativas que se colocavam no âmbito das reuniões da Casa da Suplicação a propósito de uma Lei, eram resolvidas pelo próprio monarca que em regra presidia a essas reuniões.

D. Manuel I, por alvará de 1518, vem regular, de forma diversa esta problemática, portanto atribuiu a competência para fixar a interpretação mais adequada da Lei, em caso de dúvida, ao Tribunal Superior do Reino – Casa da Suplicação.

De acordo com o referido alvará o procedimento a adoptar era o seguinte:

- Suscitando-se dúvidas acerca da interpretação da uma Lei, estas eram, pelos Juízes desembargadores da Casa da Suplicação, levadas até ao Regedor desse Tribunal, que por seu turno reunia depois com o Juiz que achasse conveniente, procurando a interpretação mais adequada da Lei em questão. Sendo que, se a conclusão nenhuma se chegasse, deveria fazer-se uma consulta ao Rei.

Estas interpretações das Leis a que os Juízes da Casa da Suplicação chegavam, eram em seguida registadas em livro próprio deste Tribunal com o nome de Assentos.

Os Assentos, como acaba de ver-se não constituíam Sentenças Tout Court, porque não visavam a resolução de um litígio submetido à apreciação do Tribunal, mas sim fixar a interpretação adequada de uma Lei. Contudo, na medida em que, eram produzidos por um Tribunal, classificavam-se como Jurisprudência, ao que acresce o seguinte: - Os Assentos eram Jurisprudência obrigatória porque possuíam a natureza de precedentes vinculativos.

Ao longo da História de Direito Português existiram, portanto, 3 manifestações de Jurisprudência obrigatória: as façanhas, os Estilos da Corte, e os Assentos da Casa da Suplicação.

Embora o alvará de D. Manuel I, expressamente referisse que a competência para proferir Assentos cabia só à Casa da Suplicação, a breve trecho, também a Casa do Cível (que no Reinado de Filipe II é fixada na cidade do Porto com o nome de Tribunal da Relação) e mais tarde, as relações que possuíam nas Províncias ultramarinas começaram também a arrogarem-se desta competência. Gerou-se, portanto uma clima de grave incerteza e insegurança jurídica, na medida em que, os Assentos tinham a força de precedentes vinculativos e se a respeito de uma mesma Lei fossem proferidas, por diferentes Tribunais, Assentos contraditórios, tal conduzia a que os Juízes portugueses não soubessem como se orientar neste domínio.

É apenas durante o período das reformas pombalinas, com a chamada Lei da Boa Razão, que este problema se resolverá definitivamente, ao estabelecer-se nessa Lei que só os Assentos da Casa da Suplicação tinham doravante eficácia normativa.

As Reformas Pombalinas

1) Breve alusão ao contexto cultural e jurídico em que estas reformas se realizaram.

2) Análise detalhada do conteúdo da Lei de 18 de Agosto de 1769, que ficou historicamente conhecida por Lei da Boa Razão e que representa as reformas levadas a cabo neste período no domínio do Direito e da ciência jurídica.

2.1) Conceito de Boa Razão

2.2) Análise das temáticas abordadas por esta Lei

3) As Reformas Pombalinas do ensino universitário do Direito:

- Os estatutos concedidos no ano de 1772 ás nossas universidades

- A organização dos estudos universitários em função destes estatutos.

1) Breve alusão ao contexto cultural e jurídico em que estas reformas se realizaram.

O período da Reformas Pombalinas é, a nível europeu o período dominado pela corrente de pensamento chamada de Iluminismo, a qual tem a sua génese histórica no humanismo do Sec. XV, próprio da época do renascimento. O Iluminismo tem como postulado básico a afirmação do homem como o centro do mundo. Com efeito, a partir do Sec. XVIII, assiste-se a uma nova compreensão do homem, segundo a qual este de um ser transcendente se volve num ser de imanência, isto é, o homem do Sec. XVIII e XIX, recusa a existência de qualquer ordem que lhe seja anterior e exterior (quer de natureza cosmologica, quer de natureza teológica) e passa a considerar-se ele próprio responsável pela criação da ordem social, económica, política e jurídica. É pois um homem que encontra o princípio e o fim de todas as coisas em si mesmo e que, recusando o elemento religioso e a transcendência metafísica se reduz à sua própria razão pensante. Por isso, o período em questão, caracteriza-se por uma autêntica hipertrofia da razão humana.

Esta nova concepção que o homem tem de si, repercutir-se-á, de modo evidente nos mais diversos do saber, entre os quais se encontra o domínio jurídico.

No campo do Direito, sobretudo no Sec. XVIII, assiste-se ao surgimento de várias escolas e correntes doutrinais identificadas com o chamado Jusnaturalismo. Os defensores do Jusnaturalismo caracterizam-se pela afirmação do Direito escrito ou positivo de um Direito ideal, porque totalmente descomprometido com a prática social e constituído por princípios não escritos e imutáveis subjacentes à própria natureza da pessoa humana.

Este Direito chamar-se-ia Direito natural e graças à obra de alguns autores, entre os quais o Jurista holandês Hugo Grócio, este Direito natural era conhecido pelo homem através da sua razão, passando então a falar-se de Direito natural racionalista e de Jusracionalismo.

Como veremos, quer a Lei da Boa razão, quer as reformas do ensino universitário do Direito, encontram-se impregnadas (absorvidas) das ideias defendidas pelas Jusnaturalistas e pelos Jusracionalistas.

Estas ideias chegaram até nós, sobretudo através dos estrangeirados comuns que se deslocavam a universidades europeias (Bolonha e Bourge) ai obtendo a sua preparação jurídica, para depois regressar ao nosso país integrando, activamente, a vida política como Conselheiros do Rei e sobretudo a vida académica como professores universitários.

Entre os mais importantes estrangeirados encontra-se Luís António Vernei, responsável pela difusão entre nós das ideias próprias da escola alemã do Uso Moderno, que foram aproveitadas pelo nosso Legislador, aquando da fixação dos requisitos para a utilização do Direito Romano Justinianeu Renascido como fonte subsidiária de Direito português.

2) Análise detalhada do conteúdo da Lei de 18 de Agosto de 1769, que ficou historicamente conhecida por Lei da Boa Razão e que representa as reformas levadas a cabo neste período no domínio do Direito e da ciência jurídica.

2.1) Conceito de Boa Razão

A Lei de 18 de Agosto de 1769, ficou historicamente conhecida como Lei da Boa Razão, pelo apelo que o legislador nela faz à boa razão.

O conceito de Boa Razão, traduzia o dogma supremo da interpretação e da integração da Lei que se encontrava nos textos de Direito romano, nas obras de Direito das gentes e nas leis positivas das nações polidas e iluminadas. A Boa Razão era, portanto, uma recta rátio jusnaturalista que resultava de todas as obras mencionadas pelo que, a conformidade com a Boa Razão, que o Legislador exigia para muitas questões, significava a conformidade com os princípios de Direito Romano e Direito das gentes.

2.2) Análise das temáticas abordadas por esta Lei

Este diploma legislativo, que representa uma boa parte das Reformas Pombalinas, incidiu fundamentalmente sobre as seguintes questões:

a) Com o intuito de por termo à situação de grave insegurança e incerteza jurídica que se vivia no nosso país em matéria de produção de Assentos, esta Lei determinou que, após a sua entrada em vigor, só os Assentos da Casa da Suplicação tinham eficácia normativa

b) No tocante à jurisprudência dos Tribunais Supremos do Reino de Portugal (Estilos da Corte e Assentos) a Lei da Boa Razão veio estabelecer que nos Tribunais Portugueses, os Estilos da Corte para serem utilizados como fonte imediata do nosso Direito, tinham de ser confirmados ou aprovados pelos Assentos da Casa da Suplicação. O que traduziu uma perda de eficácia jurídica autónoma dos Estilos da Corte.

c) Quanto à validade do Costume, enquanto fonte imediata de Direito português esta Lei veio estabelecer os seguintes requisitos:

- Conformidade do Costume com a Boa Razão

- Conformidade do Costume com a Lei (o que conduziu à inadmissibilidade do Costume contra Legem) e antiguidade de pelo menos 100 anos de existência, o que na prática conduziu a uma utilização residual do Costume.

d) Quanto ao problema do preenchimento da lacunas da Lei, que o mesmo é dizer, da fonte subsidiária do Direito, por a Lei da Boa Razão, marca um momento de ruptura relativamente à orientação adoptada durante toda a época das Ordenações. Com efeito, de todas as fontes de Direito subsidiário admitidas pelas Ordenações, o Legislador pombalino apenas permite, doravante, a utilização de normas de Direito Romano Justinianeu Renascido, sujeitando-as, contudo aos seguintes requisitos:

- Serem conformes à Boa Razão

- Serem conformes à Lei

- Serem susceptíveis de uso moderno, nos termos em que os Juristas desta escola alemã entendiam esta expressão.

Quanto ás demais fontes de Direito Subsidiário, o tratamento que lhes foi dado foi o seguinte:

- O Direito Canónico passou a ser exclusivamente utilizado nos Tribunais eclesiásticos.

- A Magna Glosa de Acúrcio e os Comentários de Bartolo foram proibidos, porque padeciam de graves deficiências linguísticas e históricas e de total ignorância quanto ao Direito natural.

- A opinião comum dos Doutores também é rejeitada por se fundar num uso abusivo do princípio de autoridade.

A Lei da Boa Razão, ainda neste domínio estabeleceu que se a lacuna fosse relativa a uma questão política, económica, marítima ou mercantil, não deveria utilizar-se o Direito romano pela sua antiguidade, lançando-se mão, das normas de Direito das nações polidas e iluminadas.

Em conclusão, marcando uma ruptura com o quadro das fontes de Direito subsidiário, tal como fixado nas Ordenações, a Lei da Boa Razão, mantém o princípio do preenchimento extra sistemático das lacunas do nosso Direito, porque consagra como fontes subsidiárias normas de Direito estrangeiro.

3) As Reformas Pombalinas do ensino universitário do Direito:

- Os estatutos concedidos no ano de 1772 ás nossas universidades

- A organização dos estudos universitários em função destes estatutos.

a) A criação da 1ª universidade portuguesa por D. Dinis e a Bula Papal que a confirmou

b) O ensino universitário do Direito antes das Reformas Pombalinas: especial referencia aos reinados de D. João II e D. Manuel I – Rei que outorgou à nossa universidade os seus primeiros estatutos

b.1) Analise da organização do Direito com base nos estatutos manuelinos

c) A reforma pombalina do ensino universitário do Direito consubstanciada nos estatutos outorgados à nossa universidade em 1772.

a) A criação da 1ª universidade portuguesa por D. Dinis e a Bula Papal que a confirmou

Durante os Secs. XIII e XIV assiste-se um pouco por toda a Europa a um fenómeno de criação de universidades, sendo que neste período o termos universidade não significava como hoje, o conjunto das faculdades que ministram o ensino superior, mas sim a corporação dos mestres escolares. Aliás, cumpre referir que este espírito corporativista que subjaz à criação da 1ª universidade muito contribui para a sua evolução.

Atendendo ao modo como nasceram as universidades classificam-se em três tipos:

1) Ex Consuetudine – São aquelas universidades que nascem de uma evolução natural de pequenos centros de estudo devido ao mérito dos seus escolares, é o que acontece com a universidade de Bolonha, que nasce da evolução do pequeno centro de estudos formado por Irnério.

2) Ex Secessione – São aquelas universidades que nascem por desmembramento de uma universidade pré-existente, como sucedeu com a universidade de Pádoa que derivou da universidade de Bolonha.

3) Ex Privilegio – São aquelas que, tal como a nossa, nascem de um acto de criação de um monarca seguido de uma Bula Papal de confirmação dessa criação.

A universidade portuguesa nasce de um acordo com esta última forma mencionada, no ano de 1288 por acto de criação de D. Dinis, sendo depois em 1290 confirmada por Bula do Papa Nicolau IV. Esta Bula Papal é o primeiro documento escrito que faz alusão, ainda que breve, ao modo como se encontrava estruturado o ensino do Direito em Portugal, na medida em que refere que a nossa universidade confere os graus de: Doutores em Leis e Doutores em cânones e reconhece a estes o chamado Ius Ubique docendi, ou seja, o poder de ensinar em toda a cristandade.

A nossa primeira universidade chamada Estudo Geral Dionisiano começa por ter a sua sede em Coimbra, oscilando em seguida entre esta e Lisboa, até que por determinação de D. João III se fixa definitivamente em Coimbra em 1537.

b) O ensino universitário do Direito antes das Reformas Pombalinas: especial referencia aos reinados de D. João II e D. Manuel I – Rei que outorgou à nossa universidade os seus primeiros estatutos.

b.1) Analise da organização do Direito com base nos estatutos manuelinos

D. João III foi um dos nossos monarcas mais empenhados no melhoramento do ensino universitário do Direito e para o efeito adoptou medidas várias, como por exemplo a da contratação de professores ilustres vindos do estrangeiro e a do financiamento a alguns estudantes de idas para o estrangeiro com o objectivo de se especializarem juridicamente e o compromisso de depois regressarem integrando a vida pública, política e académica portuguesas.

Cabe porém a D. Manuel I o mérito de ter mandado elaborar os primeiros estatutos da nossa universidade que representam uma codificação de natureza oficial, que reúnem vários preceitos disciplinadores de aspectos da vida interna da universidade. Estes estatutos permitem, mediante a sua análise, concluir, quanto à organização do ensino do Direito entre nós, o seguinte:

1) Na faculdade de leis, bem como na de cânones existiam 3 cátedras remuneradas, sendo que D. Manuel I criou para a de cânones uma outra a que chamou “O Sexto”

2) Quanto aos textos utilizados eram os mesmos que nas demais universidades europeias, sendo muito raros os de Autores Portugueses.

3) Quanto às disciplinas existiam 8 dedicadas aos estudo do Corpus Iuris Civilis, correspondendo à sistemática que os Glosadores fizeram desta obra e 7 dedicadas ao estudo do Corpus Iuris Canonicis, sendo 2 de decretais e 1 relativo ao decreto de Graciano.

4) Quanto à língua utilizada era obrigatoriamente o latim

5) Quanto ao método de ensino era o método escolástico, que aliás se adoptava em todas as demais universidades europeias e que consistia fundamentalmente na hermenêutica ou interpretação dos textos jurídicos do C.I.C e do C.I.Canonicis. Segundo este método o professos começava por expor a questão controversa – a chamada Quaestio iuridica, em seguida adoptava uma posição provisória acerca desta questão, para depois invocar os textos de autoridade a favor ou contra essa mesma posição, sendo que era desta dialéctica que haveria de resultar a posição definitiva, a qual, em regra, radicava na chamada Opinião Comum dos Doutores. Era, portanto, um método de ensino que privilegiava o princípio da autoridade e afastava a autonomia e a liberdade de construção intelectual, por parte dos estudantes.

c) A reforma pombalina do ensino universitário do Direito consubstanciada nos estatutos outorgados à nossa universidade em 1772.

No ano de 1770, Marques de Pombal incumbiu um comício – a chamada Junta de providencia literária, de analisar o estado do ensino universitário do Direito em Portugal, referindo as fazes da sua decadência e indicando critérios para a sua reforma.

Logo, em 1771, essa Junta apresentou um relatório chamado Compêndio Histórico da Universidade de Coimbra, onde fez uma critica profunda ao ensino do Direito entre nós e propôs uma reforma em muito baseada na obra de Luís António Vernei.

Quanto aos principais defeitos apontados há a mencionar os seguintes:

a) Prevalência absoluta do ensino do Direito Romano Justinianeu Renascido e do Direito Canónico renovado

b) Total desconhecimento do Direito natural

c) Desprezo pelo Direito Pátrio

d) Utilização abusiva do princípio da autoridade e da Opinião comum dos Doutores

e) Ausência de manuais pedagogicamente adequados e da autoria de Professores portugueses.

Com base nestes critérios, em 1772, foram outorgados à nossa universidade os seus novos estatutos, chamados Estatutos Pombalinos, e os quais encerram o essencial da reforma levada a cabo pelo Marques de Pombal quanto ao ensino universitário do Direito.

Assim:

a) No elenco das disciplinas leccionadas, ainda que se tenha mantido algumas relativas ao estudo e interpretação dos textos Justinianeus e do Direito Canónico, introduziram-se duas novas disciplinas que iam de encontro ao espírito vivido nesta época, referimo-nos ao Direito natural, onde se estudava Direito natural, Stricto senso, e Direito internacional público e à história do Direito e das instituições jurídicas portuguesas.

b) Substituiu-se o antigo método de ensino por um novo, que radicava em postulados totalmente diferentes e que se chamou de método sintético demonstrativo compendiário. De acordo com este novo método de ensino, o Professor deveria, no início de cada ano lectivo, elaborar um programa da respectiva disciplina e entrega-lo aos alunos.

Quanto ao modo de leccionar as matérias deveria obedecer a uma linha de complexidade crescente e quanto a abordagem feita aos temas mais problemáticos esta deveria consistir no seguinte:

- Adoptava-se acerca destes uma posição provisória cujo mérito ou demérito de procurava em segunda demonstração, para depois, através do método dedutivo, extrair dessa demonstração com posição definitiva.

Por último os Professores deveriam elaborar compêndios pedagogicamente elaborados ao invés de recorrer sistematicamente a manuais estrangeiros.

Estas reformas pombalinas do ensino universitário do Direito procuraram modernizar a nossa universidade aproximando-a das europeias, mas o próprio Marques de pombal e o reitor da universidade da época concluíram que muito havia ainda a fazer. Apesar das criticas, os estatutos pombalinos mantiveram-se em vigor até 1836 e representaram, sem margem para dúvidas, um passo muito significativo na evolução do ensino universitário do Direito entre nós.

Fim


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